O futebol no feminino – a Mister

O futebol é um desporto que movimenta milhões. Milhões de pessoas e milhões em dinheiro. Hoje em dia é o que está no topo, que atrai mais pessoas e dá mais retorno económico. Nem sempre foi assim. E já agora, a talhe de foice, foi o modo de ascensão social de muitas pessoas. Continua a ser. Se olharmos às origens de grande parte dos jogadores de futebol, facilmente se entende o que aqui está exposto.

Na realidade, 22 pessoas a correrem atrás duma bola, que rebola, tornou-se num acontecimento a nível mundial. O mediatismo que tal implica é como uma bola de neve e vai ficando cada vez maior. Os jogadores de futebol acabam por se tornar uma mercadoria uma vez que são “vendidos” e “comprados”. Parecem não se importar com tal facto, motivando outros para os seguirem. Estão no seu direito, é uma forma de promoção.

Estamos a falar de homens, sexo masculino, onde a testosterona impera e domina. Futebol tem sido no masculino, mas, nos últimos tempos, este desporto passou a receber a intromissão de mulheres. Não se trata de uma questão de feminismo nem de machismo, mas sim de interesses comuns. É legítimo. E da testosterona dominante passamos para os estrogéneos.

A ideia da mulher recatada e dona de casa, dedicada ao lar e aos filhos já vai longe e agora ela está em todas a áreas, conseguindo conciliar família, carreira e ainda outros interesses. Contudo, o que leva uma mulher a dedicar-se à carreira de treinadora de futebol? Vamos tentar entender conhecendo, um pouco, uma mulher que se aventurou por este campo.

Andreia é uma mulher na casa dos 30, sempre gostou de futebol e o seu grande sonho, desde miúda, era chegar a treinadora, o que está a acontecer agora. Tem 2 filhos menores, uma família e uma profissão. Consegue conciliar tudo, o que nem sempre é fácil de conseguir. A vida tem-lhe dado umas chapadas, mas ela levanta-se sempre, com mais força ainda.

Começou a praticar futsal aos 13 anos e esteve no mesmo clube até aos 16 anos. Nos dois anos seguintes mudou-se para um outro e finalizou, a sua carreira, com 20 anos num outro clube ainda. Digamos que a sua experiência é vasta enquanto praticante. Todas as equipas em que participou eram bem coesas o que vem refutar a ideia de que muitas mulheres juntas funcionam mal. Aqui eram todas senhoras e ainda agora, passados vários anos, se reúnem para uma partida de memórias.

Como é ser mulher num mundo de homens? Fui bem aceite e muito acarinhada, dito por ela numa entrevista. Depois de ter feito o curso foi estagiar para um clube de poucos recursos financeiros, mas a capacidade de entreajuda demonstrada por todos tem dado os seus frutos. Repartem tudo, as derrotas e as vitórias, os lucros e os prejuízos. São mais os aspectos psicológicos que contam e os incentivos são importantes.

Na época de 2013/2014 foi treinadora adjunta no clube Estrelas do Feijó, nas iniciadas femininas levando-as a serem Tri-Campeãs Distritais. Na seguinte época houve uma alteração e mudou-se para o Clube Desportivo e Recreativo Águias Unidas, para a categoria de infantis e na posterior época já foi treinar os iniciados. Estas são equipas masculinas que a aceitaram, de igual modo, como se fosse um treinador. Alguma coisa está a mudar na mentalidade e ainda bem.

Neste momento a equipa onde está integrada é composta por 11 atletas, 1 treinador, 1 treinadora estagiária, 2 adjuntos e 1 preparador físico. Não existem conflitos nem contendas e muito menos “piadinhas” pelo facto de ser uma mulher. As suas ordens são aceites como eram aceites as dos anteriores treinadores. Em campo é mais um elemento da equipa, um dos que orienta e dos que se preocupa com os resultados.

E que se pretende quando se treina e se joga em equipa? Um grupo coeso e sólido, uma união que fortaleça os laços e que os intensifique. Se tem alguma técnica ou algum tique antes de entrar em campo? Não é dada a superstições, mas sim a realidades concretas e objectivas. Calma e sabedoria antes de cada jogo porque os treinos servem para isso, para o objectivo final.

A sua formação profissional é no campo da gestão e tem trabalhado em várias áreas, aplicando os seus conhecimentos do modo que melhor sabe. Na vida prática não existem livros que guiem, mas simplesmente o bom senso. Criar filhos é uma tarefa hercúlea e ela sabe fazê-lo com mestria. Vive um dia de cada vez porque o guião não está escrito e a improvisação é essencial.

Fez um curso de treinadores que lhe roubou um precioso tempo pessoal. A família não ficou descurada, talvez um pouco combalida, mas entendem e apoiam-na, das maneiras que sabem e podem, as que estão ao seu alcance. Porém, quando se corre atrás dos sonhos a facilidade de movimentação torna-se outra, mais leve a apelativa. Trabalha durante o dia e depois do expediente tem uma outra vida, a de treinadora.

No final do curso escreveu o seguinte: “Foram 10 meses de muita aprendizagem, onde tive a oportunidade de conviver de perto com uma estrutura que permite aos treinadores desempenharem, com total foco, o seu papel, o treino.” Estas palavras provam o seu empenho e dedicação àquilo que a apaixona e motiva.

O que vai ser o futuro? Ninguém sabe, mas não vai largar esta conquista que foi conseguida com muito mérito. Para lá chegar teve de “empenhar” a sua vida pessoal sem, no entanto, descurar os que mais necessitavam de si. Quase que não dormia e se os dias tivessem 32 horas teria sido muito útil.

A prova foi superada e agora o que se depara são desafios constantes. Quem não os tem? Viver de modo acomodado não faz o seu género e não permite a evolução. Quer ir mais longe, como é natural, mas os passos são dados atempadamente, para evitar os erros que a pressa carrega consigo.

Valeu a pena? Como diria um grande poeta: tudo vale a pena se a alma não é pequena. E quem a conhece sabe muito bem que de pequena ela nada tem. A sua enorme generosidade e compreensão tem conquistado todos os que a rodeiam, daí o seu grupo de amigos ser tão ecléctico e numeroso. Acumula-os e há lugar para todos e mais algum.

Não deixa de ser a Andreia, a menina que andava sempre com uma bola debaixo do braço e as joelheiras colocadas. O seu rosto está mais maduro e a sua vida não terá sido o que planeou. Na verdade a fibra das pessoas conhece-se pela capacidade de superar as dificuldades e ela é disso um bom exemplo.

Uma só pessoa, a Andreia, mas multifacetada: a mãe, a amiga, a mulher, a confidente, a profissional, a filha, a sobrinha, a prima e a Mister.

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