Não se constrói um bom hospital com dinheiro, mas com boas pessoas.
Será que no SNS português encontramos o nível de humanidade que se encontra na série New Amesterdan?
Ou, será que, neste mundo iludido pelos ecrãs da televisão se encontra veracidade nos actos, nas palavras, na vivência, no que é real e se perde nas imagens geradas?
Eu, que trabalho neste meio há mais de 20 anos, questiono-me todos os dias se estamos mais humanizados ou se, por outro lado, formatados ao ritmo frenético das tecnologias digitais nos automatizámos e perdemos o bom senso do quão importante é sermos empáticos. Principalmente, se não, imperativamente, no âmbito dos cuidados de saúde.
Escolhida a série, de tantas outras possíveis, venho aqui falar de amor, de humanidade, de alegria, de exigência e responsabilidade profissional, de vontade em ser melhor, fazer melhor, construir ou dar continuidade a algo maior…
Divago, nestes tempos de pandemia. E, estou, quase “há uma eternidade” a tentar escrever o texto possível para este tema que me foi incumbido.
Desculpem, mais uma vez, todos vós, pelo atraso com que vos apresento o mesmo. (é que sabem,…, não sou muito de televisão…e, a cada dia que passa, me condói de ver o quanto todos estamos “agarrados a esta droga” que nos vicia tanto quanto as restantes) Dela se depende.
As primeiras cenas do episódio 1, da quarta temporada de New Amesterdan, começa com Max Goodwin a correr pelas ruas de Chicago, após uma ausência forçada pelo confinamento mundial da pandemia que nos atingiu.
De seguida, vê-se Helen Sharpe a abrir a porta do seu apartamento e consume-se o beijo, tão esperado por todos, desde a primeira temporada desta série.
Pessoalmente, gosto desta série, e aponto-a como uma das melhores, naquilo a que os serviços públicos hospitalares têm e se “debatem” para permanecer activos, humanizados e com qualidade na sua prestação. Em defesa do que é importante para a saúde pública e a um direito a que todos os cidadãos têm – de acesso aos cuidados básicos de saúde.
Há muitas séries em âmbito hospitalar a circular pelas estações televisivas. Algumas que se perpetuam no tempo, não pela qualidade em mostrar a realidade dos serviços, mas como histórias de gentes que nelas são personificadas e que são apenas mais um “big brother” das coscuvilhices da vida alheia, mas que a muitos atrai.
New Amesterdan é um drama televisivo que se passa entre “os muros” do maior e mais antigo hospital público dos Estados Unidos da América. Com início no ano de 2018 e cuja temporada voltou à Fox Life, em final de Setembro último. Podemos vê-los às quintas-feiras, pelas 22h30 em “tempo real”. Ou, então, assumir o comando da tv como seu e escolher o modo “andar para trás” ou, apenas gravar os seus episódios para mais tarde “os consumir” com tempo e em segurança.
As questões de falta de recursos humanos e meios materiais, o acesso à saúde, os condicionamentos e “agressividade” à volta da doença, dor, sofrimento e morte, surgem-nos, não só nos pacientes que a este hospital se dirigem, como nas pessoas que os acolhem que, tal como qualquer outro ser humano comum, não ficam excluídos só por serem profissionais de saúde ou trabalharem num hospital.
Esta é a forma como são vistos, muitos deles como super-heróis, a que doença ou “intempérie social” são imunes e, que têm de ser “máquinas” humanas sem possibilidade de se queixarem, porque todos aqueles que deles dependem são, meritoriamente, os primeiros.
Tenhamos a certeza que “a vontade de salvar” pode ser emocionalmente perturbadora e avassaladora para qualquer profissional desta área, porque também é certo que “ninguém pode proteger ninguém”. E, as carências no apoio aos profissionais são muitas e cada vez maiores. De modo a que muitos deles escondem depressões ou esgotamentos, stress pós-traumáticos, medicamento-dependentes, lesões musculo-esqueléticas e doenças variadas decorrentes das funções e tarefas repetidamente exercidas.
Para aqueles que não conhecem ou viram esta série, deparamo-nos com um director clínico, Max Goodwin, digno de qualquer hospital, que põe os seus doentes acima de tudo e todos e que, atento, disponível, prestável, humanizado, se coloca entre o burocrático e arrogante sistema económico-social e financeiro em que se assentam as leis hospitalares, e as questiona e põe em causa, em prol dos moribundos e doentes que dele dependem.
Todos os seus colaboradores, Dr.ª Helen Sharpe – médica oncologista e chefe do departamento oncológico; Dr. Iggy Frome – médico psiquiatra; Dr.ª Laura Bloom – chefe de departamento do serviço de urgência; Dr. Floyd Reynolds – cirurgião cardiovascular e chefe de departamento de cirurgia cardíaca; entre outros, dão a cara ao corpo de profissionais que trabalham neste hospital e que, em equipa, trabalham numa constante e disponível condição de “servir” aqueles que a eles chegam. Um estado de dharma, próprio de qualquer profissão que se coloca acima de si como ser humano.
Entre as cenas que incluem a vida pessoal de cada personagem versus vida profissional, cabe um mundo de temáticas a registar que, num adulto comum, em qualquer outro país ou profissão são semelhantes e igualmente notórias para serem registadas.
Durante todo o episódio, existem “flashbacks” entre a cena inicial, onde os protagonistas se abraçam e amam; reflectindo sobre os porquês da vida, pelo tempo em que estiveram confinados e, ausentes uns dos outros; e as cenas que envolvem os restantes personagens e as histórias que fazem este primeiro episódio, da quarta temporada de New Amesterdan.
“Mais alegria!” – diz Max nos últimos minutos do episódio.
E essa alegria é a sua paixão. Que pode ser Helen, a mulher com quem quer passar o resto da sua vida.
Ou, se nos voltarmos para uma vertente mais ampla, mais alegria em todos os momentos que fazem a sua vida, com aqueles que fazem sentido partilhar e receber o nosso amor. Não será assim com todos nós?
Seremos, todos nós, boas pessoas capazes de reconstruir com amor, alegria, persistência e sabedoria, os pilares que assentam um serviço nacional de saúde de qualidade e rigor?
Fica a vontade de ver… e acreditar que se é capaz.