O Autismo

A Organização Mundial de Saúde estabelece que a saúde não é apenas a ausência da doença, mas um estado de completo bem-estar físico, mental e social. Este conceito foca, pela primeira vez, a inter-relação existente entre o aspecto físico, mental e social da saúde. A saúde humana pode ser enquadrada em duas perspectivas: bem-estar físico, que pode ser medido através de dados recolhidos por parâmetros como, por exemplo, a temperatura, a pressão sanguínea ou o nível do açúcar no sangue. Por outro lado, o bem estar emocional avalia-se pela capacidade de um indivíduo lutar contra o stress ou o modo de se integrar numa nova situação.

Um grupo de alterações, com o nome genérico de Transtornos do Espectro Autista, TEA, subdivide-se em várias vertentes e vamos analisar, mais profundamente, duas delas: o Autismo e o O Síndrome de Asperger. A Associação Americana de Psiquiatria define esta doença como: “Um síndroma nervoso-comportamental com origem em perturbações do sistema nervoso central que afecta o normal funcionamento da criança. Os sintomas ocorrem nos primeiros três anos de vida e incluem três grandes domínios de perturbação: social, comportamental e comunicacional.”

O Autismo é uma doença que se insere nas chamadas desordens complexas de desenvolvimento do cérebro, que pode ocorrer antes, durante ou após o parto. As maiores manifestações ocorrem na dificuldade de comunicação social o que leva a comportamentos repetitivos, variando de pessoa para pessoa. A dificuldade é encontrar um ponto de equilíbrio entre aqueles que sofrem desta variante. Em certos casos surge ainda deficiência mental, dificuldade de coordenação motora, problemas físicos como perturbações gastro-intestinais, défice de atenção ou até mesmo hiper-actividade. A dislexia e a dispraxia também podem ser sintomáticas e, num outro campo, a ansiedade e a depressão na adolescência. O denominador comum são as dificuldade de aprendizagem e as actividades práticas.

O certo é que não existe um marcador biológico específico que possa ser identificado. O cérebro comporta 100 biliões de neurónios e a informação genética recebida, na origem, pode sofrer uma interferência e a mensagem não ser recebida de modo completo. São as mutações que originam estas variantes que não têm cura e que são difíceis de diagnosticar.

Tudo se processa nos genes, nas ligações, que se localizam nos cromossomas. As mutações cromossómicas estruturais são: a delecção, perda de material cromossómico, originando um cromossoma em falta de um ou mais genes; a translocação, transferência de uma porção de um cromossoma para outro não homólogo; a inversão, que é a quebra do cromossoma em dois pontos afastados, ocorrendo a soldadura da porção quebrada numa posição invertida levando, assim, a uma sequência errada dos genes e a duplicação, que é a ligação do segmento quebrado a um outro homólogo, resultando numa duplicação de um bloco.

Na verdade todos podem aprender, apesar da sua condição permanente e da ausência de cura. Assim podemos considerar, essencialmente, três tipos diferentes de dificuldades. O relacionamento com outras pessoas não é fácil, não gostam de ser olhados nos olhos nem que lhes toquem. Preferem estar sozinhos. A linguagem e a comunicação também são efectuadas de modo próprio. Cerca de quatro em dez autistas não fala, outro tanto utiliza o efeito eco, que é repetir aquilo que ouvem. O mais complicado é a mudança, que lhes atrapalha aquilo que já tinham como adquirido. Por este motivo agarram-se às rotinas e delas depende o seu bem estar.

Outra questão peculiar é a sub-sensibilidade que possuem. Suportam com a maior das facilidades temperaturas extremas bem com a dor. Estão quase isentos destas diferenças térmicas e sensoriais. Igualmente podem ser possuidores de uma força descomunal e total ausência de consciência corporal. As proporções não fazem sentido para os seus cérebros.

Os aspectos positivos devem ser valorizados, uma vez que a sua capacidade de aprendizagem é contínua, independentemente dos resultados conseguidos. São pessoas que se dedicam aos detalhes, aos pormenores, habituados a rotinas, lentas, mas arquivadas com rigor na sua memória. A exactidão é imprescindível para eles. Conseguem ter olho clínico e realçar o que escapa à maioria.

Por este motivo são funcionários leais e fiéis, uma vez que a execução das tarefas é desenvolvida com método e rigor. Não devem é ser os primeiros a executá-las porque é irracional para eles. Depois de verem feito já não há problema. Os seus interesses especiais permitem-lhes um acumular de conhecimento específico que muitos não atingem. Podem ser especialistas em determinadas áreas deixando o resto em branco, como se não existisse. Vivem bem assim.

