És feliz?
Foi essa a pergunta que Carlos fez a Cristiana, depois de terem feito amor como se mundo fosse acabar dentro de alguns segundos e eles estivessem a aproveitar para viverem tudo a que tinham direito.
Cristiana era uma mulher bem vivida e habituada a partilhar a sua cama com homens que procuravam uma aventura que lhes fizesse correr nas veias a adrenalina de se sentirem vivos. Não temia ser condenada pela sociedade cheia de regras, mas tão vazia de princípios. Vivia à sua maneira e não perdia tempo a dar explicações a quem pouco, ou nada, conhecia de sentimentos, mas que se julgava mestrado nas leis do bom comportamento e que, por isso mesmo, pensava que poderia condenar quem não se comportava da maneira que, quase todos, diziam ser a mais correcta. Não perdia tempo com quem fazia leis que não entendia e muitas vezes nem sequer seguia. Tinha aversão aos falsos pudicos e por isso vivia todos os momentos que a vida lhe oferecia sem pensar no amanhã.
Sem qualquer tipo de pudor, olhou para Carlos com aquele olhar sedutor e ao mesmo tempo provocador, que só uma mulher desinibida saber usar para desarmar um homem, e respondeu-lhe:
– Talvez não seja feliz, pela simples razão de que troco a felicidade pela ousadia de viver momentos como estes. Não me negou a viver todas as emoções que a vida me concede.
Carlos puxou o lençol para cobrir o seu corpo, desnudado e ainda a estremecer com o ritmo de todas as emoções que tinha acabado de partilhar com aquela mulher, que nem sequer conhecia. O seu corpo ainda ardia com o calor da paixão que lhe corria nas veias. Parecia-lhe que as mãos dela ainda continuavam a deslizar pela sua pele à procura de recantos para lhe provocar prazer, recantos que ele nem ousar sequer sonhar que lhe poderiam provocar todo o desejo que ela lhe despertou em breves segundos.
– És sempre assim, uma mulher sem medo dos olhares do mundo e sem qualquer tipo de expectativas sobre o que o amanhã te pode trazer?
– Esta que vês aqui ao teu lado, totalmente despida é a mulher que se entrega à vida para viver tudo o que sente no momento. O que está para vir é uma ilusão e o que já passou é uma recordação, mais uma recordação boa que vou guardar no baú das memórias desta minha vida.
Tinham-se cruzado na festa de aniversário duma colega dele. Uma daquelas festas de gente pseudo-rica, que adoram dar grandes festas, para que o mundo saiba que elas estão de bem com a vida e que têm motivos para festejar. No fundo vivem mais de aparências que, por vezes, encobrem duras realidades.
Cristiana fora convidada porque conhecia muita gente e porque adora festejar a vida e tudo o que ela tem de bom, sem se preocupar com quem está ou deixa de estar naquelas festas. Quando Carlos a viu estava ela num canto de conversa com algumas pessoas, mas com cara de quem já estava farta com a conversa. De repente, olhou para ele e atravessou a sala de lado ao outro, passou pelo balcão das bebidas, pegou em dois copos de champanhe dirigindo até onde ele estava, sozinho e perdido a olhar para o nada. Esticou-lhe um dos copos e convidou-o para irem até ao jardim, alegando que ali estava muito calor. Com toda a sua sabedoria na arte da conquista levou-o para um recanto isolado onde conversaram durante breves minutos.
Como se já tivesse tudo programado antes, quando Carlos deu por ele já estava no carro a caminho da casa dela. Entraram e ela mal teve tempo de fechar a porta da entrada com o pé tal era o desejo que tinha de levar Carlos às nuvens. Fizeram amor de uma forma que ele nunca tinha feito e talvez pela primeira vez na sua vida sentiu que a música da paixão dançava a sua volta e seu corpo rodopiava ao ritmo do desejo que não parava de aumentar com tudo o que ela lhe oferecia.
Quando pararam estava tonto com tanta emoção que lhe saia por todos os poros do seu corpo, mas ao mesmo tempo estava curioso sobre se era aquela a forma que ela tinha de se sentir feliz e, por isso, não hesitou em perguntar-lhe se era uma mulher feliz.
A sua resposta foi como que um balde de água fria que fez com ele repensasse toda a sua vida. Afinal sempre tinha vivido oprimido pelas leis da sociedade e não ousava quebrar uma regra que fosse da educação que tinha recebido para que a sociedade não o condenasse. Não pisa as linhas que o mundo definia como metas para o consideram uma pessoa decente e como tal nunca ousara viver e pensar em si e nos seus sonhos e desejos. Desconhecia o sabor de uma aventura e este desafio que Cristiana lhe lançara, sem esperar pela sua resposta, foi um teste à sua capacidade de desobedecer ao que era politicamente correcto.
Sem que querer pensar, no que todos pensariam se soubessem o que tinha acontecido ali, decidiu que não queria continuar naquela vida sem sabor. Sem mais demoras, atirou o lençol de novo para o chão e puxou-a para junto de si. Era a sua vez de a seduzir e ela respondeu-lhe de imediato deixando que fosse ele agora a comandar mais uma viagem pelas ruas do desejo e da paixão.
No final da noite, quando conseguiram voltar a respirar, foi ela que lhe perguntou:
– Sentes-te feliz?
Carlos respondeu-lhe entre dois sorrisos coloridos
– Estou a aprender a viver, e se felicidade é vibrar desta forma, digo-te ser feliz é apenas uma forma de encarar a vida.
Adormeceram despidos de passados e sem medo do amanhã que começava a despertar lá fora. Afinal, a felicidade nada mais é do que sentir tudo o que vivemos sem temer que alguém nos impeça de sorrir pelo que estamos a sentir.