Estados Unidos e China: uma relação entre o ódio e a amizade

Ninguém tem dúvidas que o mundo está a mudar. Ora vejamos. Por um lado, existem países que ainda há bem pouco tempo eram admirados pelas suas economias estáveis, como é o caso de Portugal, e que hoje não são mais do que adjectivados de “lixo”, e, por outro, existe um grupo restrito de países que se assumem, cada vez mais, como líderes da economia mundial. A China é a que salta mais à vista, sobretudo, quando é de conhecimento geral que existe uma certa tensão entre esta e os Estados Unidos da Améria (EUA).

Uma luta pela hegemonia mundial

Os recentes dados vindos a público colocam a China à frente dos EUA, depois de ter conseguido pela primeira vez na sua história ultrapassar os americanos no volume de comércio internacional, no passado ano (2013). Esta chegada dos chineses ao topo do ranking, resulta de um processo de dez anos de ascensão acelerada da sua economia no contexto internacional. Recorde-se que, em 2007, destronou os EUA do 2º lugar de maior exportador mundial, tendo arrecadado o primeiro posto à Alemanha, em 2009. Avaliando que, num mundo em crise, a liderança económica é vista como um trunfo poderoso no que toca a influenciar outros países, é natural que os EUA não vejam com bons olhos a ascensão deste país asiático.

Não se pode dizer que os chineses não têm aproveitado a maré, prova disso são os inúmeros investimentos que têm feito fora de portas. Desengane-se se pensa que só se ficam pelo continente africano, toda a zona envolvente do sudeste asiático também tem sido alvo das garras chinesas, assim como a América Latina. Uma influência que, em certos casos, não se reflecte apenas a nível económico, mas também a nível cultural. Exemplo disso é que em alguns países, como o Laos, tem-se verificado a construção de escolas que ensinam mandarim. Uma influência a nível económico, é o caso do Zimbábue que adoptou, no início deste ano (2014), o yuan como uma das moedas oficiais do país.

Com o avançar da esfera de influência, a China está a tornar-se cada vez mais um adversário de peso para os EUA, que também ambicionam assegurar-se da diversificação das suas fontes de matérias-primas e controlar os passos de outros países. Todavia, as relações entre Washington e Pequim são bem mais complexas do que isto. Há um clima permanente de desconfiança. Uns meros exercícios militares levados a cabo pela América junto dos seus aliados no sudoeste asiático não são bem vistos pelos chineses. Ainda recentemente a China deixou bem claro esse incómodo, ao estabelecer uma zona de defesa área, que se prolonga até as afamadas ilhas que disputa com o Japão, que é, como sabemos, aliado dos EUA.

DR_chinaeeua_umarelacaoentreoodioeaamizadeA resposta dos americanos não se fez esperar. Pouco tempo depois da tomada de posição, um avião sobrevou a zona, dando a entender o descontentamento dos EUA. Uma atitude encarada pela comunidade internacional como agressão militar. O próprio presidente americano, Barack Obama, em declarações à CNN, confirmou: “as ilhas de Senkaku (Diaoyu para os chineses) são administradas pelo Japão. Nós (EUA) opomo-nos a qualquer tentativa unilateral de minar a administração japonesa dessas ilhas”. Mesmo admitindo que existe a intenção de se criar laços com a China, essa aproximação não será feita “às custas do Japão, ou de qualquer outro aliado”, acrescentou Obama. Entretanto, o Ministério da Defesa chinês emitiu um comunicado afirmando que a área de segurança “não está dirigida contra nenhum país, ou alvo específico, não constituindo uma ameaça contra nenhum país, ou região”. O que não deixa os americanos descansados, sobretudo, quando sabem que a seguir a eles, a China é o país que mais gasta com as forças armadas. Quanto à ilha em causa suspeita-se que abriga gás natural, daí tanta disputa.

O mundo está atento. Nunca a China se sentiu de igual para igual com os EUA, como agora. A China é líder na produção de alimentos, de aço, na construção civil, nos telemóveis, nos computadores, etc. É considerada a “fábrica do mundo”. Nos próximos dez anos, deve lançar uma nave tripulada para a lua. O descarrilar das relações entre ambos os países pode implicar, segundo os mais pessimistas, uma terceira Guerra Mundial. Contudo, o facto de haver ainda um alto grau de interdependência económica, que, para o bem ou para o mal, liga ambos os países, a razoável admiração mútua (os americanos admiram a ética de trabalho dos chineses e os chineses reconhecem a inventividade dos americanos) e o desejo de melhorar a relação, poderá travar a hostilidade entre estas duas grandes potências mundiais. Ainda em Dezembro passado (2013), o presidente da China, Xi Jinping, confessou: “estamos dispostos a colaborar com os EUA para estabelecer um novo modelo de relação, respeitar os nossos interesses básicos e as principais preocupações. Queremos aumentar a nossa comunicação e coordenação em assuntos globais e regionais para tramitar de maneira apropriada questões sensíveis e diferenças entre nós”.

Economia chinesa com menor crescimento

É certo que o crescimento da China faz inveja a muitos países, mas para este país asiático o ano de 2013 foi o pior dos últimos 14 anos, ao registar uma nova desaceleração, com o recuo do PIB em duas décimas, de 7,7% para 7,5%, longe dos anos de glória em que o crescimento era de dois dígitos. Para Andrew Mok, presidente executivo do Red Pagoda Ressources, “do ponto de vista da economia mundial, esta desaceleração vai penalizar países e empresas que fornecem matérias-primas à China”. Entre os vários problemas que a economia chinesa enfrenta, a grande escassez de moeda e a crescente dívida pública são os mais preocupantes. Na opinião de alguns economistas, a continuar este cenário, poderá haver uma nova onda de falências entre as empresas privadas, tal como ocorreu em 2011.

Entre os desafios que enfrenta a China, destacam-se o crescimento populacional (prevê-se que a população da China chegue a 1,4 bilhão, em 2020) contra o seu fraco sector agrícola, o risco de uma crise de crédito com o aumento contínuo das taxas de empréstimos interbancários, bem como da dívida dos projectos de construção em pequenas e médias cidades, e o conflito entre o excesso de capacidade de produção e a demanda por mais empregos. A superação destes desafios interessa não só ao governo chinês, mas também a toda a comunidade mundial, uma vez que uma desaceleração da economia deste país terá impacto sobre o mundo inteiro. Cabe à China desenvolver políticas de desenvolvimento sustentável, que mantenham os altos níveis de crescimento económico e ao mesmo tempo promover uma justa distribuição da riqueza, procurando combater os graves problemas sociais que o país demonstra ter.

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