Uma das maiores dádivas com que fomos presenteados, para além da própria vida, foi, sem dúvida, a liberdade, o livre arbítrio. Somos o único ser com poder de escolha e capacidade de pensamento lógico. Não agimos unicamente segundo um mandato instintivo, puro e feroz, reto e intransponível. Podemos ser autónomos e beneficiar com o poder da iniciativa. O que acontece, é que tudo isto nos compromete com dois lados muito bem conhecidos e todos os dias encarados pela nossa moralidade: o bom e o menos bom. Posto isto, duas palavras que nos caracterizam embatem fortemente em nós e constituem toda a nossa complexidade como ser humano: virtudes e defeitos.
É a existência destas que dirige a nossa diferenciação interior. Uma diferenciação que torna cada um de nós ainda mais humano. Único. Capaz de provocar ou remediar situações, capaz de percorrer um caminho de opções que o constrói e institui, capaz de seguir inspirações e de inspirar. Virtudes e defeitos. Dois lados da mesma moeda. Um não existe sem o outro. É através da comparação de um e outro que conseguimos distingui-los e é através desta distinção que eles vivem. É a dualidade das coisas que muitas vezes as dignifica ou inferioriza. Se não fossem os nossos defeitos, não aprenderíamos com os erros, e se não fossem as nossas virtudes, não haveria a recompensa ou valorização própria que tanto nos satisfaz. Ninguém gosta de reconhecer aquilo que tem de pior. Os defeitos, no fundo, são lapsos e imperfeições. Eles rebaixam-nos perante nós mesmos e os outros, despindo-nos e manifestando o pior de nós. Assim, as pessoas tendem a refletir muitas vezes acerca deles e a repudia-los, preferindo que não fizessem parte das suas vidas.
Contudo, é necessário entender a sua naturalidade. Afinal o instinto e a impulsividade também estão na natureza humana, e estamos todos sujeitos às condições exteriores que nos são apresentadas, e nem sempre sabemos como reagir ou que comportamento tomar perante determinadas circunstancias. Confrontados com a quebra de valores recorrentes que agora reina na sociedade e o pensamento leviano e egoísta que prolifera nas situações mais adversas, o indivíduo vê-se muitas vezes confrontado com os seus próprios juízos de valor e com a ética do seu âmago. Por isso, existe o desejo de potencializar as virtudes. Elas superiorizam-nos e entram em confronto com uma vida infeliz e com uma consciência pesada. O truque é sobrepor aquilo que temos de melhor e utilizar isso de uma forma construtiva e real e repensar cada ato danoso que cometemos, aceitando de bom grado a aprendizagem e a experiência que ao longo da vida vamos adquirindo, seja por bem ou por mal.
Talvez a nossa maior virtude seja reconhecer os nossos defeitos. E talvez o nosso maior defeito seja a insciência das nossas virtudes.