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Em Abril chega a festa

Em Abril, chega a Festa! Nos dias em que se comemora a Páscoa, Serpa – cidade alentejana à margem esquerda do Guadiana – pinta-se de diversas cores. As cores da vida, das colchas debruçadas da janela, o brilho das velas nas procissões, a cor das flores que começam a surgir para brindar tudo e todos com a alegria da Primavera.

Ainda antes da Sexta-feira Santa, começam os preparativos, começa a azáfama das famílias que chegam para rever os seus. Os preparativos das doceiras que fazem delícias (entre elas as famosas queijadas de requeijão). Os preparativos dos festeiros que montam palcos, recebem artistas, preparam todas as surpresas guardadas a sete-chaves para acalentar o povo que se junta em comemoração.

Depois faz-se silêncio. Pensa-se a Páscoa cristã. Vai-se às procissões com zelo e gravidade, percorre-se a cidade com os andores, imagens da paixão de Jesus, símbolos do encontro com a sua mãe, da sua morte, do seu enterro.

Contrastam estas vivências, com o rebuliço e diversidade que, nas altas horas de luar, pintam as ruas de Serpa onde pessoas bebem alegremente, conversam e dançam. Brincam. Incautelosamente, talvez esquecendo o peso na cabeça que terão, durante o almoço de família do dia seguinte… Não faz mal, festa é festa!

A banda filarmónica, símbolo da união da cidade e das tradições, vai preenchendo as ruas com marchas, temas, músicas, perfilados em formação elementos de todas as idades que se juntam para contribuir com o seu amor à música e abrilhantar todos os momentos.

E eis que, no Domingo, o peso e gravidade da Páscoa são levantados para dar lugar ao mais completo júbilo e amor a uma cidade e à sua padroeira, Nossa Senhora de Guadalupe. Esta, no seu andor, representa aquilo que nos une – uma mãe, uma origem comum, um mesmo colo em que vivemos, de onde somos e que nunca esquecemos.

Convida-se essa imagem a penetrar e percorrer Serpa, visitando todos como uma velha amiga que nos vem ver, dar esperança com as suas espigas e assegurar que o alimento não faltará.

Faz-se cortejo, comemora-se a cultura alentejana, as personalidades memoráveis de Serpa, eventos históricos que pintam a nossa memória e locais que são nosso ninho: a taberna, o mastro, a ribeira, o lagar, a barbearia, a sapataria e a venda entre outros tantos. Para todos, são distribuídos enchidos, pão e queijadas à medida que o cortejo passa. Nos carros alegóricos, seguem grupos de música a tocar “modas”, ranchos desfilam no chão, grupos de bombos, chocalheiros, bandas filarmónicas de vários sítios. Uma criança sorri ao ver passar o Abade Correia da Serra, subitamente ressuscitado e trajado nos seus folhos do século dezanove. Um rebanho de cabras passeia-se, balindo.

Todas as noites regressa a animação com música em palco! Brinda-se e dança-se como se nada mais importasse. Estamos aqui, estamos juntos, estamos felizes.

Na segunda-feira, faz-se procissão grande, por toda a cidade. O povo aperalta-se e é prestada a homenagem, cantando o hino “Serpa de Guadalupe”, quando a imagem chega à praça, ao coração da cidade. Batem-se palmas, cumprem-se promessas. Mesmo quem não é católico sabe que Serpa vem ver Serpa, vem reconhecer-se nesse momento. Então esse aplauso é para a imagem no andor e é para todos aqueles que se juntam ali. Mais um ano que passou, mais histórias que se escreveram e mais amanhãs por vir.

Desce a bênção e recolhe-se.

À meia-noite, o céu pinta-se, com as luzes do fogo-de-artifício e entre os “OH”’s e “AH”s das pessoas que vêm serem refletidas esses flashes na Nora, no Palácio dos Condes de Ficalho, na Torre do Relógio, no Espelho de Água, no Alto da Forca.

Voltamos aos bares, aos cafés, aos palcos… Já “contentes”. Há amores que nascem entre conversas, há amizades que se fazem, outras que se adensam. Há velhos amigos que se encontram e, sempre, há quem cante!

Até a estátua do Abade tem um copo na mão para brindar connosco!

A festa dura até de manhã, mas com cautela pois na terça-feira existe outro evento que requer força física e de espírito.

É manhã. Eu estou fardado com a roupa da banda. Na minha mão um trombone de varas. Dói-me a cabeça e tenho a boca seca (seria do quê?). A procissão está prestes a sair, as gentes alinham-se em cordão e começam a caminhar ao som da Serpa de Guadalupe. Faremos uma volta final pelo centro, passaremos as portas de Beja, subiremos até ao Rossio, depois a Cruz Nova onde nos preparamos para a Romaria ao Altinho.

Lá em cima, vê-se a Capela caiada e plantada no topo do monte, na encosta estão as famílias reunidas para o piquenique, almoço no campo. Há “malaquecos” (farturas ou fritos), há torrão d’alicante, há algodão-doce. Há vinho, borrego, frango, gaspacho, carne grelhada…

Há muita vida e a procissão vai subindo pela estrada, ladeada por olival, até chegar à Capela onde todos juntos cantam e se despedem da mãe padroeira, que recolhe ao seu solar e onde ficará a olhar por nós para que fiquemos bem e saibamos ser esse povo, essa essência que é ser Serpa…

Quando é, dá-nos vida e alento para mais um ano. Quando é dá-nos esperança nos dias melhores. Quando é, relembra-nos quem somos.

Este ano, infelizmente não foi assim, foi diferente – foi em casa, mas juntos nos visores, comemorando das formas possíveis e criativas na mesma. Houve concertos online, houve cante às janelas, houve procissões em vídeo, fogo-de-artifício em vídeo, muitos brindes, mas muita saudade.

Este ano não foi assim e, acredito, deixou o sentimento de ter-mos perdido algo que está tão enraizado que parece garantido, mas não é.

Este ano a Festa fez-se, pensando no bom que é termo-nos uns aos outros e partilhar o bom da Primavera, das colheitas, do quotidiano e da vida conterrânea.

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