O cenário mediático está a mudar. Novas dinâmicas e novos ritmos estão a dominar os media e a vida dos cidadãos. Quanto ao estudo da área, o jornalismo de dados e de gestão de conteúdos cibernéticos começa a ser uma máxima para o jornalista da actualidade.
Na verdade, explicar a crise da imprensa revela-se, por si só, um desafio. Actualmente, sabemos que a televisão tem um peso social muito maior do que a imprensa. Os conteúdos visuais dominam os olhares das audiências. E este é um facto que pode ser comprovado pela proliferação das estruturas dos meios de comunicação, que o sociólogo francês Michel Maffesoli enuncia na sua obra O Tempo das Tribos.
Consequentemente, persistem uma série de riscos. Trata-se da redução das vendas de jornais, do descrédito generalizado dos media, da massificação do consumo de televisão. Deste modo, existe um conjunto de efeitos que se repercutem, no jornalismo: por um lado, a aposta nas novas tecnologias e, por outro lado, a acção sensacionalista por parte dos profissionais da área, em busca de melhores números de audiências. Por exemplo, verificar que plataformas como a ‘Blendle’, holandesa e em fase de expansão, vendem artigos unitários, como o ‘iTunes’ vende músicas indicia, a curto prazo, um sinal de que a necessidade de gerar lucros se sobrepõe à necessidade de fazer jornalismo de qualidade. Apesar disso, não poderá, a médio ou longo prazo, uma forma de promover novas formas jornalísticas e de incitar a novas acções?
Explorando o ponto anterior, passamos a mais uma ideia: o ciberjornalismo ascende. Tendo em conta o aprimorar a crescente ascensão dos meios digitais, bem como dos sistemas de rede associados (esta década prevê-se a emergência da tecnologia 5G, que sucederá à 4G), criam-se condições para inovar na oferta de conteúdos noticiosos e de reportagem. Deste modo, não parece menos relevante atentar no “multifuncionalismo”, apontado pelo filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, na obra A Sociedade do Cansaço. Basicamente, aborda as novas dinâmicas sociais como estando a desenvolver-se a um ritmo cada vez mais acelerado.
Compreendendo que a Humanidade atribui cada vez mais importância à tecnologia, compreende-se, igualmente, a existência de um conjunto de efeitos. Entre eles, num panorama global, devem ser destacados: o poder de alienação, a mudança do conceito familiar e a desvalorização dos padrões tradicionais, a concentração dos hábitos quotidianos em estruturas fechadas aliada à fuga ao ar livre, a potenciação de novos problemas de saúde do foro psicológico e psiquiátrico, a falta de focalização nas tarefas diárias. Pegando neste aspecto em concreto, Maffesoli ainda menciona a necessidade de olharmos o social “como uma obra de arte”, conferindo especial relevância à relação entre “a ética e a estética”.
No jornalismo, aquele aspecto torna-se fundamental, na medida em que se verificam duas grandes tendências. Por um lado, os consumidores de media leem cada vez menos jornais, perdendo o hábito não só de ler algo em papel, como também de sentir a fibra da celulose e a tinta marcante das mãos. Ouvem cada vez menos rádio, decrescendo a sensibilidade pela sonoridade radiofónica, num tempo em que o futuro da rádio começa a ser posto em causa. Por outro lado, os consumidores de media veem cada vez mais telejornais e utilizam a Internet para se manterem actualizados, levando-os, em consequência do “multifuncionalismo” anteriormente exposto, a ler cada vez mais depressa as notícias e a fazer com que os jornalistas cuidem com especial atenção as primeiras linhas dos artigos a conceber.
Então e o papel do jornalista? No fundo, a promoção da cidadania assim como a missão de conferir informação com qualidade revela-se mais importante do que aquilo que o cidadão comum possa imaginar. No meio jornalístico, é onde as ideias se propagam, onde a actuação do profissional se viabiliza pela rápida difusão mediática, onde, sucintamente, tudo passa. Questões como a legislação e as regulações ética e deontológica mostram-se um tema de importante debate. Para tal, basta ver o episódio de atentado ao periódico satírico francês ‘Charlie Hebdo’, em Janeiro e de como um acumular de artigos a que se juntou um tweet, rapidamente, incitaram à morte de 12 pessoas à queima-roupa.
Daquela análise, retira-se uma questão: o jornalista deve poder criticar e incitar ao espírito crítico, ou manter-se imparcial? Além desta, vem outra pergunta: consegue o jornalista ser imparcial? Talvez não. E talvez todo o tipo de jornalismo exista por uma razão. Satisfazer públicos? Talvez, sim. Todos os jornais e revistas e restantes meios de comunicação social precisam de consumidores e direccionam-se para nichos, ora mais restritos, ora mais alargados. Porém, não haverá o intuito de educar, de levar mais além o leitor, o telespectador, o ouvinte, de contribuir para a sua literacia? Possivelmente. George Gerbner já mencionava que, em primeira instância, um dado sujeito observa um acontecimento e constrói uma mensagem. Este, considerando a disponibilidade e os meios mais a sua percepção, então, criada, atinge uma nova percepção, e assim sucessivamente. No meio de toda esta cadeia infindável, existe informação retida, pensamentos gerados, novas aquisições que se fixam nas mentes de cada um de nós, sendo que a forma da informação variará bem como as recepções e as transfusões daí sucedentes. Ver isto no processo de gestação da informação faz atentar na importância do profissional da área e no seu papel de entrega para com a sociedade e a cultura.
Pensar o jornalismo do século XXI é também pensar num tempo em que cada vez mais os jornalistas se encontram ameaçados pelo mundo em que vivem. Daí veja-se o aumento do número de despedimentos (com destaque para a imprensa) e a subsequente ascensão de freelancers. No entanto, se existem profissionais que fazem trabalhos de forma livre e saem de estruturas laborais específicas, provavelmente, é porque também existe a necessidade de reinventar o mundo e de gerar novas percepções sobre ele.
Desta feita, a reflexão segue no sentido da possibilidade do jornalismo ser feito sem seres humanos. Vários especialistas apontam uma visão futurista aliada à invasão robótica. Por conseguinte, será concebível uma realidade onde robots tratem informação? E a sua vertente de agilização mental será tão complexa e densa como aquela que o Homem detém? Mais: conseguirá preservar-se a essência da actividade jornalística, tendo em conta todos as suas circunstâncias?
As questões ficam, o futuro é olhado e o presente acontece. Frederich Nietzsche faz Zaratustra proclamar que “o Homem só existe para ser superado”. Nesta óptica, juntamente com a análise aqui concretizada, o jornalismo é, por si só, um mundo que se insere dentro de outro, crescentemente, em constante diversificação e mutação. Os jornalistas continuam a processar mensagens e a ser responsáveis por motivar públicos e mexer com as massas, porém, já, inclusivamente, se geram notícias automaticamente.
Em jeito de término, subjectivamente falando, a partir do momento em que as movimentações tecnológicas tomarem conta das nossas vidas, o jornalismo deixará de assumir a sua peculiaridade ao nível do sentir e do receber. Contudo, certamente, manterá a sua intenção de fazer as sociedades caminhar no sentido de buscar o verdadeiro rumo civilizacional, pois a História mostra-nos o quão cíclica consegue ser. Além disso, foi algo que a actividade jornalística sempre tentou fazer.