Valenti(na)

Uma em cada 5 crianças é vítima de violência sexual na Europa.

Violência sexual inclui desde contactos físicos inapropriados, a violação, assédio sexual, aliciamento, exibicionismo, exploração para fins de prostituição e pornografia, a chantagem e extorsão sexual online.

Cada uma destas situações pode ocorrer em vastos e diferentes idades e contextos, quer sociais, familiares, económicos e culturais. Infelizmente, a violência sexual, é democrática, e acontece a maior parte das vezes onde menos esperamos.

E no meio destes cenários, ocorrem outros, ainda mais recambolescos. Por estes dias, as notícias falam do julgamento dos agressores da Valentina. Ao que nos contam as notícias, a Valentina morreu no Verão passado, não por ser vítima de agressão sexual, mas por o progenitor desconfiar que ela poderia ser vítima, tendo portanto decidido bater-lhe até ela o confessar, ou morrer.

Se passámos a maior parte do tempo distraídos do que se passa à nossa volta, como ficamos obcecados outras tantas vezes a supor o que não acontece? E a não procurar das respostas às nossas perguntas em quem de direito? O que leva um pai, um progenitor, ou um ser humano a agredir uma criança até que esta lhe diga o que ele quer ouvir? Inaceitavelmente, o mesmo que leva um ser a atentar abusar de outro, um transtorno emocional que vê no poder físico e na submissão do outro uma forma de empoderamento e força, e que reflete a própria ausência de amor parental.

Pelas estatísticas, em cada 20 crianças, há pelo menos 4 que são vítimas de violência sexual, e cada 3 destas conhecem e têm contatos regulares e próximos com os agressores, muitas vezes promovidos pelos próprios familiares.

Segundo o Council of Europe, nos países mais desenvolvidos, o desporto infantil é um dos ambientes em que ocorrem muitos destes abusos, quer pela potencialização da não vigilância parental, ou pelo assunção de que determinados comportamentos são aceitáveis nestes ambientes em que existe uma maior tolerância à violência física e o contacto físico é aceitável.

Outra das situações de risco são as aventuras dos pré-adolescentes e juvenis e utilização inadequada de conteúdos e redes sociais, a procura pela emancipação digital, a descoberta do “eu” e a obsessão pela imagem com que rodeamos  inconscientemente o crescimento das nossas crianças.

Uma criança ou jovem agredido raramente fala espontaneamente sobre o que lhe acontece ou aconteceu. O medo, a vergonha, a incapacidade de perceber o que é abuso, a insegurança, o desconforto e dificuldade de traduzir em palavras o que aconteceu conjugado com ter quem esteja disponível emocionalmente para ouvir, retraem-nos nas suas emoções e ações delatórias.

As mudanças de atitude, de humor, a tristeza, os silêncios, a ocultação do corpo, são alguns sinais a que devemos estar atentos, sem criar alarmes desnecessários, sem inquisições exageradas, sem imposições.

É importante parar para ouvir, para ver, para nos distanciarmos e assistirmos às crianças e jovens a serem crianças e jovens, para que vejamos para além dos actos e das palavras, e possamos estar lá caso eles precisem.

A Valentina, esteve do outro lado, e ninguém a viu ou ouviu.

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Para quem quiser saber mais sobre violência sexual infantil no desporto, dê uma vista de olhos ao site do Council of Europe.

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