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A porteira da arte

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Coração Independente (2004-2006)

Se Ajuda rima, por estes dias, com Joana Vasconcelos, o que rima com palácio, ou melhor, palácios? Começa a ganhar a forma de uma lista o nome daqueles pelos quais a artista plástica tem exibido os seus monumentos. Não são precisas rimas. Primeiro Versalhes, em Paris e, agora, Ajuda, no forte em que se alegram as vistas para o Tejo. O rio da capital, que, aliás, ganha contornos de iconicidade no cruzamento dos trajectos pessoal e profissional – tanto vive, como trabalha (conjuntamente com uma equipa de três dezenas de colaboradores – a sua ‘‘família artistíca’’ –  no seu ateliê), sobre a centelha fluvial.

Foi Francisco José Viegas, o ex-secretário de Estado da Cultura, que, qual mordomo, escancarou as portas do Palácio da Ajuda a Joana de Portugal, como lhe chama, para um desfile da sua colecção, em jeito de atractivo cultural Primavera-Verão (grande parte das suas peças podem ser vistas até final de Agosto, ali). A artista plástica, nascida em 1971, mas em França (entrou em Portugal após a revolução), ver-se-á ainda  obrigada, tal é o seu reconhecimento, a criar uma peça de louvor a todos os encómios que lhe têm sido dirigidos. Para a imprensa estrangeira, a título de exemplo, consagrou-se a personalidade portuguesa do ano 2012, mas já no início do milénio chamava a atenção – recebeu o Prémio EDP Novos Artistas.

Marilyn (2009)
Marilyn (2009)

O entusiasmente regresso ao país de origem tem em Versalhes impressão indelével. A exposição foi a tatuagem de Joana Vasconcelos desse ano, arrojando o seu trabalho (e nome) para lá das fronteiras europeias, destacando-se por ser a primeira mulher (e mais jovem artista contemporânea) a conquistar Versalhes. Um milhão, seiscentas e setenta e nove mil pessoas passaram pelo majestoso Palácio e requintados jardins daquele que é o príncipe de Paris, transformando a exibição na mais concorrida dos últimos cinquenta anos. Versalhes apresentou dezassete obras da artista, ligando peças originais – pensadas especificamente para se fundirem com o espaço – a outras já sobejamente conhecidas do seu portefólio, embora todas ‘‘falassem Portugal’’. Versalhes, o recônditório da sua imaginação, foi o pano de fundo ansiado pela sua obra, o seu cenário de sempre, a falar português, mesmo que com algum sotaque.

Quase dicotomia, esta, de Joana, que respira francês, por inspiração portuguesa. Desde pequena que a arte precipita-se furiosamente nas suas veias e exprime-se numa linguagem universal. A genealogia foi favorável e impulsionou a doce aceitação da herança. Os seus estudos comungaram da joalharia e do desenho e o seu crescimento, em Linda-a-Velha, esteve repleto das influências que bebia dos familiares (a avó era pintora e o pai fotógrafo) e amigos próximos. Tudo misturado, foram os ingredientes que fizeram com que ‘‘sem saber bem’’ caminhasse por aventuras tridimensionais, algo que eclodiu quando ainda estudava na Ar.Co.

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A Noiva (2001)

Cunhada, pelo filósofo francês Lipovetsky, como ‘‘hipermodernista’’, Joana saiu cedo da sombra e ganhou forma, recorrendo-se de uma máxima sua – o artista plástico tem a porta da arte aberta e incorpora, hoje em dia, a escultura, a pintura, o desenho, a instalação e qualquer domínio artístico, desde que tenha na mira a forma (e o conteúdo) de como se quer expressar. Ela já sabia, certamente, o que queria, na altura em que, com 25 anos, pediu ao pai 48 contos (240 euros) para comprar cerca de trezentos espanadores, com penas de tom lilás, para um dos seus primeiros trabalhos. Ela já sabia, certamente, o que queria quando pegou num mundo de tampões higiénicos e compô-los em forma de lustre. Só não contaria que, A Noiva, como chamou à peça, fosse deixada de fora, censurada na boda de Versalhes.

A determinação, convicção e perspicácia irromperam igualmente cedo no seu caminho. Talvez tenham ajudado os doze anos da prática de karaté, que a levaram à condição de cinturão negro, ou a chefia da equipa de seguranças da discoteca Lux, ocupação que teve por dois anos, à qual apelidou, para lá de uma ‘‘experiência enriquecedora’’, de curso rápido de Sociologia. Marcos vistos à distância do presente, mas singularidades que formam um corpo. É exactamente assim, também, no seu trabalho. Inspira-se com a naturalidade de uma respiração e rabisca o que pode e consegue no bloco de notas, seu parceiro incondicional. Os apliques, esses que chegam na hora inicial do trabalho prático, tanto podem vir de uma loja do chinês, como de uma qualquer feira, ou até do baú.

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Gardes (2012)

Para o baú ficará, absolutamente, aquela que poderá ser a sua resposta aos tais encómios. O cacilheiro Trafaria-Praia é o mais recente, ‘‘ambicioso e complexo’’ encargo de Joana Vasconcelos. Neste caso, nem os protagonistas mudaram: Francisco José Viegas desafiou-a a ser a embaixadora de Portugal na Bienal de Veneza, propondo-lhe criar um projecto que servisse para representar oficialmente o País naquela mostra internacional de arte. O monstro flutuante, que até há dois anos se manteve operacional, e também ele figura incontornável do Tejo, revitalizar-se-á com azulejos no exterior, contendo, no seu íntimo, aplicações têxteis, havendo espaço também para a macieza da cortiça. O cacilheiro corresponde, desta forma, a outro dos objectivos da Joana de Portugal: cruzar universos que não se tocam, habitualmente – a arte e os meios de transporte e em concreto este ferry, ‘‘ parte identitária da cidade de Lisboa’’. Ele que, em Veneza, está autorizado a passear-se pela área da Laguna. As portas serão abertas por Joana Vasconcelos, já no último dia de Maio.

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