Ser self-made em 2022 é algo bastante valorizado e sexy até. Revela o incrível valor pessoal e a enorme perseverança de alguém que conseguiu vingar e vencer por si mesmo, com poucas ou nenhumas condições de berço, constituindo assim fortuna, mérito ou carreira exclusivamente pela força das suas capacidades e da sua ambição. No entanto, nem sempre assim foi.
Nas últimas três décadas do séc. XIX, os EUA viveram aquilo que ficou conhecido como “The Gilded Age”. Uma época marcada pelo fim da Guerra Civil, em que se viveu um rápido crescimento económico, promovido pela crescente modernização e industrialização, pela expansão dos caminhos de ferro e pela melhoria das condições de vida e dos rendimentos médios das populações urbanas. Estavam então criadas as condições ideais para o aparecimento de grandes fortunas. A série The Gilded Age (HBO Max) é passada nessa época. Numa Nova Iorque que vive a sua época dourada e se divide pelo conflito social (vivido baile a baile), entre a tradição das grandes fortunas convencionais, Old Money, e as novas fortunas, dos que empreenderam e treparam a rígida escada social.
A história inicia-se pela jornada de Marian Brook (Louisa Jacobson) até Nova Iorque, quando se vê sozinha após a morte do pai, sem dinheiro e cheia de dívidas, tendo como única opção mudar-se para Nova Iorque e ir viver com a rígida tia Agnes Van Rhijn (Christine Baranski) e a compreensiva tia Ada Brook (Cynthia Nixon). Duas senhoras da alta Sociedade Nova Iorquina, de linhagem tradicional e, consequentemente, adeptas do Old Money.
Paralelamente, também a família Russell se instala no seu recém-renovado palacete na Quinta Avenida, mesmo em frente à casa das tias Van Rhijn-Brook. George (Morgan Spector) e Bertha Russell (Carrie Coon) são um casal de novos ricos, que fizeram fortuna através do investimento nos caminhos de ferro, um casal ambicioso e sequioso de dinheiro e poder.
The Gilded Age estreou no início de 2022 e de imediato viveu o escrutínio e a comparação com Downton Abbey, não fossem ambas as séries assinadas por Julian Fellowes e partilharem a temática e alguns marcadores históricos. No entanto, apesar das semelhanças, a trama americana dedica-se ao momento histórico em que se corta com a tradição europeia na América e à época em que, tanto a cidade de Nova Iorque como a sua alta sociedade, foram redefinidas dando origem à terra do sonho americano, tal como a conhecemos atualmente.
São inúmeros os assuntos abordados, desde o já mencionado embate entre a elite tradicional e os novos ricos, ao alpinismo social, passando pela representatividade afro-americana, racismo e à posição da mulher na sociedade.
No entanto, à medida que a história avança, os enredos ficam aquém da expectativa, uma vez que, salvo raros momentos, as personagens são mornas e desprovidas de paixão, não existindo uma personagem central que verdadeiramente assuma esse papel ou um assunto que nos envolva e seduza verdadeiramente. O casal Russell, com Bertha no centro, são talvez as personagens mais carismáticas e controversas, seja pela sua difícil e sinuosa ascensão ao topo da alta sociedade, ou pela sua relação muito pouco convencional para a época. O facto é que são personagens que se entregam, que vivem e sofrem, levando-nos a torcer por elas.
Os figurinos ricos e luxuosos, são sem dúvida um dos pontos mais fortes da série, repletos de detalhes históricos que nos fazem sonhar, ao mesmo tempo que nos dão sinais sobre a personalidade de cada uma das personagens. A atenção ao detalhe e o elenco de luxo são outros dos aspectos que dão potencial à história e que nos deixam expectantes pela segunda temporada, já confirmada. Esperemos que venha com mais emoção, com a consagração de personagens e que tenhamos personalidades e enredos profundos e com maior frescura, que realmente reflitam a exaltação e inovação da época que procuram retratar.