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A face oculta da Mutilação Genital Feminina

Seguramente já ouviu falar em Mutilação Genital Feminina (MGF), mas certamente pareceu-lhe sempre uma realidade longínqua. Talvez até tenha considerado que seria algo impensável de ocorrer em países avançados como o Reino Unido ou França. De carácter ancestral, esta prática continua a ocorrer, sobretudo, no continente africano, pelo menos em 28 países de África e do Médio Oriente. Contudo, nos últimos anos, percebeu-se que a Mutilação Genital Feminina afecta também meninas e mulheres na Europa, América do Norte e Austrália, pois é perpetuada pelas comunidades emigrantes existentes, oriundas dos países onde esta é uma prática aceite.

O Parlamento Europeu estima que 500 mil raparigas e mulheres, na Europa, sofram as consequências da MGF e que 180 mil por ano estejam em risco de serem vítimas desta prática.

Numa recente reportagem da BBC, sobre esta temática, dá-se conta que cerca de 20 mil jovens mulheres no Reino Unido e em França estão em risco de serem vítimas de mutilação, adiantando também que a forma escolhida pelas autoridades de cada país para lidar com esta situação é bastante diferente. Ayanna, vítima de MGF e refugiada em Glasgow, explica que outras mães permitem que as suas filhas sejam sujeitas à MGF em território britânico e revela à BBC o caso de duas crianças, uma de três anos e outra de apenas duas semanas de idade, que foram mutiladas por mulheres mais velhas. “Elas usaram lâminas, tesouras e facas afiadas”, relata.

A MGF é uma prática que implica a remoção de uma parte ou da totalidade dos órgãos sexuais femininos, por razões não médicas. Existem vários tipos, com diferentes níveis de gravidade. Conforme as tradições podem ser removidos o clítoris ou os lábios vaginais, ou, então, recorrer a um dos métodos de maior gravidade que é a infibulação, que consiste na costura dos lábios vaginais ou do clítoris, deixando uma pequena abertura para a urina e a menstruação. Cerca de 15 por cento das mutilações ocorridas em África são infibulações.

Este não é um costume inofensivo, mas antes uma prática que causa danos físicos e psicológicos irreversíveis às mulheres e, em muitos casos, a morte. Infecções crónicas, hemorragias, perigos durante o parto, dores agonizantes durante as relações sexuais e diminuição ou ausência total do prazer sexual são algumas das outras consequências da MGF. Segundo a Amnistia Internacional, “algumas culturas acreditam que os órgãos femininos são impuros e têm de ser purificados e, por isso, erradicados. Também se pensa que a MGF melhora a fertilidade e desencoraja a promiscuidade sexual”. É também considerada necessária para que a mulher seja completa e para que se torne mais dócil e obediente.

Vista como uma forma de violência contra as mulheres e uma violação dos Direitos Humanos, permanece a questão sobre como é possível esta prática manter-se activa em pleno século XXI em Estados-Membros da União Europeia (UE). Segundo informações veiculadas pela Amnistia Internacional, apesar da França, Suécia, Reino Unido e outros Estados-Membros terem criminalizado a MGF há mais de uma década, estes países continuam a lutar contra esta prática. “Isto mostra que a legislação não é resposta suficiente. A UE tem de adoptar uma abordagem integrada, que envolva os membros da comunidade, para assegurar que as raparigas sejam protegidas e que as suas famílias não sejam estigmatizadas”, reitera Christine Lourdes, directora da campanha europeia “Fim à Mutilação Genital Feminina”. Tanto a Amnistia Internacional, como o Lóbi Europeu das Mulheres defendem que os Estados-Membros da UE devem assinar e ratificar a Convenção para a Prevenção e Combate da Violência contra as Mulheres, cujo objectivo é prevenir e combater a violência contra as mulheres e a violência doméstica. No passado dia 6 de Fevereiro, Dia Internacional da Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina, a parceria portuguesa da campanha europeia “Fim à Mutilação Genital Feminina”, constituída pela Amnistia Internacional Portugal e pela Associação para o Planeamento da Família, apelou ao Estado português que ratificasse a Convenção.

Em declarações à BBC, um grupo de mulheres da Somália a viver em Glasgow, todas vítimas de MGF, confessaram que ficariam muito felizes, se as autoridades ajudassem acabar com esta prática. Uma das mulheres declarou que desde que chegou a Glasgow há dois anos, nunca ouviu nada sobre o assunto. “Devia haver anúncios, aulas para as pessoas compreenderem o que está certo e o que está errado”. Apesar de a MGF ter sido criminalizada no Reino Unido e em França, durante os anos 80, até hoje não houve nenhuma condenação no Reino Unido. Contrariamente, cerca de cem pais e praticantes da MGF foram já condenados em França. Para Isabelle Gillette-Faye, activista contra a MGF, isto deve-se à postura de cada governo em relação aos seus imigrantes. Em França, “eles devem integrar-se e obedecer às nossas leis” e as mães e as crianças frequentam clínicas especializadas até aos seis anos. A genitália das bebés é examinada regularmente, em busca de sinais de mutilação. O mesmo não ocorre no Reino Unido, o que torna a detecção mais difícil.

Também na Alemanha a mutilação foi proibida, mas a prática é mantida clandestinamente. Jawahir Cumar, da Somália, foi sujeita à mutilação muito nova, como muitas outras meninas do seu país. A fim de erradicar esta forma de violência, Jawahir Cumar fundou, em 1996, a organização “Stop Mutilation”, para prevenir que cerca de mil meninas e mulheres, na Alemanha, corram o risco de serem vítimas desta prática.

Numa notícia avançada pelo jornal Público, é referido que em Portugal ainda não existem números sobre este fenómeno, mas Lisa Vicente, responsável pelo departamento de saúde reprodutiva da Direcção-Geral da Saúde, garante que o facto de não existirem dados estatísticos “não significa que (a MGF) não seja uma realidade”.

Erradicar todas as formas de violência contra as mulheres, incluindo a mutilação genital feminina, deve ser uma prioridade, especialmente em tempos de crise. Sabemos que a União Europeia tem os meios para acabar com a violência contra as mulheres e para desenvolver uma estratégia que permita que vivam sem violência. De que estamos à espera?”, questiona Cecile Greboval, secretária-geral do Lóbi Europeu das Mulheres.

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