As avós estragam os netos?

A ligação que se estabelece entre avós e netos é de profunda magia. Duas gerações cruzadas que rimam logo em sintonia. A vida já mostrou que podem aliviar a guarda e, por isso, as avós são da máxima importância para o desenvolvimento dos netos. Felizes de quem os tem.

As obrigações são leves ou ausentes e por isso podem dar-se ao luxo de baixar os ombros e viver tão intensamente a relação com os mais novos como se o sol brilhasse sempre no mais alto. Elas não se incomodam com as consequências, porque a educação deve ser dada pelos pais e a esses cabe a tarefa indecorosa e penalizadora.

Estão agora livres desses correctivos e vingam-se de todos os artifícios usados para formar pessoas com carácter. O sangue, suor e lágrimas, derramados com dor aguda, são agora pequenas cicatrizes que mal se notam nem se sentem. São pequenos demónios brincalhões que tendem a querer destruir algumas das conquistas bem duras.

São o porto seguro das contendas, as que sabem ouvir sem julgamento, as que têm os ombros e braços sempre disponíveis para receber os que se sentem afastados das realidades criadas por eles. Para os netos, elas são a solução de todos os problemas e a alegria de tudo voltar ao inicial. Os braços das avós são tão grandes que cabem todos de uma vez.

Só que hoje em dia existe um outro tipo de avós, mais atentas e com a mente mais aberta. Não se deixam ludibriar pelas manipulações que certos netos têm por hábito usar como escudo e percebem como tudo está fora do contexto e da realidade. São as avós educadoras e especiais. Numa sociedade de síndrome de Peter Pan constante, alguém tem de tomar as rédeas a assegurar a educação da geração que está ainda em formação.

Ouve-se, pelos corredores dos supermercados, nas ruas, em tantos locais, avós tristes com a falta de disciplina que os netos gozam e as más posturas que os pais apresentam. E não são poucas as queixosas. São um verdadeiro exército que se vai agigantando pelos dias que correm. E não se pense que são sogras a criticar noras e genros, são as mães que abrem os olhos.

Desde mimos em excesso, caprichos ridículos e palavreado indecoro encontra-se de tudo neste reino encantado do faz de conta. Uma delas contava a outra que teve vontade de dar uma bofetada à filha, mas que não o fez por estar em casa alheia. A neta, uma primadona de vinte e cinco anos, comportava-se como se fosse a rainha do Sabá e todos eram seus escravos.

– Não a eduquei assim. Estas manias de teorias só dão porcarias. A menina não quer fazer nada! Não estuda nem trabalha, mas tem carro, cigarros e tudo à disposição. E ainda exige que não quer qualquer coisa, mas sim tudo de marca. Ai que ia perdendo a cabeça e era mesmo ali, à frente de todos. O meu marido bem me parou a mão que já ia disparada.

A história inverte-se e são os que tudo permitiam que percebem que é urgente a sua intervenção para evitar um beco sem saída e um retrocesso desastroso. Há que encontrar um meio termo, o equilíbrio de modo a que o funcionamento sustentável seja viável. Tantos anos de evolução não podem ser deitados fora por modas absurdas e mal pensadas.

Estas avós sabem que o seu papel é primordial e decisivo e a sua sensata e experiente opinião poderá ter o impacto certo e definitivo. Nem que o seja temporariamente, pois as certezas são circunstâncias que tendem a flutuar nas brumas do tempo e arquivam-se em locais escondidos e tão estreitos que o mais certo é ficarem perdidas numa memória que também já se foi com brevidade.

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