Guerra com sexo ou Sexo em guerra?

Desde os tempos imemoriais que os seres se digladiam. Alguns têm o intuito da posse do território e outros querem ficar com aquela fêmea. Esperta, a tipinha que os coloca à bulha e ainda se diverte. Outros fazem bailados tolos e elas deixam-nos pensar que ficaram convencidas. Há de tudo no planeta e ainda muito mais. Animais são seres sensíveis que agem por instinto e inteligência.

No que toca aos seres humanos temos pano para mangas, calças, casacos, fronhas e tanto mais. Apesar de se saber que existem diferenças entre homens e mulheres, biológicas e inevitáveis, outros aspectos são meros detalhes que o tempo se encarregou de aprofundar. No que toca à inteligência, o caso muda de figura, pois é aí que se soltam as farpas e setas.

Anos, séculos de mulheres relegadas para segundo plano, deram artilharia aos homens para as menosprezar com requintes de malvadez. Para eles, os homens, não passam de servas que têm que satisfazer as suas necessidades. A verdade é que a História não tem sido justa para com elas e as excepções são para serem tidas como loucas ou para as ridicularizar.

Aristóteles, discípulo de Platão, entendia que as mulheres tinham apenas uma função, a de reprodução. Eram fracas, devido ao que apelidava de catamenia, a vulgar menstruação. Assim sendo, era-lhes atribuída uma falta de calor, o que provocava paragens nos alimentos e, como tal, não teriam capacidade para mais. Seriam somente o recipiente do esperma, o receptáculo que servia de suporte ao novo ser.

Além de demonstrar uma enorme falta de respeito pela mãe e familiares do lado feminino, era uma forma de provar que, em termos sociais, era um pensamento redutor. O curioso é que afirmava, numa outra vertente, que o Homem era um animal social e, efectivamente, referia-se ao lado masculino já que as mulheres não tinham direito a ser consideradas.

Poder-se-ia pensar que este pensamento machista, sexista e misógino seria típico da Antiguidade Clássica, mas o certo é que o mesmo se propagou durante séculos e em nada sofreu melhoramentos. As mulheres, fossem elas de classes sociais diferentes ou semelhantes, eram invisíveis em tomadas de decisão e quando tinham esse poder, o exemplo de rainhas, passaram para a posteridade como pessoas que se deixaram levar por impulsos e não como portadoras de bom senso.

Freud, o pai da psicanálise, que se debruçou sobre as mulheres e os seus múltiplos problemas, julgava-as como inferiores, opostas à mudança pois nada acrescentavam ao que já se sabia. A sua missão era a reprodução e tinham sido fustigadas por um mal terrível: a inveja do pénis, uma espécie dura de castração. A histeria, com origem na infância, teria sido a consequência de abusos sexuais e, como tal, não sabiam o que era o desejo sexual. Assim sendo, seriam boas donas de casa e ocupavam-se da satisfação dos outros.

Certamente que muitos recalcamentos estavam instalados em si e aquilo que criticava nos outros, provavelmente, seria em quantidade maior com os seus, a começar na sua pessoa. Pobre mulher, a que casou com este senhor e que terá sido muito destratada por ele. Contudo a sua filha ensinou-lhe bem a lição, o que não o fez retirar o dito. Isto já para não falar de orgasmos, que não vem agora para o caso.

Mais recentemente temos o caso do senhor Einstein, um génio da física, o homem da teoria da relatividade que teve um percurso de vida orientado por mulheres, mas que as desconsiderava no todo. Seriam necessárias para a manutenção de uma casa e reprodução. Numa carta escrita à sua mulher, exigia roupa limpa e a casa em ordem, três refeições diárias quentes, sem contacto pessoal, o escritório seria uma espécie de templo e com entrada vedada. Alegava que as mulheres tinham falta do essencial, o raciocínio e não entendiam o mundo.

Acontece que a sua mulher foi brilhante nos estudos e descobertas. Fazia-o, com sensatez e perspicácia, a pensar que levava a sua avante quando era o oposto e grande parte do seu trabalho, reconhecido internacionalmente, foi elaborado em parceria. O ser relativo ganha uma outra dimensão quando é com os outros. Tivesse sido deixado sem comer ou cuidado e aquela cabeça teria seguido outro rumo. Curiosamente, recusou sentar-se ao lado da Maria Curie, aquela senhora que fazia bolos com polónio e brincava à radioatividade.

Os tempos mudam, mas certas fórmulas, que parecem gastas, perpetuam-se como se fossem estrelas que iluminam caminhos escuros. É assim que ficam na escuridão de mentes que não entendem que a biologia não pode ser negada e que os preconceitos são exactamente isso, conceitos incutidos antes da experiência. O machismo continua a ser propagado por muitos e as mães, em grande parte, são as culpadas, quando deviam ser libertadoras de mentes.

Não há exclusivo das mulheres, a quem rotulam de muito sensíveis e emotivas. Menino não chora é outra tolice, das fortes, assim como afirmar que as louras são todas burras. A cozinha é um laboratório onde os chefes, nome pomposo dado aos homens que se aventuraram no caminho milenar das mulheres, agora brilham e exibem os seus dotes. Pelos vistos as mulheres, que durante tempos de múltiplas gerações, algumas bem duras e outras um pouco mais luminosas, alimentavam as suas famílias e restantes membros das comunidades, só por motivo de coisa nenhuma.

O reconhecimento do trabalho feminino tem sido um cavalo de batalha e não é uma questão de feminismo. Trata-se de justiça e de mérito. Quantas mulheres são mães e pais e ainda excelentes profissionais? Quantas mulheres têm que se esforçar mais do que os homens para serem notadas? Quantas mulheres sabem que lhes roubam as ideias e os outros recebem os louros? Quanta falta de rigor ainda existe nas relações laborais?

Sim, as mulheres têm a desfaçatez de engravidarem e terem filhos. É o único método que funciona, mesmo que agora seja em produção independente. São elas as portadoras do novo ser e não eles, mesmo que façam mudança de sexo. Compete a elas os cuidados essenciais, têm aquilo que se chama de relação privilegiada, a que jamais se quebra, pois filhos serão sempre meninos ou meninas, toda a vida.

Onde reside a diferença? Na biologia que, em tom ditatorial, afirma haver dois sexos, o masculino e o feminino. O resto, onde tanto se pode incluir, como a inteligência e a capacidade de resolver contendas bem como em ultrapassar barreiras, reside em cada um e não se agarra a cromossomas nem a ditos, que cheiram a mofo e provam a inferioridade de quem o pronuncia.

Só faltava, para abrilhantar o baile da vergonha e estupidez, um homem rústico, dos mais acérrimos defensores do machismo tóxico e pilosidade exuberante, um dia acordar para o torto e querer ser mulher. Podia continuar com a mesma força preconceituosa quando chegasse ao fim da sua transformação? Essa era de mestre e hilariante. Bem dizia a minha tia: um pano encharcado naquelas ventas e está o assunto arrumado!

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