Escutar o outro pode não ser difícil.
A dificuldade, de que tanto nos queixamos, está no facto de não sermos capazes de traduzir tudo o que ele diz para o idioma da nossa alma.
Ficamos a ouvi-lo e não entendemos as suas palavras. Achamos que aquele discurso não faz qualquer sentido. Ele fala, mas parece-nos que o que diz não lhe sai de dentro. Não diz o que queremos ouvir e sim o que lhe vai no coração e, por isso, é que temos tanta dificuldade em o entende.
O outro até pode estar a esconder-se na sombra das palavras para que não o consigamos conhecer. Pode estar a mostrar o avesso de quem é, para se defender de algo que não quer deixar transparecer num primeiro contacto. Mas, nós estamos tão focados em quem queremos que ele seja que não escutamos os seus argumentos e o julgamos por algo que desconhecemos.
O problema é que muitas vezes queremos vê-lo como alguém diferente e ele é igual a todos os outros com quem já nos cruzamos. Queremos compará-lo com um príncipe encantado que costumava viajar nos nossos sonhos, quando na realidade ele está disfarçado daquilo que é e está a contar-nos apenas a sua história e não a querer fugir desse nosso sonho. Ele não inventou nada, nem sequer colocou uma máscara para não lhe vermos o olhar. Somos nós que o imaginamos de outra forma e por isso nunca saberemos quem é aquela pessoa que está ali à nossa frente e sobre a qual críamos tantas expectativas.
O outro parecia ser a nossa última chance de encontrarmos aquele amor-perfeito que tínhamos desenhado ao pormenor durante anos a fio. Demos-lhe um nome e fizemos projectos de futuro com ele, sem que o tenhamos questionado se queria fazer parte da nossa história. Agora estamos ali perdidos a escutá-lo e não entendemos nada do que ele nos está a dizer.
Dizemos que ele fala noutro idioma, mas não seremos nós que vivemos noutro mundo e não temos capacidade para o entender? Sonhámos que ele seria perfeito e agora que lhe descobrimos limites, fragilidades e defeitos somos levados a pensar que afinal talvez não seja aquela a pessoa que queríamos encontrar.
A vida proporciona-nos tantos encontros destes que na realidade são desencontros. A vida testa-nos para que possamos aprender que o amor não tem que ser perfeito, nem temos que o encontrar na rua em que tanto o procurámos. O amor é livre e repleto de defeitos e tem que ser ele a encontrar-nos num qualquer beco da vida. Temos que ser nós a ajustar-nos à sua realidade para que tudo faça sentido e não ao contrário.
Escutar o outro pode ser difícil simplesmente porque tínhamos imaginado o seu discurso de outra forma. Tínhamos escolhido as palavras certas para aquele momento e por isso agora não o queremos entender, apesar dele estar a falar no mesmo idioma que nós.
Escutar o outro não será difícil se fecharmos os olhos e deixarmos que seja o coração a escutá-lo.