A Internet alterou muitos dos hábitos e criou novos, numa cultura de ligações virtuais, mas ainda não conseguiu modificar os hábitos mentais que nos levam a ter mais interesses informacionais insulares, permitindo que nos tornemos verdadeiramente ligados globalmente. À medida que caminhamos para uma cada vez maior conectividade global, entramos também numa Era em que a necessidade de envolvimento social está a aumentar. Existem biliões de pessoas espalhadas pelo mundo que têm acesso à Internet, através de computadores, smartphones, ou de tablets, que podem aceder a informação sobre realidades distantes da sua e que têm a oportunidade de contribuir para variados assuntos com a sua visão e com as suas opiniões.
O efeito borboleta que a Era da Conexão criou vai para além das fronteiras entre os países e dos interesses políticos. Exemplo disso foi a crise do subprime nos Estados Unidos da América, que levou à queda de um poderoso banco de investimento. Esta queda criou um efeito dominó que afectou os empréstimos interbancários, colocando a economia altamente alavancada da Irlanda em colapso e, consequentemente, deixando muitos britânicos furiosos com o desaparecimento dos seus depósitos em bancos irlandeses, que ofereciam juros bastante altos a quem depositasse as suas poupanças neles. Contudo, existe um grande paradoxo nesta realidade interligada em que vivemos, onde a partilha de informação é cada vez mais fácil de se realizar, a visão do mundo que se vai construindo em cada um pode estar mais difusa do que nos tempos em que a Internet não reinava.
Durante a Guerra no Vietname, as peças jornalísticas realizadas nas fronteiras do conflito para chegar até ao espectador tinham de ser gravadas, transportadas através de avião e montadas e editadas nas sedes de cada emissora, no país de origem, de forma a que, dias depois da reportagem ter sido feita, poder ser transmitida. Actualmente, qualquer crise, como o tsunami no Japão, ou o terramoto no Haiti, pode ser seguido, através de um satélite, em tempo real. Apesar desta proximidade, vários estudos indicam que os consumidores de informação só estão interessados em seguir acontecimentos que lhes são próximos geograficamente e os meios de comunicação tradicionais seguem esse interesse, reservando menos espaço para as notícias internacionais. “Segundo um estudo recente sobre o Twitter, uma rede social que é utilizada por 500 milhões de pessoas no mundo inteiro, estamos mais receptivos a seguir pessoas que estão mais próximos de nós do que alguém que esteja fora das fronteiras do nosso país, do nosso estado, ou da nossa província. 39% dos relacionamentos no Twitter envolvem o seguimento de tweets de uma pessoa que esteja na mesma área metropolitana. O Twitter da zona de São Paulo, no Brasil, mais de 78% das relações criadas são locais. Lá se vai a morte das distância”, analisa Ethan Zuckerman.
Ethan Zuckerman é o director do Centro de Civismo nos Media, no MIT, e é o cientista principal no MIT Media Lab. As suas pesquisas têm-se focado na distribuição de atenção na web e nos novos medias, no uso da tecnologia no desenvolvimento internacional e na utilidade que os novos medias têm para os activistas espalhados pelo mundo. “Existe muita participação nos medias que são exclusivamente pessoais”, afirma Zuckerman. “Muito do que fazemos online – interagir com amigos, partilhar fotografias com familiares – não tem implicações cívicas, mas, paralelamente, existe um conjunto de acções online que têm implicações cívicas. Estas acções podem ser explícitas como blogues políticos ou newsletters, ou ser mais subtis como os textos de ficção ou produtos artísticos que desafiam estereótipos e fazem referência a problemas actuais.” À medida que a compreensão sobre os hábitos de navegação na Internet aumenta, as ciberutópicas esperanças de um planeta sem fronteiras tornam-se em visões tão ingénuas como as previsões que afirmavam que as novas tecnologias de comunicação iriam transformar sociedades.
