Geniosa obsessão

A linha que separa a loucura da sanidade é ténue, quase obscura. Na sua fragilidade, a loucura pode ser assustadora. A sanidade mental advém da ideia de um equilíbrio, de uma forma de nos movermos em sociedade que requer um centrar em nós próprios e com os outros que tem de se cumprir sempre em perfeição. Da sanidade solicita-se que todos os nossos papéis sejam cumpridos em glória de tal forma que nos desfilamos, as nossas fotos e as nossas vidas em redes sociais, na gloriosa tentativa de mostrarmos o quanto somos perfeitos, felizes e saudáveis e de certa forma amados pelos outros.

Esta ideia de perfeição não é de agora. Ao longo da história e enquadrados em épocas e mentalidades, os costumes requeriam-se adaptáveis e lógicos. Nessa altura e agora quem pensa e age fora da caixinha suscita curiosidade, crítica, escárnio e bem lá dentro de nós, comuns mortais, muita admiração.

Todos conhecemos o génio Einstein de cabelos no ar e língua de fora que mudou o mundo com a sua forma de pensar. Quem não se emocionou com o filme “Uma Mente Brilhante” que retrata a vida do inigualável matemático John Nash e da sua luta com a esquizofrenia? Os exemplos são muitos ao longo da história da humanidade das grandes mentes, da sua luta com os próprios demónios e do seu enorme contributo para a evolução através da criatividade. Sem eles e elas o mundo jamais seria aquilo que é hoje.

Questiono-me, portanto, sobre uma das características que ressalta entre todos os génios: a obsessão. A que sai dos extremos, a que não lhes permite viver e respirar senão no que os move dia após dia até conseguirem criar, desvendar, inventar o objecto e a ideia das suas obsessões. Até que ponto é loucura? Até que ponto é saudável para eles ou para o mundo e a sua evolução?

Os génios sofrem. Todos eles têm os seus demónios até porque nenhum deles se enquadrou totalmente na sociedade ou pelo menos até perceberem de que forma a sua loucura poderia ser aceite. Contudo, será que por serem obsessivos poderão ser considerados loucos? O facto da sua obsessão lhes permitir dar azo à sua incessante curiosidade, alma infantil e ininterrupta descoberta dá-nos o direito de lhes apontarmos o dedo?

Dá, porque essa é uma das incompreensíveis formas de que até por serem quem são, podem agitar mentes e sociedades. Não poderia ser de outra forma.

É importante existir um direito à obsessão geniosa, ou seja, o podermos abrir um pouco as nossas mentes e perceber que quem tem como alvo o estudo, um tópico, uma arte é porque possivelmente tem algo a dizer ao mundo. Mais que não seja perceber-se a si próprio. Da mesma forma que temos de respeitar que nem sempre quem está obcecado por um tópico é necessariamente um génio.

A obsessão também tem uma linha ténue que a separa da loucura e da sanidade. Talvez, no fundo, se possa dizer “de génios, obcecados e loucos, todos temos um pouco”.

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