Curiosidade Gastronómica interessante

Quase tudo na cozinha me desperta interesse. A criatividade, a escolha dos ingredientes, a preparação, a confecção, a prova e o degustar. Não que seja uma grande cozinheira, mas se tivesse de escolher 5 interesses na minha vida, a cozinha seria um deles!

E há algo de muito curioso na relação entre a cozinha e inúmeras outras coisas… como por exemplo a relação entre culinária e Guerra. Como é que algo tão preocupante, mau, forte, dilacerante pode ter efeitos tão significativos e marcantes na gastronomia?

Se pensarmos naquelas que foram as “piores guerras” (como se não fossem todas horríveis), a primeira e segunda Grandes Guerras: A escassez de alimentos levou à criação de pratos muito diferentes e a substituições inusitadas. O racionamento, a falta de ingredientes e a necessidade de sobrevivência em condições muito difíceis fez com que as pessoas tivessem de inventar na cozinha usando o que havia disponível de forma inovadora. Muitas receitas populares hoje em dia (como por exemplo os bolos sem ovos e os pães sem fermento) tiveram a sua origem nessa altura. Mesmo as técnicas de preservação (a fermentação, a salga, a secagem) foram adaptadas em virtude das guerras. E muitas vezes estas mudanças nos hábitos alimentares e na culinária são só temporárias, mas por vezes são permanentes.

Mesmo durante os conflitos, são desenvolvidas refeições prontas para consumo, chamadas de “ração militar”, que fornecem os nutrientes necessários para as tropas em combate. A disponibilidade destas refeições de emergência pode também influenciar a culinária em regiões afectadas pelos conflitos.

Por outro lado, toda a guerra leva a migrações em massa e a movimentos populacionais (ainda há bem pouco tempo tivemos esta questão com a Guerra da Ucrânia). Estes grupos de pessoas estabelecem-se em outros locais e muitas vezes há uma fusão de diferentes tradições culinárias. No país “novo”, podem não encontram todos os ingredientes que tinham no país de origem e têm de ser feitos pequenos “ajustes”. A culinária resultante pode reflectir a diversidade cultural trazida pela guerra.

Existem vários pratos populares que têm a sua origem em períodos de guerra, como por exemplo:

  • Beef Stroganoff – Sem certezas absolutas, pensa-se que este prato surgiu durante a Guerra de Napoleão no século XIX. Foi criado para satisfazer o gosto muito requintado do Conde Stroganov, membro da aristocracia russa.
  • Spam Musubi – é um prato típico do Hawai que surgiu durante a Segunda Grande Guerra. Na ocupação japonesa das Filipinas, o Exército do EUA introduziu o Spam (carne enlatada) na sua ração militar e desde então os locais começaram a usar este ingrediente nas suas refeições diárias. O Spam Musubi são fatias de Spam grelhadas sobre arroz, envolto em alga nori.
  • Bouillabaisse – é uma sopa de peixe tradicional da Provença, em França. Acredita-se que esta receita remonta aos tempos da Idade Média. Os peixes mais caros eram vendidos e os pescadores locais ficavam com os peixes que ninguém queria comprar. Assim, desenvolveram esta sopa para aproveitar estes peixes, cozinhando-os num caldo rico com temperos e ervas.
  • Mole Poblano – é um prato típico mexicano, muito complexo e rico. A sua origem remonta ao século XVII, durante a Guerra da Independência do México. Supostamente as freiras do Convento de Santa Rosa, em Puebla, queriam impressionar um bispo que estava de visita e combinaram vários ingredientes que tinham disponíveis, como pimentas, especiarias e chocolate, para criar um molho especial – o Mole Poblano.

As influências da guerra na gastronomia podem variar muito, dependendo do contexto histórico, geográfico e cultural específico de cada conflito, mas a verdade é que a culinária é um reflexo perfeito da história e das circunstâncias de um povo e um dos motivos que molda a evolução da comida ao longo do tempo.

Sempre que provar algum prato diferente do habitual, lembre-se que não é só o sabor que importa, mas toda uma história, ciência e tradições culturais que se combinam para criar uma experiência culinária única e fascinante.

Nota: Este artigo foi escrito seguindo as regras do Antigo Acordo Ortográfico
Share this article
Shareable URL
Prev Post

Do Efêmero ao Eterno

Next Post

Portugal de duas rodas

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

Read next

O Poder da Alegria

Uma das coisas que mais acredito e defendo é que uma boa gargalhada, daquelas que saem espontaneamente, bem de…