As primeiras memórias com Alice
As primeiras memórias com livros são como pequenos universos que se abrem diante dos olhos de qualquer criança. São páginas que sussurram segredos, palavras que dançam numa mente tão imberbe, ainda em construção, e cuja criatividade é elevada ao expoente máximo.
Ler sempre foi um dos hábitos mais enriquecedores que encontrei na minha existência enquanto jovem e posteriormente mulher.
Recordo-me dos primeiros livros de histórias encantadoras onde o bem sempre vence o mal e o final de qualquer história é sempre feliz e risonho para todas as personagens.
Alice no País das Maravilhas de Lewis Carroll que tão bem conhecemos, é um convite à magia das palavras e a cenários fantásticos onde o irreal se sobrepõe à lógica da normalidade e cada personagem é um transportar para um mundo ficcionado.
Não vou alongar-me mais sobre este livro, essencial no crescimento de qualquer criança, mas falar de outra Alice também sobejamente conhecida entre todos – Alice Vieira.
É conhecida por um vasto legado de obras que são histórias para crianças, contadas por alguém, que vive quase na primeira pessoa da personagem “criança”, as ansiedades, as preocupações, os devaneios do universo infantojuvenil com uma realidade tão próxima, porque também ela foi uma criança com as mesmas motivações, lamentações e anseios.
Para além de outros livros que foram marcantes na minha infância e adolescência, como: Contos Exemplares de Sophia Mello Andresen, o Principezinho de Saint-Exupéry, ou Mulherzinhas de Louisa May Alcott, Alice Vieira, com a sua “Rosa minha irmã Rosa”, foi um livro que me marcou e influenciou quando planta sementes de curiosidade e de ternura nos corações jovens.
Cada página desta história tem poder da palavra, consegue transportarmo-nos para outras realidades, as personagens tornam-se os amigos imaginários de qualquer criança, confidentes silenciosos de sonhos e também de medos infantis.
A autora Alice Vieira, que tive o prazer de conhecer pessoalmente numa tertúlia poética de autores em algures do ano 2019, porque Alice Vieira não escreve apenas histórias de ficção, escreve igualmente poesia e muito apreciada entre a comunidade literária, é para além de autora, um ser humano fantástico, de uma verticalidade de saber estar e comunicar na nossa sociedade, com riqueza de conhecimentos e, acima de tudo, uma contadora de histórias de mão cheia.
Com ela comecei a apreciar as histórias infantis portuguesas, escritas por uma autora portuguesa, aprendi a folhear incansavelmente cada livro que era editado e lançado no mercado, aprendi a saber voar sem sair do chão.
Alice Vieira, é uma autora que sabe falar diretamente ao coração das crianças, criando um laço invisível de conexão emotiva, quando consegue cativar-nos para conhecer tantas histórias.
“Rosa, minha irmã Rosa”, a primeira obra de Alice Vieira, dá-nos a conhecer a experiência mágica do nascimento de uma imã mais nova e a vivência e história de Mariana, que vive a personagem de irmã mais velha que se vai debater com algumas inseguranças e medos.
Nada mais ficará como antes naquela família e é comovente a mensagem que Alice Vieira nos transmite.
Fez-me lembrar muito a minha história de família, já vivi na minha pessoa o facto de ser a irmã mais nova e de ter mudado toda a história individual da minha irmã mais velha Ana.
Não posso deixar de manifestar que adoro o cheiro de livros novos, folhear páginas atrás de páginas, sorver cada palavra e vivenciar cada mensagem transmitida.
Embora seja uma forte adepta de tudo o que é inovação e tecnologia, ainda não consegui deixar de ler livros em papel e substituir o ato da leitura por um e-book – simplesmente não consigo até ao momento.
Os livros acompanham-me há tanto tempo que são companheiros de uma vida, de viagens de experiências e não consigo desfazer-me do papel.
Gosto de tirar notas nos livros, revisitar passagens que me cativam e até emocionam para voltar a ler novamente.
Os livros são memórias únicas, umas vezes mais duras, diria até quase “cruas”, mas fazem-nos evoluir como seres humanos, permitem o nosso desenvolvimento cognitivo e cultural, são fonte de aprendizagem e iluminam caminhos. Estão guardados num espaço muito especial, na nossa memória, prontos para serem revisitados e revividos quando precisamos de lembrar a magia de ser-se criança.
Para além de Alice Vieira, outros autores influenciaram o meu crescimento e formação enquanto adolescente e posteriormente como mulher e, a relação que mantenho com esses livros, é quase como amigos e companheiros inseparáveis de muitos momentos inesquecíveis.
Talvez por esse motivo, a escrita esteja sempre tão presente na minha vida, inicialmente por via da poesia e depois nos contos e histórias.
Deixo-vos com este pensamento do último livro de Miguel Esteves Cardoso, “Como Escrever”, um livro muito interessante para quem gosta de ler e dominar principalmente a essência das palavras.
“Ao mundo convém que não escreva.
Convém que seja um leitor e um comprador de livros.
Convém que seja um consumidor…”
In “Como escrever” de Miguel Esteves Cardoso
Nota: este artigo foi escrito seguindo as regras do Antigo Acordo Ortográfico