O aumento da ligação digital não é sinónimo de um aumento de compreensão e, simultaneamente, nunca existiu uma ferramenta tão poderosa como a Internet na construção de novos laços e na manutenção dos já existentes, independentemente da distância física. Os motores de busca, apesar de incrivelmente poderosos, só são bons consoante as palavras e/ou expressões utilizadas para se realizar uma pesquisa, demonstrando que foram desenhados para a aquisição de informação e não para a descoberta. Isto é, os motores de busca disponibilizam-nos o que queremos, mas não nos dizem o que necessitamos de saber. As redes sociais, como o Facebook, ou o Twitter, são uma forma de descoberta muito potente, mas tal só é possível recorrendo ao que os “nossos amigos” também conhecem. Caso este grupo de amigos seja muito diversificado nas suas características e nos seus conhecimentos, a viagem pela descoberta tem levado muitos em direcções inesperadas. No entanto, as maiores fontes de conhecimento online são as publicações digitais de jornais como o The New York Times, ou o The Guardian. Os editores destas edições têm como missão providenciar aos seus leitores uma visão alargada do mundo, para que estes possam ser cidadãos, consumidores e homens/mulheres de negócios eficientes. Estas publicações, porém, são inevitavelmente pautadas por gostos pessoais,que não cobrem toda a diversidade informacional existente no mundo. Por muito boas que sejam as nossas capacidades de pesquisa, os editores das publicações acabam por seleccionar fontes para artigos que estão situadas em zonas do globo que são estratégica e economicamente significantes para o seu país. Quando decorre algum acontecimento importante nalguma zona do globo que normalmente não é coberta pelos jornais, estes têm muita dificuldade em conseguirem analisar a situação em si e o que a gerou.
Tal como Ethan Zuckerman explica: “os limites das fontes de informação online são um desafio tanto para nós, como para as pessoas que estão a construir a próxima geração de ferramentas online. Se examinarmos rigorosamente os media que encontramos online, procurando tópicos e locais sobre os quais ouvimos falar pouco, poderemos alterar o nosso comportamento, adicionando visões diferentes e dissonantes à nossa rede social.” Esta tarefa poderia ter contornos mais fáceis, se os arquitectos das ferramentas da online aderissem à causa de alargar a visão do mundo a todos os internautas. Por exemplo, o Facebook, que tão depressa se apercebe que ainda não criámos uma ligação com um ex-colega de liceu, poderia sugerir ligações com estranhos de África, ou da Índia, que partilham os mesmos interesses que nós. O Google consegue registar todas as pesquisas que realizamos, de forma a poder ser mais eficaz com as publicidades com que nos bombardeia, e, se essa informação fosse usada para nos fazer descobrir novos conteúdos, por nós inexplorados, criando, assim, um efeito dominó no seu extraordinário motor de busca.
Na Internet, existem conversas que são, genuinamente, globais, mas estas conversas raramente são vistas e, quando o são, as barreiras culturais, linguísticas e de interesse conseguem fechar a troca de conhecimento num círculo onde só alguns podem entrar. Para derrubar estas barreiras, Zuckerman, juntamente com Rebbeca Mackinnon, criou uma comunidade de bloguers chamada de Global Voices. Esta plataforma online permite a publicação de notícias e de opiniões de cidadãos espalhados por 150 países diferentes, tendo edições em 20 línguas distintas. Através da Global Voices promove-se a liberdade de expressão e luta-se contra a censura online. “Continuamos a fazer reportagens sobre a cultura em Madagáscar e na Malásia, independentemente da audiência que essas histórias geram. Porém, convencer o Facebook a criar uma ligação global, ou encorajar o The Huffington Post a cobrir histórias globais, é necessário que os utilizadores necessitam de exigir que a sua visão seja alargada”, afirma o director do Centro de Civismo nos Media, no MIT.
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A humanidade encontra-se no expoente máximo da Globalização, mas algures no seu início, sendo a Era da Conexão apenas o primeiro passo. Muitos de nós estamos a tornar-nos, sem nos apercebermos, em “cosmopolitas simulados”, com o mundo inteiro à distância de um clique. Esta visão encoraja-nos a pensar que temos as informações necessárias sobre o que se passa para além das nossas fronteiras, só que, na realidade, estamos mais isolados comparativamente aos anos em que não existia a comunicação digital. “A boa notícia? A Internet não é apenas uma força para o cosmopolitismo simulado, é também uma poderosa ferramenta para combater esse cosmopolitismo”, afirma Ethan Zuckerman. “Se não gostamos da abrangência limitada das nossas perspectivas, nunca houve uma melhor altura para procurarmos conversas mais abrangentes. Normalmente, isto está à distância de um clique.”