A Lei e a violência doméstica

Ultimamente, com o aumento de casos de violência doméstica que acabam com as mortes das vítimas, é finalmente posto em cima da mesa a discussão sobre as leis que as deveriam proteger logo a partir do momento em que estas fazem a primeira queixa. O que nos leva aos casos em que, ao contrário do que seria de esperar, os seus agressores continuam impunes apenas com apresentações diárias na esquadra ou com uma medida de afastamento da vítima… Ora, vamos ser sinceros, de que é que isto adianta para a vítima?

Para matar alguém não é preciso estar ao pé dela, para agredi-la não é necessário estar perto dela, até porque existem vários tipos de agressão sem ser a física, aliás a chantagem inclusive nas redes sociais pode ser igualmente violenta e de ordem psicológica o que pode levar a vítima ao suicídio. Os casos são ainda mais graves, quando existem filhos menores e que assistem diariamente à violência doméstica física, verbal e psicológica feita à vítima e isto pode levar a diversas consequências: a criança ou crianças que normalmente são os filhos podem vir a tornar-se também elas vítimas do agressor ou, quando adultos, podem-se tornar nos próprios agressores, portanto, quando falamos em violência doméstica, muitas vezes não estamos só a falar nas vítimas principais como também nas vítimas indirectas, como nos filhos que assistem.

Tão grave ou ainda mais é o facto dos vizinhos que se calam com a desculpa de “não se quererem meter na vida do casal”, ou da própria família, que até sabe ou é, em muitos dos casos, confidente e opta por ficar em silêncio, permitindo que a atrocidade continue até ao desfecho, muitas vezes, fatal. Então, o que deve ser feito?

Primeiro que tudo, é importante que as pessoas mudem os seus valores morais e não se calem, porque assim estão a proteger todos os agressores e a ajudar a aumentar o número de vítimas e estamos a falar das pessoas que fazem parte do círculo familiar e social da vítima e que desconfiam ou sabem das agressões, sejam elas físicas, verbais ou psicológicas. Ameaças verbais são tão graves como as físicas, na maior parte dos casos, a agressão física começa com um longo passado de agressões verbais que vão desde a humilhação que começa por ser em casa e depois acontece em público; aos ciúmes, à proibição da vítima falar com outras pessoas e até à atitude do agressor ter sempre a última palavra numa conversa ou discussão. É importante que a vítima desvalorize os pedidos de desculpa e de arrependimento que o seu agressor faz cada vez que discutem, porque isso só vai levá-lo a que na próxima discussão aumente o grau de violência e de poder de controlo sobre a vítima.

É importante referir que muitas das vítimas não chegam sequer a pedir auxílio, porque as nossas leis são brandas com os agressores, permitindo-lhes continuar a sua perseguição á vítima e as suas ofensas. Perante os desfechos mortais das vítimas de casos de violência doméstica que aumentaram, houve uma necessidade, talvez tardia, de alterar alguns procedimentos, como, por exemplo, a Polícia Judiciária estar a estudar um novo modelo de comunicação de crimes. É que, desde o início deste ano, 9 mulheres já sucumbiram em casos de violência doméstica e num dos últimos casos uma das vítimas acabou mesmo por ser a criança, filha do casal e a outra vítima, do mesmo caso, a ex-sogra. Estamos a falar de um caso cuja queixa feita pela mãe da criança morta tinha sido apresentada em 2017. Estamos a falar de vidas inocentes que procuram ajuda e encontram muitas vezes o preconceito, como foi o caso do arquivamento do processo de Juiz Neto de Moura, que perante o caso de um homem que tinha agredido a mulher com uma moca com pregos, ainda conseguiu alegar adultério por parte da mulher de maneira a diminuir a pena do agressor. Infelizmente, quando falamos em violência doméstica, não nos podemos limitar apenas à violência sobre a mulher. A violência doméstica existe também em relação aos idosos que muitas vezes se veem obrigados a viver constantemente num ambiente de medo, principalmente quando ficam dependentes dos filhos ou de outra família.

Embora a sociedade comece a aperceber-se que a violência doméstica está a escalar a olhos vistos (9 casos de mulheres mortas só em Janeiro de 2019) e comece a mostrar a sua indignação nas ruas e nas redes sociais, é preciso que a Lei mude muito, é preciso que nós, como vizinhos, amigos, familiares, mudemos muito.

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