O Homem Jáque

– Lá em casa sou o Carlos Jáque. Cada vez que a minha mulher me vê: ‘Carlos, já que estás aqui faz isto!’; ‘Carlos, já que vens para cá traz isso!’; ‘Carlos, já que vais leva aquilo…!’

Este é o diálogo entre dois amigos à mesa do café em que um deles desabafava com outro sobre a vida de casado. É mais um daqueles milhentos de pequenos vídeos que aleatoriamente vão surgindo nas redes sociais enquanto se scrola, e retrata a situação com algum humor à mistura.

Já lá vai o tempo em que o homem chegava a casa no final de um dia de trabalho e se sentava no sofá a ler o jornal enquanto a mulher já tinha à sua espera um delicioso e suculento jantar de sopa, prato e sobremesa. No mínimo.

Os tempos eram outros.

Esta era a sociedade nos anos 50 e 60 do sec. XX.

O homem trabalhava, tinha o seu emprego, e era sua obrigação providenciar o sustento financeiro da casa e da família. Era o senhor da casa, sempre com a razão do seu lado, sem demonstrar emoções, sinal de fraqueza. A última palavra era sempre a do homem.

A mulher “dona de casa” tinha a obrigação de ser a fada do lar, manter esse lar imaculadamente limpo e arrumado, roupa lavada, passada e arrumada, devia ser uma boa cozinheira -cozer, alourar, amanhar, frigir, fritar e assar-, saber corte e costura -coser, chulear, alinhavar, bordar, tricotar, pregar botões, fazer bainhas- além de arear pratas e panelas. A mulher não entrava em cafés. Era a mulher que cuidava dos filhos, que ajudava na educação e garantia o amor e o carinho. Cabia-lhe acatar as decisões do marido sem questionar.

E estar sempre disponível para o seu homem sem dores de cabeça ou outras desculpas.

Mesmo quando a economia “forçou” a mulher a sair de casa e a entrar no mercado de trabalho para haver dois ordenados para suportar as finanças familiares, continuou a ser sua obrigação manter a mesma postura em casa arcando com todo o trabalho do lar.

Os tempos mudaram.

O mundo mudou. A sociedade evoluiu.

Quero acreditar que na maior parte dos lares do chamado mundo ocidental se vive atualmente uma partilha de tarefas entre homem e mulher, em que ambos têm as suas carreiras profissionais, as suas profissões umas mais desgastantes que outras, com uma igualdade de direitos e deveres que leva a que haja uma cooperação, uma entreajuda entre ambos.

Lembro-me da minha mãe me dizer que o meu pai nunca me pegou ao colo. Não era por não amar, por gostar mais ou menos. Simplesmente não era comum nessa altura haver essas demonstrações de carinho por parte do homem. Uma questão de mentalidade. Uma questão cultural.

Hoje o homem não se coíbe de demonstrar as suas emoções em público. Acarinha, brinca, ri. Chora.

Hoje, a maior parte das vezes, quando no casal a última palavra é a do homem é:

Tens razão amor!

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