Afonso Henriques bramia a sua espada quando o mensageiro lhe entregou um pergaminho. Algum dos senhores sabe ler? Não, meu rei. A aprendizagem das armas estavam sempre primeiro. Quem sabe ler? Gritava ele com as veias do pescoço a querem saltar. Uma voz suave e doce se fez ouvir. Posso ajudar, meu senhor? Aproxime-se, disse ele na sua voz de trovão. Uma rapariguinha, miudinha, envergonhada e coradita, de cabeça baixa estava na sua frente. O que é que está aqui escrito? A medo, as suas mãos delicadas, que tremiam como varas verdes, desenrolaram o escrito e leu: O Repórter Sombra faz 4 anos! Muitos parabéns! O rei, intrigado, perguntou: De certeza? Não me estás a enganar? Claro que não vossa alteza, é o que está aqui grafado com tinta e bico de pena. E foi nesse preciso momento que ele, o primeiro rei de Portugal, o analfabeto mais inteligente da História, entendeu a importância da escrita.
Quero que me tragam como escrever que vou ditar uma lei! Ouviu-se em todo campo de batalha. Subitamente chegam de todos os cantos com o material necessário. Escreva: A partir de hoje está criada a profissão mais antiga do mundo, o jornalismo! Todos se calaram. Como? Não pode ser antes a poesia, perguntou Fernando Pessoa. Sabe vossa majestade que o poeta é um fingidor? Quero a verdade! Insistia ele. Talvez se a natureza for inquirida: Aí flores do verde pinho, se sabedes de meu amigo? O quê? Donzelas e damas que animam as noites da corte, como sabeis. Não! Quero uma corte onde um rei tenha uma távola redonda e onde os seus cavaleiros o sigam fielmente. Se houver um mais casto, bem, isso já é problema dele. Tenho sede. Dai-me de beber! Nesse cálice não que não sou digno do Graal. Outro mais humilde, que tenho muito que aprender.
Vós sois o sal da terra! Insistia o padre António Vieira, no seu púlpito. O sal não se deixa salgar ou é a terra? E naquele descampado caem peixes vindos do céu, imensos que o ar ficou a cheirar a sal. D. Sebastião pintava um quadro bacoco, parolo e desconchavado quando Van Gogh lhe disse que ” quem não sabe ainda fazer grandes coisas que pinte girassóis, ou cemitérios, que são mais calmos “. Mas eu quero grandes obras e novas conquistas de território. Não vá por aí que não tem experiência. Mas eu quero porque sou rei! Pronto! Vicent Van Gogh desespera com a teimosia e corta uma orelha. Já não aguentava mais ouvir aquela birra!
Pedro da Maia regressava a casa do pai, envergonhado e sem saber como enfrentar a vida. Como é que ela tinha sido capaz duma coisa daquelas? Fugir com o Tancredo e levar a filha? Sim pai, respondia Carlos. Nunca soube o que era uma dificuldade e claro, agora a vergonha mancha-o e ridiculariza-o. Seja homem. Enfrente a vida! Pum! Um tiro e o assunto ficou arrumado. Meu rapaz não precisava de ser tão radical com o seu pai, ralhava Afonso, que tinha ao seu colo o revendo Bonifácio. D. João de Portugal tinha acabado de chegar do passeio com Maria e disse a Camões: Faça lá aí uns versinhos para a menina, daqueles que têm um mote e depois podemos ouvi-los com vista para o Tejo. Mas que sejam singelos para que todos o entendam. E a Leonor que traga comida. Descalça vai para a fonte, Leonor pela verdura, vai fermosa, mas tem de servir o senhor.
Ai Simão que o nosso amor não tem futuro. Teresa nem que vás para um convento. Seguir-te-ei pelo mundo! Carlos e Joaninha passeavam ouvindo os rouxinóis quando Baltazar, o homem sem uma das mãos lhes perguntou: É por aqui que chego a Lisboa? Estou um pouco perdido. Aqui é o vale de Santarém, a cidade que é um livro de pedra, onde o romantismo nunca morrerá. Dali pinta relógios que se derretem com o calor do Ribatejo. A memória persiste e ele insiste. As mulheres deixam-no fascinado e cada uma delas é um conjunto diferente de gavetas, carregadas de segredos. Vá ao Alentejo e saiba o que é derreter. Nuno Álvares Pereira enfrenta os castelhanos num Agosto de calor infernal. Toma que é para saberem como elas te moem! Somos menos, mas somos tesos! Siesta? Isso é para meninos. Perderam!!!!!!
A Mona Lisa sorri de tudo o que se está a passar. Leonardo olha apreensivo. Uma quantidade enorme de homens entram em caravelas e aproveitam a força do vento. Onde vão estes malucos? Não era para a Índia? O que fazem no Brasil? Desorientados! Só por causa disso vou inventar uma máquina com asas e que consiga voar. Se o Bartolomeu quiser construir a passarola já é problema dele! Bebe uns líquidos e mistura-os com umas ervas, depois chama-lhes vontades e a geringonça sobe. Pois, já me tinham dito! Quero que a língua oficial seja o português e uns pinheiros plantados lá para Leiria decretava D. Dinis. Tem bons ares e moças engraçadas. A outra quer que eu acredite que são rosas. Ai é? Então vou escrever umas cantigas de amor que até vai ver estrelas!
Miguel Ângelo pintava a Capela Sistina quando Freud, enfadado, lhe perguntou como tinha sido a relação com a sua mãe. Ele, com o seu feitio rebelde e peculiar vingou-se e colocou todos os homens com minúsculos pendentes. Não são perguntas que se façam! Agata Christie coloca diversos indivíduos num comboio para irem comer um sushi, até ao Oriente. Após alguns inconvenientes chegam ao destino e a família Bórgia estava à espera. Antes do jantar decidiram fazer uma selfie e chamaram Goya para imortalizar o momento. Tornaram-se tão picuínhas que ele preferiu o fuzilamento. Henrique VIII aborrece-se e decide criar uma nova religião. Roma não me satisfaz assim como as mulheres com quem caso. Venha outra!
Contudo, que é que se está a passar? Pergunta indignado Afonso Henriques ainda com a espada na mão. Não entendo nada disto. O que é importante é a profissão mais antiga! Não é a outra, aquela com que estão sempre a confundir esta. Essa agora não interessa nada. Paula Rego desenha meninas e mulheres infelizes no meio de seres estranhos e misteriosos. Blimunda percebe que as pessoas, afinal, deixam-se ler com mais facilidade e Filipa de Lencastre e Carlota Joaquina entram em desacordo. Quer que a sua neta case com o seu filho, o tio? Estais boa dessa mioleira ou tereis apanhado demasiado sol? Faça o buço e isso passa-lhe!
Ninguém me dá atenção? Todos a falarem ao mesmo tempo é de doidos! Munch pinta “O grito” e o silêncio invade o recinto, o que é precioso para ser apreciado. Não sei o que aconteceu, que mistelada é esta que está a acontecer, mas uma coisa é certa, saber escrever e ler é fundamental. Como vou saber se me estão a enganar com alguma destas ocorrências? Escreva: O ensino é obrigatório e gratuito. Publique-se! Infelizmente as comunicações naquele tempo eram lentas, por isso, só em 1910, 767 anos depois, é que foi publicado.
Não percebeu nada? Então leia o Repórter Sombra e começará a entender.