Se eu tivesse que fazer uma retrospectiva das séries que mais me impactaram em 2021, Maid certamente estaria no top 5. Não por ter o melhor enredo, os melhores personagens ou por ser digna de todos os Globos de Ouro – que seria o caso de Succession e The Crown, minhas preferidas –, mas por ser necessária.
Apesar da doçura da protagonista Alex, interpretada por Margaret Qualley, Maid é uma série que faz doer. E faz doer porque é real. Fala sobre o desemparo das mulheres que sofrem violência psicológica, que vivem relacionamentos abusivos, que são mães solo.
Maid também aborda o machismo estrutural. Para uma mulher vítima de violência doméstica entrar no sistema, ela precisa fazer uma denúncia, para fazer uma denúncia, ela precisa ser fisicamente violentada, como se o abuso emocional não fosse o bastante!
E o machismo estrutural também está presente dentro de casa, no ciclo social. A própria família abandona Alex. Pensam que é melhor manter um relacionamento abusivo do que sair de casa, com uma filha, sem garantias ou segurança de um futuro melhor. Mas que garantias e futuro estas mulheres possuem dentro dos próprios lares?
É verdade que Alex faz parte de uma família disfuncional. Uma mãe bipolar, com um histórico de relacionamentos abusivos; um pai violento que abusa do álcool e abandona a família. O que mostra que, para além do machismo estrutural, a violência também é cíclica.
Maid faz doer justamente pelo fato de, seja em maior ou em menor escala, ser uma história familiar. Mulheres que criam filhos sozinhas, que abdicam de carreiras, sonhos, que se tornam financeiramente dependentes de homens que acabam por controlar suas vidas. Homens que se priorizam, que priorizam a vida profissional. Alguns são violentos; outros “bonzinhos” no ciclo social e no privado cometem abusos. Há ainda os omissos, os que abusam de substâncias ilícitas. Tantas nuances de um mesmo problema: uma sociedade machista que não olha pelas mulheres. Uma sociedade que pensa que é melhor uma mulher sofrer calada do que enfrentar o problema e seguir em frente, sozinha.
No meio de tanta dor e lágrimas que a série nos faz derramar, Maid nos mostra que há espaço para esperança, para poesia, para o que é belo. É verdade que a jornada é longa e dura. E que é preciso uma coragem descomunal. Mas é possível. Com uma boa rede apoio, chegamos lá.
A série mostra a importância de abrigos para mulheres que sofrem violência doméstica. Quando ninguém mais está lá por elas, estes abrigos fornecem tudo que é necessário: segurança, um quarto, comida, roupas e, principalmente, acolhimento.
Já há muito que se fala em sororidade. A série retrata muito bem este conceito, ao mostrar uma colega de abrigo da Alex ajudando-a a levantar da cama e seguir em frente. Ajudando-a a entender que a culpa não é e nunca será da vítima. Que o melhor para ela e para a filha é sair de casa, é sair de uma relação tóxica. Em certo momento, neste abrigo, as mulheres podem ir até uma loja comprar roupas, com dinheiro fictício, para que elas se sintam independentes pelo uma vez em suas vidas.
Maid faz doer, faz chorar, faz reconhecer-nos enquanto mulheres vítimas de um machismo estrutural. Faz reconhecermos cada homem da série, que também já estiverem presentes, direta ou indiretamente, em nossas vidas. Mas faz-nos sonhar com um futuro melhor e com um futuro melhor para nossas filhas, sobrinhas, amigas. Maid acaba com um episódio lindo que faz-nos chorar, finalmente, de alegria.
Meninas, cuidem-se e cuidem umas das outras. Seguimos juntas.
Nota: este artigo foi escrito seguindo as regras do Português do Brasil
Lindo texto.