De QUEM É o 25 de abril?

O 25 de abril em Portugal será sempre uma data a comemorar no contexto de um acontecimento crucial na História do país. Não pode, contudo, ficar refém de forças partidárias, nem constituir bandeira para todas e quaisquer manifestações de caráter nacionalista duvidoso. A restituição da Democracia ao país, em 1974, é de todos os portugueses. O tal regime político que continua a ser “o pior de todos os sistemas com exceção de todos os outros”, tal como Churchill afirmou. Outros que já foram postos em prática revelaram-se calamitosos para a Humanidade, quer a nível económico e social, quer cultural.

O presente ano esta data carrega outro marco consequente do regime democrático. Há 51 anos, realizaram-se as primeiras eleições livres, por sufrágio direto e universal. O ato eleitoral para a Assembleia Constituinte colheu um nível de participação único (91.6%). O grande desafio era redigir e aprovar uma nova Constituição que legitimasse o regime político, sendo de extrema importância na defesa do processo democrático versus processo revolucionário.

A data que deveria ser unificadora da sociedade portuguesa, revelou-se de comemoração atípica envolta em polémicas e desacatos por parte de uma franja que se vem expandindo com amplificação nas urnas.

O Governo português decretou três dias de luto nacional, de 24 a 26 de abril, devido à morte do Papa Francisco. Decidiu cancelar toda a sua agenda festiva relacionada com o 25 de abril, adiando as comemorações oficiais para o dia 1.º de maio.

Não se fizeram esperar as vozes discordantes por parte de diversos setores políticos. O secretário-geral do PS considerou que o Governo “cometeu um erro” ao cancelar toda a sua “agenda festiva”. O porta-voz do partido Livre, Rui Tavares, por sua vez, classificou a decisão como “chocante”, e o presidente da Associação 25 de Abril, Vasco Lourenço, também manifestou indignação.

Apesar do adiamento das atividades festivas por parte do Governo, a sessão solene na Assembleia da República manteve-se, assim como o habitual desfile na Avenida da Liberdade.

Durante as celebrações, em Lisboa, ocorreram confrontos entre a polícia de choque e manifestantes de extrema-direita que desafiaram uma proibição municipal para realizar um protesto contra a imigração. Grupos como Ergue-Te, Habeas Corpus e Grupo 1143 organizaram-se perto do Largo de S. Domingos (espaço testemunha de tumultos de intolerância ao longo dos tempos), uma área frequentada por imigrantes africanos e asiáticos. A polícia interveio, detendo figuras proeminentes, incluindo o ex-juiz Rui Fonseca e Castro e o conhecido neonazi Mário Machado.

Lisboa pintalgou-se de rubros cravos da revolução e de manchas de sangue de ódio cego, ensombrando, de algum modo a data comemorativa e criando espaços lacunares onde se querem encaixar princípios sem lógica ou humanidade. Sinais dos tempos promissores do que já se viu antes.

Em jeito de uma pretensa conciliação entre as comemorações do 25 de abril e do 1.º de maio, o governo, na residência oficial do primeiro-ministro, organizou o evento designado por São Bento em Família, o qual contou com um pequeno concerto do cantor Tony Carreira, atuações de um grupo de Pauliteiros de Miranda e outro de Cante Alentejano. Curioso como soa aos acordes do antigamente.

Pelo contrário, as centrais sindicais mantiveram a tradição pós – 1975, cumprindo a geografia das comemorações. Em separado, a União Geral dos Trabalhadores (UGT) no Centro Nacional Desportivo do Jamor, em Lisboa e a Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses – Intersindical Nacional (CGTP-IN) o desfile desde o Martim Moniz até à Alameda D. Afonso Henriques. Aí a Fonte Luminosa, em concílio com os seus elementos escultóricos marca nos treze olhos de água testemunhos de memórias de uma História que alguns pretendem diluir, disfarçar, esvaziar. Cabe-nos ter coragem para separar as águas e remar contra marés.

Nota: este artigo foi escrito seguindo as regras do Novo Acordo Ortográfico.

Share this article
Shareable URL
Prev Post

Nada correu como planeado

Next Post

Menopausa: Uma verdade ou tabu?

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

This site uses Akismet to reduce spam. Learn how your comment data is processed.

Read next

O Salvador da Pátria

No auge da pandemia, da crise financeira e social, vemo-nos envolvidos em mais uma crise – a  política. No…