Não é de hoje que o cinema explora através das telas a presença de robôs entre humanos. Filmes como “The Terminator” (1984) mostraram-nos que estas tecnologias são capazes de gerar um apocalipse no planeta. Clássicos como Blade Runner (1982) ofereceram-nos uma visão diferente de “The Terminator”. Transmitiu-nos que essas inteligências artificiais podem ser mais humanas, em muitos casos, que nós mesmos.
Não há dúvidas, que a inteligência artificial é um tema extremamente atual. Preocupações que há décadas eram meramente teóricas e especulativas tornaram-se reais. Partindo desta premissa, o filme que vos trago hoje é “The Creator” (2023). Um filme de ficção científica/ação escrito e dirigido por Gareth Edwards. Que se destacou neste género com filmes como “Monsters” (2010), “Godzila” (2014) e “Rogue One”, que, para mim, é o melhor filme da saga “Star Wars”.
** CUIDADO COM OS SPOILERS **
A narrativa acontece num futuro sombrio e distópico no ano de 2065, em que robôs e humanos vivem em comunidade. Tudo muda, quando uma bomba nuclear é detonada em Los Angeles e as entidades políticas dos EUA acreditam que foram os robôs os responsáveis. Nesse sentido, juntamente com alguns países ocidentais, expulsam-nos do seu território e prometem trabalhar para a sua extinção. É neste contexto que se desencadeia uma guerra travada pela humanidade e pela Inteligência Artificial. Todavia, os robôs inteligentes continuam a ser aceites e a conviver com os humanos no continente asiático.
É no início da narrativa que conhecemos um casal: Joshua (David Washington), um ex-militar das forças especiais americanas, e Maya (Gemma Chan), uma das chefes das forças de resistência asiática, que, no meio de um ataque, são separados. Um facto que nunca deixou de o atormentar e, por isso, tudo fará para reencontrar a mulher.
Cinco anos depois e no meio da guerra, Joshua é convocado, juntamente com uma equipa de elite, com a difícil missão de entrar nas linhas do inimigo, para encontrar o arquitecto da IA, que eles designam de “O Criador” e que foi o responsável pela criação de uma arma altamente poderosa, capaz de pôr fim ao conflito e à própria humanidade.
É, precisamente, nesta altura que Joshua encontra a arma: Alphie (Madeleine Yuna Voyles), que é representada sob a forma de uma adorável criança dotada de poderes. É aqui que a narrativa muda e Joshua se vê confrontado com uma dualidade. Por um lado, tem de aniquilar a arma, que é uma criança e o faz lembrar do seu passado. Para além, disso, tem uma informação altamente valiosa para ele. Sabe onde está a sua mulher.
“O Criador” é um filme visualmente impactante, se tivermos em conta o seu orçamento na ordem de 80 milhões de dólares. As paisagens deste mundo distópico foram captadas em 8 países diferentes, nomeadamente, Nepal, Tailândia, Japão, Indonésia, Camboja e Vietnam. Para além disso, os robots são digitalmente muito bem desenhados, as aeronaves, os cenários futuristas entre outros. É um filme esteticamente muito bonito, o que nos ajuda a mergulhar na história.
É um filme que na introdução lança vários tópicos para discussão: política, ideologias, conflito, guerra, destruição em massa, intolerância… Todavia, apesar, de colocar em debate várias questões sociais importantes, no decorrer da narrativa se fecha apenas para o drama vivido pelas personagens. Contudo, não achei a narrativa propriamente má, pois em vários momentos apela à reflexão. “O Criador”, chama-nos à atenção para o imperialismo militar dos Estados Unidos da América, e apresenta-nos uma analogia da guerra com o Vietname. Para além, disso, interroga-nos sucessivas vezes, sobre o carater humano. Evidenciando, que a tecnologia melhorou, mas os problemas humanos não acabaram e continuam os mesmos. Vemos isso, bem presente no filme, quando conhecemos a inspiração por trás da criação de Alphie. O seu criador poderia tê-la programado para odiar a humanidade. No entanto Alphie foi programada para pôr fim a guerra e, não para provocar o domínio dos robôs sob a raça humana.
Embora haja, uma guerra acontecer, criada pelos humanos, porque acreditam que foram os robôs que detonaram a bomba, algo que nunca fica claro ao longo do filme. Os robôs apenas, tentam proteger-se e prometem que não querem fazer mal aos humanos. Aqui, podemos também questionarmo-nos, se a inteligência artificial quisesse acabar com a humanidade, não usaria métodos mais sofisticados? Se, seria através da detonação de uma bomba nuclear, um método que é tipicamente humano.
É um filme que também nos evoca o alerta do autor e futurista David Brin, sobre “uma crise empática robótica”. O autor e futurista alerta-nos para a desconfiança e o medo que sentimos em relação a estas criações tecnológicas. No entanto, ele prevê que à medida que estas criaturas evoluírem e se tornarem mais parecidas connosco, as pessoas começarão a adorá-las e a lutar pelos seus direitos. Algo bem visível no filme.
“O Criador” também nos questiona se é possível para a raça humana preservar a sua humanidade. Uma vez que os robôs nos são apresentados com formas humanas: braços, pernas e rostos.
Em “O Criador”, somos convidados por Gareth Edwards a questionar as nossas próprias crenças. É um filme que nos oferece diversas possibilidades independentemente, daquilo em que acreditamos. Se a IA transformará tudo para melhor, ou se a sua automação pode acelerar a extinção humana. A história de “O Criador” é, sobretudo, uma história de amor e esperança. Afinal, o nosso futuro pode não ser tão assustador e sombrio como nós pensamos.