Game Change foi um filme lançado pela HBO em 2012 (ainda disponível no streaming), que conta a história da candidatura do então Senador John McCain à presidência dos Estados Unidos em 2008.
O texto contém spoilers do filme, porém a história é baseada em fatos reais e as informações estão todas disponíveis na Internet.
O filme fala sobre a participação de John McCain na corrida presidencial dos Estados Unidos em 2008, contra o Obama (que todos nós sabemos que ganhou). Mais especificamente, a história trata da escolha de Sarah Palin, então governadora do Alasca, para vice-presidente de McCain.
Abro aqui uma parêntesis para dizer que Sarah Palin foi interpretada por Julianne Moore, que teve uma atuação impecável, a semelhança é mesmo incrível.
Voltando à história, nos Estados Unidos da América existem dois partidos, os Republicanos e os Democratas. Cada partido só pode ter um candidato concorrendo à presidência, então dentro dos partidos são feitas eleições prévias para decidir quem será esse candidato.
O filme começa aí, quando McCain estava tentando ganhar a vaga do partido Republicano e para isso precisava escolher um vice que “preenchesse algumas cotas”, para conseguir votos de alguns grupos que ainda estavam indecisos. Para isso, sua equipe decidiu que a melhor solução seria colocar uma mulher, e sugestão foi a governadora do Alasca, que tinha um índice de aprovação altíssimo no estado e estava virando uma espécie de celebridade local.
Vale dizer que o Alasca é um estado bastante peculiar. Ele fica separado do restante do país pelo Canadá, tem uma densidade populacional baixíssima, um estilo de vida completamente diferente e é extremamente conservador.
Acontece que McCain e sua equipe só tinham mais uma semana para anunciar seu vice, então fizeram, às pressas, uma entrevista com Sarah Palin para decidir se ela seria a melhor opção. Como vocês devem imaginar, existia uma equipe de campanha enorme trabalhando para McCain, mas por algum motivo, a governadora só foi entrevistada por dois assessores, em entrevistas bastante rápidas, antes de ser aprovada e anunciada oficialmente para o partido.
McCain ganhou as prévias e tornou-se o candidato oficial dos Republicanos, a disputar a presidência com Obama.
A partir daí a coisa toda começa a desandar. Sarah Palin mostra-se uma pessoa extremamente conservadora (mais do que o partido esperava) e com total desconhecimento de quase todos os assuntos relacionados à política.
Ela chegou a fazer algumas entrevistas em que disse absurdos, como quando perguntada sobre a situação na Rússia, ela disse que entendia muito desse assunto porque da casa dela no Alasca ela conseguia ver a Rússia, ou quando disse que o aquecimento global não era causado pelas pessoas (para ser justa, ela disse que algumas coisas que as pessoas faziam poderiam contribuir) e sim por uma mudança cíclica na natureza.
Apesar do total despreparo para o cargo, ela era uma pessoa muito carismática e, usando a narrativa de mãe de família, com uma linguagem muito “divertida” e um sotaque muito pesado, ela foi ganhando status de celebridade e passou a se desconectar da campanha de McCain, descumprindo os acordos que havia feito anteriormente.
A equipe de campanha de McCain, em diversas ocasiões, tentou passar alguns conhecimentos básicos para Palin, mas ela parecia não querer ou não conseguir absorver nada, então eles decidiram que seria melhor que ela decorasse alguns fatos bastante específicos e polêmicos, para que ela soubesse o que deveria falar ao público.
Surpreendentemente essa técnica funcionou e ela saiu-se imensamente bem em um debate contra o então vice-presidente do candidato Obama, Joe Biden. Usando aquilo que havia decorado e seu status de celebridade, ela arrancou risos da audiência e talvez tenha até saído vitoriosa.
O fim da história nós sabemos, McCain perdeu, Obama foi eleito presidente e Sarah Palin caiu (mais ou menos) no esquecimento.
Esse filme abre espaço para várias discussões, mas eu queria focar especificamente em uma: o quanto o status de celebridade que ela atingiu, serviu para validar a sua posição de candidata a vice-presidente, superando em importância sua ignorância e total despreparo para o cargo.
Essa é a nossa realidade, as vozes inteligentes, estudadas e preparadas, perdem espaço para celebridades que são famosas por serem famosas. Quantas vezes acreditamos em alguém que tem muitos seguidores, sem nem mesmo checar se aquela pessoa está falando a verdade, mesmo com todo o acesso que temos à informações.
Eu mesma, que me considero uma pessoa crítica, consciente e inteligente (e não muito viciada em redes sociais), me pego acreditando em pessoas que eu nem conheço, mas que aparecem com frequência na minha timeline.
Tenho tentado fazer o exercício de sempre checar fatos e pesquisar quem são aquelas pessoas, mas são tantas informações e em velocidade tão rápida, que não dá para checar tudo e acabo por aceitar. Mas se tem uma coisa da qual eu tenho plena convicção, é de que número de seguidores não significa absolutamente nada. E pra dizer a verdade, ainda tenho dificuldade em entender o que é essa profissão de influenciador. Aliás, nem sei se isso é profissão ou status social, ou talvez seja uma seita, a seita dos influenciadores de Instagram.
O desastre que seria ter Palin na Casa Branca conseguiu ser evitado, mas muitos outros aconteceram, inclusive no Brasil, muito por causa das redes sociais. Entendo que evitar que a desinformação se espalhe ou que “celebridades” tenham influência em assuntos que desconhecem não é mais uma opção. O que eu vejo como saída é a educação, principalmente das novas gerações, que já nasceram nesse mundo.
Talvez seja a hora de iniciar a revolução do pensamento crítico e de duvidar antes de acreditar mas, como diz o ditado, “falar é fácil, quero ver fazer”. E assim seguimos, acreditando que celulite tem cura, que se trabalharmos 14 horas por dia vamos ficar rico ou que esse ou aquele candidatos estão sempre sendo sinceros e só querem o bem da nação.