As raízes são consistentes, amadeiradas e com uma pitada de terra mãe. A nossa essência provém, maioritariamente, dos que nos criaram, dos que nos fizeram crescer, das mãos que nos deram ao atravessar a estrada, do beijo de boa noite que recebemos ao deitar, do “bom dia” calmo ou acelerado das vozes reconhecíveis. Do ralhete ao sorriso e gargalhadas à hora do jantar, das tarefas que tanto nos debatíamos ou questionávamos, por fazer.
Na ganância da diferença, em passados desajeitados ou deslumbrantes, a família é sempre aquela base de primeira linha. É aí onde vamos copiar, passo a passo, a base da nossa existência. É biologia, pura e dura. Mais tarde vamos aperfeiçoando o rumo à nossa imagem, à nossa ideologia ou crença, à nossa “maneira”, com o nosso dedo. E apontamos em caminhos iguais ou diferentes, dependendo sempre do que mais o universo nos chama. Ou não… da realidade que conhecemos apenas nos definimos por ela mesma. Se a indicação que nos deram foi para norte ou sul, o este ou oeste somos nós que o descobrimos e atravessamos. Se foi a comer, falar, conhecer e definir que aprendemos com eles, a opinião, o gosto e as emoções somos nós que automaticamente formulamos.
No que respeita aos nossos moldes, estes são sempre apresentados em formas idênticas aos nossos pais ou cuidadores, e com a idade, vamos vergando esse molde ao nosso gosto pela vida. Neste ponto, podemos classificar estes moldes como crenças ou ideais de vermos o mundo pelos nossos olhos. Se no nosso seio familiar todos virem o mundo a preto e branco, é normal, saudável, interessante e promissor vermos um pouco de verde e azul, também. Ver o mundo a cores não é diferente da nossa família, mas sim ver para lá do que assimilámos. É ser independente do espetro habitual, é saber apreciar os dois polos do mundo, saber saborear o doce e o salgado, saber conhecer o que é nosso e o que é dos outros.
Infelizmente, existem realidades desesperantes, em que o nosso meio familiar não nos vê como “membro” por nascermos ruivos com seis dedos numa mão, ou por gostarmos de courgete na sopa em vez da tão normativa batata, por acreditarmos que a planta cresce também ao luar e não só à luz solar, por crermos no amor entre duas moscas que nos vagueiam por cima das nossas cabeças ou simplesmente porque decidimos continuar a crescer com um propósito próprio que fomos nos apaixonando.
Quase como um degrau que falta na escadaria para o futuro, como se nos obrigassem a subi-las, de dois em dois degraus. Exaustivamente! Criando um desaforo neste enredo, a solidão normalmente apodera-se destes momentos, torna-nos fracos e sensíveis à nossa própria realidade e ao que acreditamos. No aplicar da insistência, uma ou outra pessoa pode facilitar e compreender, mas como em qualquer base de direito individual, uma delas pode nem conseguir ter contacto visual. E por isso, família que tanto associamos, maioritariamente, aos nossos de “sangue”, para alguns são amigos e amores, pessoas que nos conheceram e se mantiveram no nosso habitat natural, sugando a nossa essência e equilibrando-a com a deles. Neste equilíbrio, num abraço ou num beijo, num apertar de mãos ou num simples sorriso, um raio de luz expande perante as nossas sensações e o conforto familiar é atingido!
Família, deste modo, são as pessoas que nos amam por quem somos, que respeitam as nossas diferenças e igualdades, que sabem perdoar e acolher os nossos erros, são aqueles que nos levam ao encontro das soluções em busca de ajuda ou orientação, que nos avisam dos nossos atos menos racionais e que nos veem como humanos e não como cópias da sua própria imagem, ou imaginação.
Podemos ponderar e aceitar que, por alguma razão, não nos aceitem mas não devemos abraçar a nossa negação e viver a vida, de alguém que diz que nos ama, escreveu e ditou.
Nota: este artigo foi escrito seguindo as regras do Novo Acordo Ortográfico.