Black Dove (Amaal)
A estreia em estúdio da cantora somali-canadiana Amaal chega em forma de extended play (EP). Com seis faixas coerentes, Amaal consegue assegurar que dará que falar no futuro. As suas batidas, o groovy flow que veste os seus arranjos e a voz quente e emotiva que a caracteriza são alguns dos fatores a relevar em Black Dove.
Longe do seu registo embrionário, com o lançamento de singles como “With You” e “Mufasa”, o EP tem uma sonoridade muito mais respirada e sofisticada. O instrumental é menos preenchido, mas tem certamente mais textura do que os seus trabalhos anteriores.
Além de dois grandes momentos — “Not What I Thought“, com a percussão a entrar no momento certo, sendo radio friendly sem bater no clichê (graças à excelente produção); e “So What“, cujo conjunto entre a bridge e o refrão trazem um dos melhores pormenores do EP —, este trabalho assume uma identidade. A sensualidade de faixas como “Let Go” e “Coming & Going” (Bite my tongue but you can’t/ ’cause you’re wrapping around me when I’m indecisive/ And I’m still deciding if I let you like it) também são provas claras disso mesmo.
Adivinha-se um futuro a valer para Amaal. O timbre caloroso, o minimalismo da produção que a acompanha, a modernidade e a estética do seu trabalho têm tudo para vingar. É um nome a acrescentar nas playlists R&B de 2019 e uma artista cujos próximos passos musicais merecem atenção.
REAL (Bruno Capinan)
O trabalho de Capinan continua a merecer destaque no panorama da música brasileira e em todo o cenário lusófono. As suas narrativas, a virtuosidade com que escolhe as palavras e a mestria da sua aplicação musical fazem deste autor um nome inesquecível. Depois de mergulhar nos sons daquele que é o seu quarto disco, a vontade de ficar dentro de água é inquestionável.
Capinan soube apimentar este registo com várias camadas. A melancolia da sua sonoridade é praticamente garantida, mas o seu talento para as canções de ritmos fortemente marcados também merece uma nota (“Tão Perto”; “Escorpião”). Mas ainda sobre a melancolia… as canções que suportam esta sensação surgem não raras vezes. “Momento”, “Do Avesso” — uma das canções mais marcantes e bem conseguidas, que recebe a belíssima voz de Mãeana — “Real Agora” e “Love’s Will” são os melhores exemplos. “Pessoa” é outro dos momentos altos, com uma forte personalidade rock. Não só encaixa perfeitamente no alinhamento do artista, como também oferece uma produção e uma narrativa de imenso interesse.
REAL é um álbum assumidamente voltado para a música popular brasileira (MPB) e a pop. E Portugal também tem espaço aqui — “O Pajem” é um poema que Bruno musicou quando ainda era adolescente, da autoria de Mário de Sá-Carneiro. Podemos considerar que o autor viajou, pensou, cresceu, sentiu e deu tudo o que tinha para dar emocionalmente, numa entrega total a este trabalho. Um disco a não perder, considerado por Capinan como o mais confiante da sua carreira.
Fever Dream (Of Monsters and Men)
O mais recente álbum de estúdio da banda islandesa Of Monsters and Men pode desapontar os fãs mais resistentes à experimentação. Fever Dream não soa, de todo, próximo dos dois trabalhos anteriores do grupo (My Head Is An Animal, 2011; Beneath The Skin, 2015). A sonoridade que agora chega afasta o universo acústico e acolhe elementos eletronicamente mais marcados e pujantes.
Este disco retira algum do brilho próprio que caracteriza a banda. Parece não oferecer nada de novo ao cenário musical que se vive atualmente e, ao mesmo tempo, não contribui de forma relevante para a identidade do grupo. O que não significa que Fever Dream se trate de um álbum penoso ou difícil de ouvir.
Há alguns destaques evidentes. “Alligator”, de guitarras pesadas e batida mexida, é uma faixa absolutamente contagiante. I am open/ I am restless/ Let me feel it out/ Let it all come out/ Wake me up/ I’m fever dreaming — tanto a letra quanto o instrumental nos transportam para um ambiente que parece ser o objetivo concetual do álbum, colorido e dançável. “Vulture, Vulture”, “Wars” e “Sleepwalker” proporcionam a mesma sensação. Porém, esta última, a par de “Waiting For The Snow” e “Wild Roses”, integra a lista dos melhores destaques do álbum.
A vontade de ouvir o futuro de Of Monsters and Men mantém-se e a tour de Fever Dream promete, porque tem tudo para levar o público ao rubro. No entanto, é importante que a banda se conecte novamente com a música que está a criar, de forma mais emotiva, para que a fuga à redundância não desvirtue a qualidade das suas canções.