Recriar um ícone não é uma tarefa fácil. Há que inovar e ao mesmo manter o apelo ao passado. A Ford tentou (e em parte conseguiu) fazer isto com o Ford GT. No entanto, quem mais sucesso teve no empreendimento de recriar um ícone foi a Morgan, com o seu 3-Wheeler, recriando o Three-Wheeler do início do século XX. Porém, como é que a Morgan, uma empresa ainda 100% familiar, conseguiu bater todas as outras marcas?
Antes de mais, a Morgan vive simultaneamente no passado e no presente, isto é, tirando a tecnologia que é actual, tudo num Morgan é feito como antigamente. O chassis é feito em metal, a estrutura, onde irá assentar a carroceria, que é batida e formada à mão, é feita em madeira, a madeira que decora o interior é mesmo madeira e não uma imitação reles, ou uma capa. São carros que ainda mantêm o mesmo design desde 1936 (no caso do Morgan 4/4).
O 3-Wheeler, assim chamado, porque só tem 3 rodas, foi apresentado no Salão de Genebra de 2011, com uma caixa de 5 velocidades de origem Mazda e um motor S&S V-Twin de 2 litros com 115 cavalos, que se encontra fora do carro. A carroceria, em forma de bala, manteve o mesmo design dos Three-Wheeler originais, sofrendo apenas alguns updates muito subtis para modernizar o carro. No entanto, para apelar a uma faixa etária mais jovem, mais descontraída e mais “cool”, foi buscar inspiração aos aviões de combate da II Guerra Mundial, dotando o 3-Wheeler de dois escapes laterais, que com a dose certa de acelerador irão rugir como um Spitfire. É também possível decorar a carroceria com gráficos alusivos a esse período, como pin-up girls, buracos de balas ou bombas largadas, entre outros gráficos.
O interior segue a mesma inspiração dos aviões de combate da II Guerra Mundial, ou seja, só lá esta o que é preciso. Há um velocímetro, um conta-rotações e um botão start (retirado do EuroFighter Typhoon). Os comandos das luzes e da buzina são 4 patilhas com posição on-off. Os bancos são fixos e fundos, deixando apenas a cabeça do condutor de fora (tal como os caças da II Guerra Mundial). Apesar disto, não é um carro desprovido de luxos, se bem que neste caso sejam mais necessidades. Uma vez que não tem tejadilho, nem capota, há um sistema de comunicação incorporado no carro e, pela mesma razão, um sistema de aquecimento dos bancos. Os únicos luxos são mesmo a escolha da cor e o bordado da pele em pregas, ou em acolchoado.
Agora imagine-se num dia de Outono, o Sol dourado ao seu lado, numa estrada deserta e rodeada de campos, a acelerar com os cabelos ao vento, ao volante de um 3-Wheeler. Parece-lhe bem, não parece? Isso é, porque é numa destas estradas que o 3-Wheeler se sente mais à vontade. É pequeno (3.2 metros de comprimento), leve (525 kg) e sem ajudas electrónicas. Como tal, é um carro que transmite ao condutor toda a informação que ele precisa de saber sobre a estrada e sobre os limites do próprio 3-Wheeler, através da direcção e da suspensão. É um carro que nos pede para testar os limites. O que não quer dizer que não possa ser usado numa estrada nacional, ou numa auto-estrada. Pode claro, desde que o condutor não se assuste facilmente.
No início deste artigo, perguntei como é que a Morgan tinha tido sucesso onde as grandes marcas raramente têm. A resposta é simples. A Morgan não complicou o carro e manteve-se fiel aos seus princípios. Inovou, onde devia inovar e manteve o que devia manter. É um carro leve, divertido de guiar e que transmite toda a informação que o condutor necessita. Tudo o que Morgan foi, é e continuará a ser.