Ele andava cheio de motivação. Tinha feito o curso que desejava, desde miúdo e a esperança no futuro era enorme. O mundo grande, sério e verdadeiro estava à sua frente, de mãos abertas, pronto a receber mais um ser carregado de sonhos que queria realizar.
Ser reconhecido e um bom profissional fazia parte dos seus planos e estava a pouco dias de tentar a sua sorte numa empresa que oferecia condições quase únicas e apelativas. A entrevista estava agendada e a preparação era essencial. Nada podia falhar.
Experimentou várias indumentárias, treinou a pose, viu-se ao espelho, fez gestos ridículos, mas não queria estar desprevenido. Pousava a mão na mesa, ajeitava o casaco, olhava de lado e tentava manter o ar sério e profissional que seria a chave para o passo seguinte.
Chegou antes da hora marcada e sentiu um certo nervoso miudinho. As mãos estavam suadas, o que não era costume. Viu a sua imagem reflectida no espelho e deu meia volta. Estava apresentável. Sentia-se confiante. Aquele era o seu dia de sorte. Subiu e verificou que não era o único candidato. Primeiro embate: concorrência. Respirou fundo.
Todos apresentavam caras impessoais e sentia-se a ansiedade em todos os cantos. Escolheu uma cadeira e sentou-se. Teve dificuldade em ficar com os pés quietos. Um rapaz simpático abordou-o e pediu que preenchesse um inquérito. Simples. Dados pessoais, habilitações literárias e expectativas. Respirou fundo novamente.
Olhou à volta e reparou que a maioria eram mulheres. Sentiu-se um pouco desenquadrado. Todas muito produzidas e direitas, acabaram por o atormentar e deixar inseguro. Era a sua primeira vez e elas talvez fossem experientes. O ambiente ficou pesado de tanta desconfiança. Começou a faltar-lhe a respiração.
Uma porta abriu-se e saiu uma mulher muito sorridente. O seu ar de satisfação não passou despercebido a quem estava sentado. Teria conseguido o lugar? Ainda estavam tantos candidatos para serem ouvidos. Sentiu um certo desânimo e uma sensação estranha. Tudo era novo, mas ia acabar já ali? Não podia ser!
Chamaram o seu nome. Uma rapariga bonita, de saia preta justa e camisa branca aberta num grande decote, encaminhou-o para uma sala. Um outra senhora estava sentada. Muito atraente e simpática disse-lhe que tinha gostado do seu currículo, mas que lhe faltava a experiência. Ele deu um ligeiro pulo. Tinha acabado de fazer o curso. Era fresco, mas cheio de boa vontade.
Subitamente a senhora levantou-se e mostrou-se em todo o seu esplendor. Bonita, sexy e provocadora. Aproximou-se dele, baixou-se e disse-lhe ao ouvido, como quem não quer a coisa: ” Podemos resolver essa falha. Se quiseres é com a maior das facilidades.” E tocou-lhe na perna. Ele estava em pânico. Não era nada daquilo que esperava encontrar. Sentiu as mãos suadas e um calor estranho. Estava encurralado.
Como era possível que aquilo estivesse a acontecer? Além de muito pouco ético era, com toda a certeza ilegal. Aquilo era uma provocação e uma violação dos seus direitos. Como se atrevia ela? E não o largava. O corpo respondeu o que não devia, porque a carne é fraca e o momento foi rápido e embaraçoso. Aquilo tinha mesmo acontecido?
A sua luta interior foi enorme. Que disparate! Como se deixou levar? Estava feito e não havia volta a dar. Tinha acontecido. Aquele não era o mundo do trabalho. Não podia ser! Estava confuso e de mãos e pés atados. Aquela mulher tinha conseguido os seus intentos, tinha-se aproveitado de um jovem ingénuo que acreditava que a vida oferecia as oportunidades.
Contactaram-no mais tarde. O lugar era dele, mas tinha que cumprir as regras estipuladas. Não tinha como fugir. A armadilha tinha sido bem montada e ele, qual mosca desprevenida, havia caído na rede da aranha que a sabia manobrar de modo ardiloso. A sua vida não foi fácil e os seus serviços eram requisitados com bastante frequência. Não os profissionais, somente aqueles que não constavam no contrato de trabalho.
Era uma violência atroz. Prometiam-lhe determinado posto ou posição, mas tal nunca acontecia. Continuou a submeter-se a todas as “atenções especiais” a que o obrigavam. Definhou. Quase que desapareceu. A sua cabeça explodia a todo o momento. Tinha que acabar com aquilo. Não conseguiu. Adaptou-se e tentou dar a volta por cima.
Um homem num mundo de mulheres é ainda muito mal tratado. Não o valorizam, não o consideram como ser humano e não o olham como alguém que quer ser respeitado. Desapareceu o profissional e servia, simplesmente, para a satisfação sexual daquelas mulheres que o viam como objecto de desejo. Nunca foi promovido como merecia.
Agora leiam o artigo novamente, mas troquem o jovem rapaz por uma jovem rapariga. Acontece e continua a acontecer. Não devia. Denunciem. Não permitam. Lutem. Provem o vosso valor de modo diferente. Apresentem queixa. Queremos um mundo mais justo e decente.