Ser deficiente neste país

Portugal é o meu país e a ilha da Madeira a minha localidade. Aqui, como certamente em qualquer lado, a vida de uma pessoa deficiente não é fácil. Possivelmente, ainda será mais complicada deste lado, na Pérola do Atlântico. A pequena extensão de território limita os sonhos e ambições de qualquer um, quanto mais o de uma pessoa com deficiência. Basta ver a quantidade de madeirenses que tiveram que sair para vingar, com Ronaldo a ser o expoente máximo do emigrante bem-sucedido.

Voltando ao “meu mundo”, num bocado de terra perdido no meio do oceano, a cadeira de rodas, no meu caso em particular, torna-se um acessório demasiado vistoso e que poucos conseguem dissociar de mim. O problema é mesmo as mentes pequenas, que olham para uma pessoa fisicamente limitada e limitam-na intelectualmente. Um exemplo do que me refiro, é o caso de já me terem perguntado se sei ler. Engoli em seco na ocasião e nem respondi. Porém, a resposta merecida seria “não, mas consigo escrever 3000 caracteres num texto”.

A deficiência de mentalidade estende-se ao campo sentimental. Um deficiente a namorar nesta Pérola é uma autêntica raridade. É como se houvesse um decreto-lei que proibisse relacionamentos com pessoas deficientes (deficiente sim, porque não há que ter medo das palavras).

Isto para mostrar que a mentalidade ainda é muito diminuta numa ilha em pleno séc. XXI.

No entanto, as coisas não ficam por aqui. As barreiras mais visíveis, as físicas, também existem. Há muito por fazer com locais inacessíveis, com grandes escadarias, quando deviam haver rampas ou elevadores, passeios com degraus e automóveis a tapá-los, os quais deviam ser rebaixados e com sinal “Proibido Estacionar”. Só alguém que ande de cadeira de rodas ou com outro tipo de auxílio se dá conta dos entraves que, infelizmente, são mais que muitos.

Ser deficiente é ser superior, já que se tem que enfrentar os desafios normais da vida e daqueles que a incapacidade lhe põe. É enfrentar a vida a sorrir para não mergulhar num estado depressivo que nem o melhor antidepressivo o consegue arrancar de tal catarse. É esconder, muitas vezes, o que lhe vai na alma, para não ter que dar explicações sobre o que sente ou pensa sobre determinadas pessoas ou assuntos. Como se diz na gíria: “mais vale levar para casa e assim se poupa muitas explicações.”

O segredo é “tapar os ouvidos” e imitar a célebre cena dos “Pinguins de Madagáscar”… Sorrir e acenar! Sorrir e acenar!

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