O Síndrome de Asperger caracteriza-se pela falta de habilidade na utilização da linguagem verbal. Não usam os chamados filtros convencionais e dizem exactamente o que pensam, sem limitações e demonstrando quer a empatia quer o o seu oposto. A linguagem é pragmática e monocórdica, monótona sem a menor aptidão para as respostas esperadas. Dizem o que lhes ocorre e não entendem as respostas vindas dos outros.

Fisicamente são desajeitados, com falta de noção da corporalidade e do seu espaço físico. Como não existe reciprocidade emocional não têm a mesma noção do incómodo ou do desconforto que se costuma adquirir. O mutismo que revelam é selectivo e só o quebram com os alvos que entendem. Tanto podem ser os objectos de desejo como os de raiva. Não há equilíbrio.

Desenvolvem uma obsessão por um tema ou um determinado assunto e nada os faz desviar do seu caminho e objectivo final. Nestes casos fazem questão de demonstrar o que sabem e partilhar com quem os rodeia. Analisam as pessoas e as situações detalhadamente. Se os outros não os acompanham ficam frustrados pois não entendem o seu desinteresse.

Enquanto crianças não participam em brincadeiras colectivas pois para eles nada disso faz sentido se não entenderem o que está em questão. Criam o seu próprio mundo, os seus jogos e as suas fantasias que podem ser vividas com a maior das facilidades. Os limites e as barreiras não fazem parte dos seus dias.

A origem deste distúrbio está relacionada com os alelos, conforme mencionado e a cura é inexistente. Mesmo que a entoação das palavras possa vir a ser menos prosóica e a coordenação motora seja trabalhada, ficarão sempre segmentos que persistirem em marcar a sua posição. Aceitar ser como é mostra ser a melhor técnica de vida.

Na verdade estas desordens, como são classificadas, apresentam grandes paralelos e grandes diferenças. Os autistas, em geral, podem ser pessoas mais reservadas e fechadas, mais infantis e mais fechadas em mundos que imaginam e que fazem todo o sentido nas suas cabeças peculiares. No entanto podem vir a ter vidas muitos preenchidas e satisfatórias.

O dia 18 de Fevereiro assinala o dia Mundial do Síndroma de Asperger e o dia 2 de Abril é o dia Mundial do Autismo. Não são os dias mundiais que fazem a diferença, mas sim as atitudes e os comportamentos que as pessoas mostram em relação ao outro. Numa sociedade complexa e plena de diferenças, algumas serão menos importantes e mais fáceis de lidar. Num todos somos humanos.

Todas estas pessoas foram meninos, crianças desejadas, amadas e assim serão até ao fim dos seus dias. Os seus pais continuam a olhar para elas com a esperança nos olhos e o futuro na alma. Teremos capacidade para saber lidar com aquilo que nos assusta? Estamos tão habituados a parâmetros e designações que tudo o que escapa a esses conceitos se torna complexo.

Curiosamente os animais entendem, bem melhor, estas disparidades, estas partidas que a genética se encarrega de pregar. A comunicação não verbal torna-se mais eficaz, mais profunda e parece existir uma certa telepatia que os une e complementa. A natureza tem razões tão especiais e tão fortes que ainda não temos capacidade para entender.

Resta-nos ter a coragem e a sensibilidade para saber lidar com tudo o que se nos depara de diferente de nós. Cada mundo tem a sua complexidade e o mundos destas pessoas apresentam outras circunstâncias que não correspondem às nossas. São mundos particulares, mundos mágicos onde tudo funciona com uma simples vontade, um pequeno toque e a boa vontade.

Continuo a pensar que o melhor combustível para fazer funcionar esta máquina, que dá pelo nome de sociedade, ainda é o amor, aquele sentimento que é tão grande e tão elástico que nos envolve e atrapalha a toda a hora. Vendo bem somos todos diferentes e acabamos por ser todos iguais: incompletos e meninos grandes que buscam compreensão e aceitação.

A perfeição não existe e saber lidar com as nossas imperfeições faz de nós seres maiores, mais fortes e melhor preparados para enfrentarmos os desafios que se possam avizinhar. Quanto a mim o melhor que há a fazer é continuar a sorrir, a viver e a sentir-me um felizarda porque conheço tantas pessoas e são todas especiais e importantes para mim.

 Have a nice day!

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