Ei-los que partem / novos e velhos / buscando a sorte / noutras paragens / noutras aragens / entre outros povos / ei-los que partem / velhos e novos / Ei-los que partem / de olhos molhados / coração triste / e a saca às costas / esperança em riste / sonhos dourados / ei-los que partem / de olhos molhados / Virão um dia / ricos ou não / contando histórias /de lá de longe / onde o suor / se fez em pão / virão um dia / ou não
– Manuel Freire
Portugal foi desde sempre O país da Diáspora! Partimos pequeninos em busca de novas paragens, novos desafios. Partimos em busca de aventura, em busca de oportunidades. E Voltámos! Voltámos de sacola cheia, na bagagem trouxemos tanto! Trouxemos os tais novos mundos ao mundo, novas histórias para contar, novas tradições, novos amigos! Deixámos tanto de nós, trouxemos tanto deles!
No entanto, aqui, no nosso paraíso à beira mar plantado, nem tudo são rosas. E ao longo da história moderna fomos sofrendo q.b. e saímos novamente, desta feita à procura de outras paragens, daquelas que nos trouxessem a prosperidade necessária para regressar a Portugal, nem que fosse para gozar a velhice. Fugimos de regimes totalitaristas, procurámos a paz de espírito e corpo noutras paragens, e, mais uma vez regressámos.
Temos tanta gente “lá fora”, quase tanta como “cá dentro”, gente que anseia pelo querido mês de Agosto, pelos tais 15 dias de férias que sabem a mel e aquecem o coração como o sol de verão nos aquece o corpo. Os 15 dias do verdadeiro descanso. E é vê-los a atravessar a fronteira, de carros carregados de tudo e corações carregados de saudade.
Parece fácil ser emigrante? Parecem ter uma boa vida “Lá fora”. Estão melhores que nós, ouvimos tantas vezes em surdina (ou não). Pois, sim, mas talvez não. Para eles não será de todo.
É preciso força de Ulisses para acordar todos os dias num pais que não é o nosso, um país que nos acolheu, mas nem sempre nos aceitou. A vida de um emigrante que pensa voltar ao seu país é apenas uma: trabalhar, trabalhar, trabalhar e, como se isso não chegasse, trabalhar um bocadinho mais. Admiro emigrantes que o são há 30 ou 40 anos, mas esses, muito provavelmente, não pensam em regressar. Têm uma vida lá, aquele país já é o deles também. Os filhos têm alma lusitana, mas já são “filhos de Portugueses” já não são “De Portugal”.
Há pouco tempo, até o próprio governo nos disse: Emigrem! Procurem lá fora o que não há ca dentro. E, como o “ir” agora não é difícil e já não têm que esperar pela noite ou atravessar fronteiras a pé. Já não vão de “assalto”, nós lá fomos: sonhos na bagagem, diplomas numa mão, na outra uma mala cheia de esperança. Gastámos tudo por um sonho. A nova geração de emigrantes foi com um sorriso nos lábios e lágrimas no coração, mas foi. E agora, ei-los que voltam!
Voltam ainda mais fortes, voltam com a experiência, com o orgulho de ser Português, voltam para a terra que os viu nascer, que os ajudou a crescer e que um dia os viu partir, que, a alguns, mandou embora. Voltam com a mala ainda mais cheia de sonhos, com vontade de trazer para casa um saber de experiências feito. E nós cá estamos para os receber.
Infelizmente, nem todos trouxeram na bagagem os tais sonhos realizados, alguns regressam nus, nus de vontade, cansados e de carteira vazia, de mágoa no coração, de vergonha porque, afinal, para mim não deu. A tal mala, que saiu daqui cheia de sonhos, às vezes volta cheia de mágoa.
Outros há que, enquanto lá estiveram lutaram com unhas e dentes para vencer, lutaram por eles que lá estavam e por quem, por diversas razoes, cá ficou. Lutaram, sim, porque um emigrante é um lutador, num campo de batalha estrangeiro: lutando contra a saudade, lutando contra a vontade de voltar sem olhar para trás, mas lutando, porque sabem e esperam ganhar a batalha para um dia viver “melhor”. Contudo, a vida é caprichosa e também esses regressam por vezes obrigados pela doença, pela velhice, vencidos pelo cansaço, outras vezes porque simplesmente não dá mais. E, ao voltar, percebem que a vida aqui continuou, os desafios continuaram e regressam apenas para mais mil batalhas, desta vez num campo conhecido.
Acho engraçado que, os outros, os que cá ficaram, olhem para os que voltam de soslaio, com um certo desprezo: “Estiveste lá fora, vens rico.” “Aqui nada presta, porque voltaste?” “Achas que isto melhorou? Cá estamos na mesma. Lá ganhas melhor!”
Até pode ser verdade, até pode ser. Ou, então, não. Parece fácil? Afinal quem disse que emigrar é sinónimo de enriquecer facilmente?
Ei-los que voltam, coração a transbordar de saudade, mãos calejadas, orgulho de ser português, ei-los que voltam a casa. Por que não acolher como tão bem sabemos fazer? São filhos que regressam aos pais, pais que voltam para os filhos, avós que vêm conhecer netos. Vamos ser como gostamos de ser conhecidos e praticar a nobre arte de bem receber. Ei-los que voltam, que sejam bem-vindos!