Eu não gosto de amarelo. Mas a Joana famosa “X” publicou no Instagram uma foto com um vestido amarelo. Agora #nósadoramosamarelo
Eu não gosto do campo. Ah mas a Káti@ (com kapa) famosa “Y” postou no Facebook uma viagem pelo campo. Afinal #nósadoramosocampo
Eu gosto de dançar slows. Ah mas o Víktorrr famoso “Z” diz que agora “in” é dançar o funáná. Aqui #odiamosslows #queremosritmosquentes
Eu gosto de um bom bife. Mas ontem li num blogue que a carne nos faz mal. Ai mas afinal nós #somostodosvegetarianos #odeiobifes
Eu gosto de ler livros em papel. Mas li um Twitt que dizia que os livros são “demodé”, agora os e-books é que são os melhores. Afinal nós lemos tudo no tablet #ebookrules
Actualmente o Eu está em vias de extinção. A Internet, essa maravilha que nos aproxima também nos anula.
E se ser individual é um desafio! É duro ser Eu! É tão mais fácil sermos nós. E nem sequer falo no nós que se personifica na pessoa que está ao nosso lado, nos nossos amigos ou na nossa família. Este nós é um nós mundial, um nós universal.
Não se trata, porém, do nós com quem partilhamos ideias, do nós real com interesses comuns, do nós da partilha ou da busca pelo bem, trata-se de um nós de rebanho, de um nós que nos transforma em ovelhas: todas iguais, todas de camisola amarela e calções de ganga.
Num nós que usa as mesmas sapatilhas feiosas da moda. Num nós defensor da mesma corrente filosófica, seja ela qual for, mesmo que não se perceba muito bem. Um nós que ouve a mesma música hit do momento, um que vê os mesmos filmes, que assiste as mesmas séries. Um nós que dança ao mesmo ritmo e despreza quem ousa dançar um slow.
Não é de agora. Sempre foi assim e sempre assim será. Afinal, quem nunca admirou o estilo de uma amiga de escola e, por mero acaso, foi à mesma loja da moda na altura e trouxe uma ou outra peça igual? Quem nunca leu a a Bravo ou a Super Pop na adolescência para ler o que os ídolos ouviam no walkman e depois gastou a prenda dos avós numa cassete daquele cantor que afinal tanto gostavam sem nunca o terem ouvido? Quem nunca usou preto integral porque ser gótico é que era? Quem nunca escondeu as T-Shirts totós na gaveta do fundo, para que ninguém soubesse o quanto adorava o Star Wars, bem até agora porque agora, ser Geek é cool…
Até era engraçado perceber no liceu em quantas cores se fabricava “aquele” top da loja cujo nome começa em ZA e acaba em RA. Aquele top que fizemos a nossa mãe comprar vários para puder vestir quase todos os dias, acompanhando uns tótos de Britney e uma meia pelo joelho.
Contudo, entretanto, o tempo, esse nosso fiel amigo, encarregou se de nos fazer crescer e de nos trazer apressadamente aos dias de hoje. Seria de pensar que a vida adulta nos trouxesse a coragem de sermos como somos, sem constrangimentos, sem medo da diferença, sem querer ser só mais uma ovelha, porém, basta um movimento do polegar e somos levados, qual montanha russa, por fotos bonitas, por textos inspiradores, por apelos que somos impelidos a seguir, porque queremos ser assim, porque queremos aquela perfeição. No entanto, e como tudo na vida, não há direito sem avesso e, naquele pequenino ecrã, cabe um número infindável de caras, mas muito poucas coroas.
Deixemo-nos, pois, influenciar por pessoas bonitas por dentro, não pelas roupas giras que alguém lhes pagou para vestir. Deixemo-nos inspirar por ideias reais, não por textos de criativos que saem à rua 5 minutos por dia. Louvemos ideias novas, pessoas únicas. Saibamos ver para além das fotos perfeitas, dos filhos mega bem comportados, das poses magnificas e dos corpos esculpidos no ecrã. Olhemos para pessoas reais.
Dê-mos prioridade ao EU, seja ele como for. Ao EU que ousa discordar, que fundamenta e defende com vivacidade aquilo em que acredita. Ao EU que é uma estrela azul num oceano virtual de peixes laranja.
O EU que tira fotos reais, as imprime e as expõe nos móveis de sua casa. O Eu que usa cabelo verde porque gosta. Que veste roupa antiquada porque gosta. O EU que é igual a mim, sem filtros, sem posts, sem twits.
O EU que tem coragem de ser como é.
Na Internet temos o poder de ser aquilo que quisermos, pelo menos nas 24horas que dura uma story. Temos o poder de nos (re) inventarmos consoante aquilo que gostamos, no entanto, num mundo que nos põe o mundo na palma da mão, que nos encontra o caminho quando não sabemos onde estamos, também nos podemos facilmente perder. Perdemos o eu com a mesma facilidade que perdemos as chaves numa mala de senhora. Mesmo quem quer ser original, busca “inspiração” noutro original qualquer.
Aqui há dias, cruzei me com uma conta de Instagram o “Insta_repeat” dêem lá um saltinho e verão que bem que ilustra o que vos digo e, pelo caminho, não percam o EU… E, se vos apetecer, dancem um slow…