Todos gostamos de ser reconhecidos e de pertencer a algo: um grupo, uma família, uma cultura, um género… Por si só já nascemos com uma diferenciação: masculino ou feminino. E a partir daí já muita coisa se define. Passamos a pertencer, necessariamente, ao grupo dos meninos ou das meninas. Isso já tem implicações na forma como somos educados, “enculturados”, como olhamos e olham para nós.
Crescemos e queremos identificar-nos com os modelos que nos rodeiam, primeiro com o modelo de homem ou mulher que vemos em casa. Depois, com modelos de relacionamento que vamos assistindo, não só como casal, no caso dos pais, como nas formas de relacionamento mais globais: amizades, família, vizinhos, adultos-crianças, adultos-adultos, crianças-crianças, mais velhos-mais novos, mais novos-mais velhos, figuras de autoridade, etc.
Nestas interacções, das mais nucleares às mais distantes, vamos, necessariamente, identificar-nos mais com estas ou aquelas pessoas, estas ou aquelas formas de relacionamento, das mais casuais ou informais, às mais formais, no sentido da forma como nos vamos colocando perante os outros. Vamos sendo mais ou menos extrovertidos ou introvertidos. Mais ou menos reservados, mais ou menos pessimistas ou optimistas, e todo um conjunto de características que vamos desenvolvendo e vão formando a nossa personalidade e traços mais marcantes.
Esses conjuntos de características que se vão consolidando em nós, dão origem a uma predilecção, simpatia ou apreço por determinado tipo de características nos outros, daí nos relacionarmos de forma congruente, aproximando-nos de pessoas que possam ser mais parecidas a nós, com gostos, interesses, perfis e atitudes perante a vida semelhantes aos nossos. E está tudo certo, sempre nos agrupamos assim, ou não teríamos os amigos que temos. Isso é válido também para a forma de vestir, gostos musicais, profissões e hobbies que escolhemos e preferimos, por exemplo.
Aquilo que escolhemos ter e manter na nossa vida diz respeito a essas nossas características, aquelas que fomos moldando e adquirindo por selecção natural. Quer isso dizer que nos vamos apropriando daquilo que nos faz sentido, e isso diz respeito também a características de personalidade. Acredito que vamos podando a nossa personalidade, ensaiando e mantendo os traços que mais naturais são para nós. Igualmente, assim vamos seleccionando as pessoas que permanecem nas nossas vidas e nas nossas rotinas de socialização.
Então porque é que simpatizamos mais com umas pessoas do que com outras? Há um magnetismo natural em cada pessoa, composto pela forma de pensar e sentir o mundo, os outros e a si mesmo. Emanamos uma forma de energia para o mundo, como uma assinatura energética. Por comparação, vide o magnetismo terrestre. Apresenta a sua própria forma e cor, consoante o seu estado. Assim são as pessoas também. Mas mais que isso, e porque falamos de pessoas, todos nós apresentamos uma “aura” própria, um sentimento ou um estado comum que nos faz ser mais ou menos atractivos perante outras pessoas, bem como elas para nós.
Ou seja, a empatia é algo que sentimos naturalmente por esta ou aquela pessoa, sem que ela nos tenha dito alguma coisa em particular. De facto, sem sequer falarmos com determinada pessoa, já sabemos interiormente se gostamos dela ou não. Tomamos decisões assim, imediatas ou instintivas. E isso do instintivo tem muito que se lhe diga. Instintivo diz respeito ao inconsciente, onde estão armazenadas todas as nossas preferências, atributos, traços e aprendizagens. Através desse armazenamento, é filtrado o que vemos e ouvimos. Nessa filtragem, são tomadas decisões imediatas, porque o nosso cérebro é um organismo super eficiente e precisa de decidir sobre o que o rodeia rapidamente.
Quando mais o tempo passa, mais informações o nosso cérebro armazena e mais rápido se dá o processo. Lógico, não é? Daí ao irmos envelhecendo, também vamos sendo mais selectivos. Já sabemos, claramente, o que gostamos e o que não gostamos. Já nem nos questionamos muito sobre o assunto. Sendo assim, tornamo-nos, também, mais “imediatos” nas nossas decisões, de gostar ou não disto ou daquilo, desta ou daquela pessoa. Também nos tornamos mais sensíveis à mentira e hipocrisia, por exemplo. É um dado adquirido, sentimos a falsidade ou o fingimento muito mais rapidamente, e quando sentimos que uma pessoa não é autêntica, os nossos alarmes disparam (porque intervém o tal filtro das aprendizagens) e sentimos uma natural repulsão perante aquela pessoa.
Isso diz respeito à arrogância, autoritarismo, etc. Mas independentemente de todos esses fenómenos mentais, instintivos, racionais ou não, todos queremos pertencer. Todos queremos fazer parte de algo, e precisamos uns dos outros. Ao querermos pertencer, muitas vezes fazemos coisas para agradar os outros, para ser aceites e para não ser condenados ou julgados. Como tal, muitas vezes, tentamos ser iguais ao resto, iguais aos outros. Por outro lado, ser autêntico é demarcar-se pela diferença, é ser-se genuíno, espontâneo. É não seguir tendências porque sim, é não imitar nem tentar ser igual aos demais.
Tememos ser autênticos por medo da exclusão, da crítica, do desprezo, do gozo, da humilhação. E isso vem desde a infância. Na tentativa de pertencer, de agradar, de ter amigos, de ter aprovação dos pais, professores, colegas e pares, vamos moldando a nossa personalidade e atributos, mostrando menos ou mais determinados traços, devido à desejabilidade social de determinados traços. E aqui entra todo o raciocínio que fiz em cima. Chega a uma dada altura que é hora de perguntar: quem sou eu debaixo de todas essas máscaras que fui construindo para pertencer? Quem quero ser, o que quero manter e o que não?
Para pertencer integralmente, temos de pertencer a nós mesmos. Ter apreço por quem somos, pelo que fomos e no que nos tornámos por causa disso. Limar as nossas características e a nossa personalidade dentro do que é possível. Conviver apenas com quem nos faz bem, acrescenta, aprecia e aceita. Sermos nós mesmos, com os nossos filtros bem afinados. Sermos conscientes dos nossos processos, seleccionar bem o que manter em nós também. Moldar o nosso barro interior e exterior.
Podemos ser quem quisermos, com aquilo que na realidade já somos. De quantas máscaras já se revestiu? Está na altura de ver se elas ainda fazem sentido manter. Se não, seja você. Seja autêntico/a. O mundo vai valorizar e apreciar isso. Como tal, vai pertencer ao próprio lugar que criou na massa de gente existente. Quem tiver de gostar de si, gostará. O mesmo se pode dizer para quem se mantém, ou não, na sua vida. Estamos na era da autenticidade. Bem vindo/a.