Educação ou injeções de matéria?

O estigma social de todo aquele que não tem um curso é um fardo difícil de suportar no dia a dia.

O certo é que existem licenciados que metem dó. E eu, uma pessoa sem curso, impedida de progredir na carreira pela falta do mesmo, pasmo com a iliteracia de toda essa gente licenciada. E pergunto eu: será que bastará uma simples licenciatura para tornar alguém competente? Não será um logro assumir que a licenciatura confere a alguém o mínimo de conhecimento só por si? Senão vejamos: no funcionalismo público, o chamado canudo é requisito para determinados cargos, em detrimento da experiência de um funcionário autodidata, que manifeste ter conhecimentos e a experiência para desenvolver um bom trabalho.

Sendo eu alguém com os conhecimentos fundamentais da língua portuguesa, aflige-me ter um número tão elevado de licenciados que não consegue redigir um texto corretamente ou dá tropeços sistemáticos na linguagem oral.

Se existe algum culpado para ouvirmos um licenciado dizer “hádem” em vez de “hão de” ou “a gente vamos” em vez de “a gente vai”, esse culpado é o sistema de ensino.

Não podemos dar inteligência a quem a não tem, mas podemos dar formação, ensinando em primeiro lugar o básico e depois deixar o resto fluir. A cultura geral, nos dias atuais, está a ser injetada nos jovens da maneira mais descabida possível. Por exemplo, exigimos que, a determinada altura do percurso educativo, um aluno tenha de decorar os órgãos reprodutivos de uma flor, que só por uma probabilidade ínfima voltará a ter necessidade desse específico conhecimento na sua vida futura. Este é um exemplo, entre milhares de conceitos e matérias, que são injetadas, avaliadas e rapidamente esquecidas.

A educação devia focar-se em incutir o gosto pela leitura e pelo desenvolvimento do espírito crítico. Com isto não estou a dizer que ensinar um pouco de tudo não seja importante, mas que mais do que dar o conhecimento em injeções dever-se-ia dar as ferramentas para que o aluno pudesse ele próprio desenvolver a sua cultura geral. Como? Ensinando a ler, a escrever e a pensar. A ter o tal bichinho que nos obriga a quer sempre mais e a procurar novos conhecimentos. Ensinar a colocar questões, ensinar a procurar respostas, a fundamentar, a investigar e a experimentar. E, para isto, é contraproducente essa educação baseada no decorar para um resultado que dê para «ir passando».

Apercebo-me que, por exemplo, na literatura lecionada na disciplina de Português, são dadas obras demasiado complexas para o nível de maturidade dos jovens e incutem-se análises interpretativas pré-estabelecidas, em vez de uma análise livre e bem fundamentada sobre uma matéria que nem sequer é uma ciência exata.

Este sistema educativo está desatualizado numa sociedade onde o conhecimento vive na ponta dos nossos dedos. Hoje, carregamos todos uma biblioteca infinita na nossa mão. Temos um potencial enorme que, se não for usado com algum conhecimento, pode ser bem mais prejudicial do que benéfico.

O fundamental e o importante seria que todos fossem ensinados a saber procurar o conhecimento, sabendo ler, interpretar e sabendo escrever, fosse qual fosse a área que pretendessem seguir.

Assim, estariam garantidas as ferramentas básicas para que uma licenciatura fosse realmente a garantia de um estudo superior e não na miséria que por aí se vê. Evidentemente, estarei a generalizar, porque também há quem faça jus ao ensino superior. São muitos, mas não a maioria.

Talvez com uma atualização do sistema de ensino, se pudesse criar uma sociedade menos injusta e mais capaz. Talvez se acabasse com o estigma do não licenciado, privilegiando o conhecimento real e as verdadeiras capacidades de cada um. Talvez deixássemos de ver e ouvir tantas barbaridades e atentados à língua portuguesa e até ter médicos com letras legíveis.

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