Reforma da Administração Pública

Eficiência, Qualidade, Agilidade

O Governo veio “dizer” que os funcionários públicos “podem estar tranquilos” com a reforma da Administração Pública (AP). Como se esta notícia fosse um factor tranquilizador, que não se arrasta há anos desde esta parte, porque reformas e políticas que fazem parte de compromissos a longo prazo (“etapa 2030”, “o nosso compromisso é 2050”) fazem acreditar que o presente não existe.

A cada mudança de cor partidária num governo, renasce a esperança de que finalmente se reforme dignamente a Administração Pública (…) o aumento do número de funcionários públicos (…) destacam uma dependência crescente do sector público, mas também revelam uma oportunidade singular para repensar e remodelar a governação do país com reformas profundas e estruturais

Carlos Gouveia Martins, 13/6/2024

O actual Governo prevê para cumprimento da 1ª fase de implementação, uma meta de apenas 4 anos. Parece pouco, uma medida que a ser cumprida, resolverá uma boa parte dos problemas do País. Ou, será que não?

Porém, importa questionar o que é, de facto, a Administração Pública? Acreditem que, em vinte e cinco anos dentro dela, muitas dúvidas ficam por esclarecer da forma como é mantida.

Em Chiavenato, “a Administração é o processo de planejar, organizar, dirigir e controlar o uso de recursos a fim de alcançar os seus objectivos. Estes são os elementos da Administração que constituem o chamado processo administrativo.”

Simples, não é?

Porém, veja-se o que é referido na página da Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público:

A Administração Pública é uma realidade vasta e complexa.
Tradicionalmente, a Administração Pública é entendida num duplo sentido: sentido orgânico e sentido material. No sentido orgânico, a administração pública é o sistema de órgãos, serviços e agentes do Estado e de outras entidades públicas que visam a satisfação regular e contínua das necessidades coletivas; no sentido material, a administração pública é a própria atividade desenvolvida por aqueles órgãos, serviços e agentes.”

É aqui que se complica a sua simplicidade, pois as incertezas que resultam do “duplo sentido” são indicadoras de que as excepções podem ser a regra e, o seu contrário também, sempre beneficiando a mesma. Uma forma de a sistematizar é fazer o que se faz quando se explica algo com a mesma complexidade de entendimento.

Imaginando a sua organização como uma árvore, em que o tronco é toda a AP, encontramos distribuídos pelos vários ramos que a sustentam, a restante orgânica. Que não se pretende neste documento desenvolver, mas apenas registar.

Nesses ramos maiores, incluímos a Administração Directa do Estado, a Administração Indirecta do Estado e a Administração Autonóma. Cada um desses ramos subdivide-se em ramos mais finos:

  • O primeiro contempla os serviços centrais e os serviços periféricos; órgãos, serviços e agentes que, integrados na pessoa colectiva Estado estão sob dependência directa do Governo.
  • O segundo, reparte-se em serviços personalizados, fundos personalizados e entidades públicas empresariais; entidades públicas que, distintas da pessoa colectiva Estado, são dotadas de personalidade jurídica e autonomia administrativa e financeira, ainda que a sua actividade administrativa prossegue os fins próprios do Estado.
  • O terceiro, entidades que prosseguem interesses próprios das pessoas que as constituem e que definem autonomamente e com independência a sua orientação e atividade; agrupam-se em três categorias, administração regional (autónoma), administração local (autónoma), associações públicas.

    Simples, não é? Agora que já se entende a orgânica deste Sistema Integrado do Capitalismo, compreendem-se as dificuldades e os constrangimentos, sentidos ao longo destes anos de Democracia, para que fosse possível uma Reforma efectiva nesta enorme árvore do conhecimento, incapaz de se auto-sustentar.
    Porque, as partes querem ser maiores que o seu todo, e esquecer quem são os recursos que o mantêm activo uma lacuna para a sua gestão.

Analisando os eixos fundamentais da Reforma aprovada, verifica-se que a sua área de actuação engloba apenas uma das três ramificações maiores, Administração Directa do Estado, 1/3 do necessário para uma reforma global. Há que começar por algum lado, é certo, porque um repensar com resultados apenas se faz por fases, que concluídas são capazes de se manter. Citando Carlos Martins, “o aumento do número de funcionários públicos (…) destacam uma dependência crescente do sector público, importa questionar quem são esses trabalhadores que fazem parte dos quadros da função pública, e que criam a dependência social a que se refere? Sabendo que, na maioria, esses trabalhadores são quadros médios e superiores, pergunta-se quem são aqueles que, abaixo dessas categorias executam, continuamente, nos restantes ramos da AP, e promovem a sua manutenção e eficácia? A multiplicidade de gestão dos recursos humanos quase que invalida a sua eficácia. O caos do SNS e as gestões autónomas que muito têm contribuído para o mesmo.

Questionam-se casos como o “das gémeas”, quando qualquer pessoa, em qualquer lugar, na mesma situação, tudo faria igual. Quantas foram as vezes que se intercedeu por um familiar doente, por um amigo ou conhecido, em situação delicada, um desconhecido que apenas pede ajuda? Importa perceber o objectivo destas comissões que tentam, de “armas” na boca e rigidez no comportamento, oprimir o Zé Povinho. De quem é a responsabilidade, afinal? Isto se há sequer alguma infracção? Pergunto se as taxas moderadoras que, agora isentas para qualquer cidadão que usa o SNS, não são um privilégio adquirido para muitos que deles não necessita, e apenas o usa no fim do plafond das seguradoras? Será que não existem comissões, estudos e estatísticas capazes de mostrar os milhões perdidos? Ou, será que são pagos pelos contribuintes em igual medida?

Funcionalismo Público – Responsabilidade, Compromisso, Integridade, Excelência
 
Este seria um ideal, em que cada pessoa que nele estivesse dentro, independentemente do seu grau ou estatuto, assim agisse.

Porém, fica um pequeno apontamento em modo de opinião, que nada contribui para aquilo que é este texto, ou aquilo que é a realidade do Funcionalismo Público, pois a simples experiência de procurar ser imparcial, objectivo, muda a nossa maneira de ver as coisas, modifica a nossa própria sensibilidade emocional, a qualidade do nosso amor.* Francesco Alberoni, O Altruísmo e a Moral.

E, sem dúvida, a forma de afirmar uma opinião, embora seja verdadeira, pode ser muito contestável e justamente incorrer em censura severa (…) esta é a verdadeira moralidade da discussão pública e, se muitas vezes violada, sinto-me feliz ao pensar que existem muitos polemistas que em grande escala a observam e ainda um maior número que conscientemente luta por ela.” *John Stuart Mill, Da Liberdade de Pensamento e de Expressão
 
Resta-me acreditar que, nos meus últimos vinte e cinco anos, tenha sido um deles.

Nota: artigo escrito segundo o antigo Acordo Ortográfico.

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