Um dia destes, dei comigo a escrever um pequeno conto sobre uma mulher que – em linguagem comum – não batia bem da cabeça. Não sei dizer de onde aquilo me veio, mas fez-me sentido criar uma personagem incapaz de se identificar com as dores do outro. Talvez tenha a ideia surgido da convivência que mantive, durante algum tempo, com um certo psicopata. Uma relação laboral que acabou quando eu me cansei de “aturar malucos”.
A escrita desse conto levou-me a querer saber mais. Na verdade, levou-me a querer perceber por que raio a Natureza se lembrou de criar seres que têm como propósito infernizar a vida dos outros. Desde então, fiquei fascinada. E, de alguma forma, apaziguada com a minha experiência. A verdade é que a psicopatia, manifestada numa série de comportamentos e atitudes próprios, não é culpa de ninguém (eu sei, eles não têm a culpa, mas nós também não!).
Quando pensamos num psicopata, pensamos logo num serial killer, cujo prazer maior é matar e cortar as vítimas às postas, armazenando-as numa arca frigorífica. Também há desses, mas felizmente não são os que existem em maior número. Existe um espectro na psicopatia, tal como existe no autismo, e de um ponto a outro vai uma grande distância.
O interesse da minha pesquisa recai sobre os denominados psicopatas funcionais. Pessoas perfeitamente enquadradas na sociedade, aparentemente “normais”. O nosso chefe (foi o meu caso), o vizinho do lado, com azar, a pessoa que vive connosco ou um dos nossos filhos.
De acordo com os estudos existentes, entre 1% e 2% da população apresenta algum tipo de grau de psicopatia e são mais os homens do que as mulheres a sofrer deste transtorno (abstenho-me de fazer comentários neste ponto).
O que é, afinal, a psicopatia? É um transtorno de personalidade que se caracteriza, de forma simplista, pela incapacidade de se sentir empatia. Ou seja, de nos colocarmos no lugar do outro. Um psicopata não é uma pessoa má (assumindo que para existir maldade tem de existir o reconhecimento do certo e do errado), ele (ou ela) apenas acredita que tem mais direitos do que os restantes e não percebe que isso pode significar o sofrimento do outro. Aliás, ele nem percebe bem o que é isso do sofrimento. Ou do medo. Ou da tristeza. Ou do amor. Os sentimentos são território desconhecido para estas criaturas, embora os saibam imitar muito bem, sempre que daí possam tirar algum proveito.
Uma das reflexões extremamente interessantes que li, abordava a imprescindibilidade da existência de psicopatas para a sobrevivência da espécie. Porquê? Porque são os psicopatas quem melhor consegue manter a calma em momentos de stress, actuando em situações críticas onde os comuns mortais paralisam. Querem saber um facto muito engraçado? Em momentos de stress, os batimentos cardíacos tendem a acelerar, certo? Já todos sentimos isso. Não o dos psicopatas. Não só não aceleram, como abrandam, permitindo tomar as rédeas da situação. Há, assim, uma linha muito ténue entre a psicopatia e o heroísmo.
Uma outra característica muito curiosa tem que ver com o bocejo. O que acontece quando alguém boceja perto de nós, é nós bocejarmos também. Acontece igualmente com os primatas, mas não com os psicopatas. Como o poderiam fazer, se não sentem afinidade com ninguém? Mas atenção, se pode ser verdade que os psicopatas não reflectem os bocejos, o contrário não é verdade. Não é por alguém não bocejar quando o fazemos que é um psicopata. Não comecem para aí a testar as pessoas, acabando a fugir a sete pés de quem pode ser até bem interessante. Mas…
Não se deixem iludir. Os psicopatas são, por definição, charmosos e confiantes. Bem-falantes. Facilmente nos deixamos enganar por eles. Até percebermos o quão manipuladores, egocêntricos e implacáveis podem ser.
Tudo o que aqui fica dito, é menos de uma gota no oceano da psicopatia e apenas resultado dos quantos livros que tenho lido sobre o assunto. Não tenho nenhum tipo de formação em Psicologia ou Neurociência. O que tenho é um fascínio por perceber a mente das pessoas, ou talvez uma grande vontade de concluir que muito do mal existente no mundo, é apenas uma falha da Natureza (é mais fácil de aceitar).
Entretanto, a personagem que por alguma razão cresceu em mim sem razão aparente, ainda não me largou e cá me parece que não irá largar tão cedo.
(Para quem se esteja a perguntar, só por ter falado em bocejos, já o fiz três vezes. Nada temam, portanto!)