Tony

O filme “Tony” de Jorge Pelicano é um retrato nunca antes feito sobre a vida do artista da Pampilhosa da Serra, Tony Carreira, onde garantem presença a família, os amigos e as histórias desses milhares de portugueses que o acompanham há 30 anos e que, mesmo nos momentos mais difíceis, nunca o abandonaram.

Tony Carreira assinalou, em 2018, 30 anos de carreira, anunciando uma pausa “no seu percurso musical” por tempo indeterminado.

O documentário é, de facto, muito exaustivo e retrata as várias fases da carreira de Tony Carreira. Várias imagens de arquivo de finais dos anos 80, início dos anos 90 e do ano 2000 foram introduzidas no filme para mostrar como, de forma persistente e obstinada, Tony venceu o fracasso e as dificuldades de um emigrante português e transformou tudo isso num sucesso estrondoso.

O documentário mostra a viagem de comboio que o artista fez na infância de Portugal até uma cidade dos arredores de Paris e imagens da fábrica onde trabalhou. Os seus primeiros passos na música, quando formou a sua banda. A sua participação no Festival RTP da Canção, que redundou num estrondoso fracasso, e a frustração de expetativas. A cooperação com o seu amigo e compositor Ricardo Landum na composição de letras para as suas músicas.

Imagens do concerto no Olympia de Paris, no Coliseu de Lisboa e no Pavilhão Atlântico. Depoimentos dos seus incondicionais fãs que passam vidas duras e que fazem privações económico-financeiras só para encontrar nas músicas de Tony Carreira alívio para os seus sofrimentos emocionais e amorosos.

É possível ver também no filme a forma como Tony Carreira lidou com as acusações de plágio da música “Despues de ti“. A visita do artista à campa de Mike Brant, em Israel, artista franco-israelista que ele admirava muito nos anos 70 e que ficou celebre com êxitos como “Rien qu’une larme dans tes yeux“, “Qui saura“, “C’est ma prière” e que se suicidou em finais dos anos 70. Por fim, o portentoso concerto de despedida no Meo Arena, em Novembro de 2018, com a presença de cerca de 15 mil pessoas e que contou com a presença dos seus filhos Mickael, David e Sara que também atuaram com ele. Tony levou o público ao êxtase com a interpretação do tema “Já que te vais“, uma música que retrata a temática do amor não correspondido e que emociona enormemente quem passou por uma situação semelhante.

“Tony” é um documentário intimista. Revela o lado humano de Tony Carreira, a forma como se relaciona e comunica com os seus fãs. É um documentário que revela o seu poderoso lado humano. Exemplo disso é o momento em que vai visitar a campa de Mike Brant em Israel e chovia torrencialmente. Uma das pessoas que também se encontrava no local acaba por elogiar a sua atitude e afirmar que estava a chover muito porque o céu está a chorar muito como forma de agradecimento pela homenagem que estava a fazer a Mike Brant.

Tony nunca desejou ser outra coisa que um cantor romântico que marcasse e tocasse a alma das pessoas. Ricardo Landum, que compôs grande parte das músicas de “Tony”, refere-se ao cantor não como um cantor extraordinário, com o maior poder vocal à face da Terra ou com uma presença em palco extraordinária, mas como um cantor capaz de tocar no coração das pessoas. É esse o incrível dom e poder de Tony. De forma humilde e consciente, Tony sabe que o sucesso é efémero e nunca foi a intenção de ser lembrado como uma lenda da música que o moveu. Como diz o próprio:

Nunca quis ser imortal na música, porque eu acho que ninguém fica na história, mas, quando sair, quero sair pela porta grande.

Foi essa característica de cantor romântico que fez Tony granjear uma imensa popularidade e sucesso. Tony abraça o sofrimento emocional de muitas pessoas com a melodia das suas letras. E as músicas não são vingativas ou desejam o mal a quem causou o sofrimento emocional. Evocam a necessidade de seguir em frente e de desejar a felicidade a quem causou a decepção amorosa. É essa visão pura e singela do amor que dá a Tony um toque especial.

O filme foi muito bem realizado por Jorge Pelicano, que não conhecia pessoalmente Tony Carreira. O realizador da Figueira da Foz que já realizara quatro filmes, sendo o último “Até que o Porno nos Separe” de 2018, consegue retratar o enorme poder de comunicação de Tony, a sua assertividade que ficou bem patente, quando se defendeu das acusações de plágio e também a sua enorme capacidade de se relacionar com os seus fãs. O processo de pré-produção e produção foram muito exaustivos, compreendendo deslocações de Miami (onde Tony visitou o cantor que era acusado de plagiar) e Israel. Jorge Pelicano merece créditos e palavras de apreço pela energia e entusiasmo com que abraçou este projeto. Fez um trabalho de realização muito meritório.

Gostei muito do documentário. É o terceiro filme autobiográfico que vi num curto espaço de tempo. Vi os filmes “Bohemian Rapsody“, que retrata a vida e carreira de Freddie Mercury, e “Rocketman“, que retrata a vida e carreira de Elton John. Foram grandes filmes de que gostei muito, só que nesses filmes retrataram-se os excessos e os momentos de desequilíbrio que esses artistas tiveram em várias fases das suas carreiras. Em “Tony” não encontramos isso. Tony teve uma vida e carreira pautada pelo equilíbrio, nunca se deslumbrando com o sucesso e nunca tendo um grande histórico de conflitos e casos mediáticos. Tony Carreira não teve o impacto global nem o poderio vocal que Freddie Mercury e Elton John tiveram, mas desfrutou melhor e com mais felicidade do seu sucesso, nunca tendo os momentos de “Burnout” que eles tiveram.

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