Foi berço da nação e vai ser berço da despedida. Na mala, leva as matrículas europeias, os flashes disparados através das objectivas e mais de 900 espectáculos que acolheu. De consumidora, passou a criadora e a todos os estatutos que a embelezaram na forma de integrar a cultura, 24 horas por dia. Um ano chegou para deixar de ser menina e passar a ser mulher. Cresceu, em todo o seu esplendor, e não há forma de lhe negar a maturidade e beleza. Dizem que está mais limpa, mais segura e mais “habitável”. A sua identidade, essa, está mais reforçada do que nunca e promete ser a rampa de lançamento para um berço de cultura. Por esta altura é provável que já saiba de quem estamos a falar. É verdade: Guimarães, de seu nome e com os seus ilustres 241,3km2 foi a escolhida entre 47 países Europeus, para representar o expoente máximo da cultura. No diâmetro que demarca a cidade, também o calendário se vestiu a rigor para presentear produtores e visitantes a integrar a acção citadina. “Faz parte” foi o mote da Capital Europeia da Cultura e, durante o ano de 2012, todas as programações integraram várias páginas com eventos a norte.
Libertada a expressão há 38 anos, 2012 foi o ano de libertar as cordas vocais, os ritmos do corpo, as projecções em salas escuras, ou as sonoridades instrumentais. Sem censura, nem repressão, juntaram-se os artistas, pintaram-se quadros, exibiram-se fotografias e envolveu-se tudo isto com a participação das massas. Durante um ano de eventos culturais de todos os níveis, foram 41 os milhões de aposta vimaranense. Mudadas as infra-estruturas, os meios e os acessos, houve espaço para remodelar marcos da cidade como a Zona dos Couros, o Jardim do Toural, ou mesmo o antigo Mercado Municipal. Com o seu ritmo e escala própria, Guimarães não deixou que o seu título de “pequena cidade” ganhasse. Para isso, cresceu e tornou-se grande do ponto de vista das chegadas: neste terminal houve malas com etiquetas de todos os cantos do mundo e de todas as áreas da cultura. Porém, o terminal das partidas também se integrou no sistema e permitiu que novas ideias e mundos fossem exportados em todos os embarques.
De desafio em desafio, de dia em dia e de ciclo (de cultura) para ciclo, os desafios multiplicaram-se e, em todas essas barreiras, construíram-se identidades que permitiram a quem é de dentro ter uma visão externa daquilo que Guimarães comporta: tanto, em tão pouco espaço. Para se conhecer a ela própria, a cidade deixou filmar-se, fotografar-se e exibir-se. Aberta a esse mundo de olhos, cadernos e máquinas curiosas, o calendário foi o GPS para o motor desta busca.
Colonizada pela cultura, Guimarães impulsionou a obra portuguesa, convidou artistas estrangeiros e permitiu uma interacção com o público. Os eventos, esses, são quase impossíveis de enumerar, tal como os aplausos, que se contam em milhares. Não só pela agenda, que voou até vários países, como também pelas obras, Guimarães foi destaque em vários campos. Entre 589 projectos, a Plataforma das Artes, pelo colectivo Pitágoras Arquitectos, venceu o Detail Reader’s Prize e enalteceu o papel da arquitectura para a sociedade.
Em Guimarães 2012, viu-se, absorveu-se e sentiu-se. Viveu-se ao ritmo de uma agenda preenchida e talvez se tenham dormido menos horas. Para os que sonharam em passar por lá, mas não o fizeram, a promessa vimaranense mantém-se: a cidade vai continuar a ser um porto de abrigo às artes e, apesar dos eventos sofrerem uma redução exponencial no próximo ano, as ruas vão continuar a ser percorridas pela veia cultural que inundou a cidade em 2012 e que ainda o vai convidar a “fazer parte”.