Uma princesa aqui, um príncipe encantado acolá, mais um conto de fadas, mais um final feliz, mas, porque só feliz não chega, um final feliz para sempre. Isto podia resumir a infância de algumas crianças, pobres coitadas! E de quem é a culpa? Dos contadores de histórias? Da Disney?
A verdade é que a Disney, quer queiramos quer não, molda as nossas vidas e, para isso, basta que estejamos expostos às suas histórias, o que é quase impossível não acontecer. Desde pequenos que somos confrontados com estas, estão presentes nos filmes, nos desenhos animados e séries, nos brinquedos, nos livros e são até fonte de inspiração para os nossos familiares interagirem connosco. É-nos dito, direta e indiretamente, que, na vida, tudo acaba bem, mesmo que tenhamos momentos mais tristes pelo meio. Já para não falar nas ideias absurdas de amores perfeitos que nos incutem. A forma absurda como o amor é romantizado pela Disney é, mais do que utópica, ridícula.
Quando crescemos o que é que acontece? Percebemos que a vida é diferente daquilo que nos foi dito. Percebemos que a vida não é um conto de fadas. E quando nos apaixonamos, ainda que sejamos correspondidos, somos confrontados como uma realidade que está longe de ser perfeita. As pessoas têm defeitos e discutir é, muitas vezes, inevitável. Quando crescemos e percebemos as dimensões da ilusão em que estávamos envoltos, vamos, inevitavelmente, ficar desiludidos com a realidade.
Afinal, disseram-nos que a vida era um mar de rosas, mas esqueceram-se de nos dizer que as rosas têm espinhos. E só o vamos descobrir depois de nos picarmos incontáveis vezes. Só vamos conhecer a vida como esta realmente é, depois de vivermos as peripécias. Isto, porque os filmes foram incapazes de nos alertarem para a verdade, preparando-nos para a realidade.
Certamente que a Disney não pensa nisso. Aliás, a Disney, tal como – infelizmente – tudo neste século, é um negócio. O objetivo maior desta empresa é – como qualquer outra – fazer dinheiro. As consequências que os seus produtos possam ter na vida das pessoas é secundário, se tanto.
Numa outra perspetiva, surge o belíssimo termo sonhar. Há sempre quem defenda que é importante as crianças sonharem, enquanto são fáceis de enganar e qualquer coisinha as faz felizes. Está errado. Só deixa de sonhar em adulto quem quer, primeiramente. Depois, há toda uma fase na vida de um ser humano – geralmente começada na adolescência – em que tomamos consciência da realidade e nos desprendemos das ideias erradas que nos lançaram na infância. Infelizmente, nem sempre é fácil lutar contra alguns estereótipos e a frustração vai apoderar-se de nós. É normal ficarmos frustrados, quando percebemos que nos fizeram viver em mentira.
A Disney é responsável maioritária por isto. As suas histórias que fazem as crianças sonhar são as mesmas que as fazem formar ideias erradas, ideias de utopia que, mais tarde, ao conhecerem a vida como esta realmente é, se converterão em desilusão.
A influência da Disney nas nossas vidas e na nossa cultura é, pois, inegável. E as dimensões desta influência chegam mesmo a ser preocupantes. A Disney, tal como os pais e familiares, preocupa-se com as crianças, porém, esquece que as crianças crescem e, um dia mais tarde, tudo terá consequências, cada história mal contada, cada estereótipo passado. Cada final feliz trará consequências.