Os pés estão pesados e a cama não é mais um local onde pousamos a cabeça e descansamos, pois, a noite o sono não chega e se chega tem o valor de miligramas. E o acordar, o acordar é um chumbo, é um encerrar de uma noite que foi necessário o uso de fármacos e se faz necessário o uso dos mesmos para se por a pé.
O que me reduz a vida? Acordar e sobreviver sem sonhar, mas o que é sonhar? E se sonha o que quando se pode?
Sentada na sala de espera do psiquiatra minha mente se ocupa com esses monólogos para ninguém.
O telefone vibra, mais um anúncio milagroso de emprego sem se movimentar, sentadinha na sua sala pode fazer quinhentos dólares preenchendo formulários de satisfação.
A recepcionista informa que o médico está atrasado sem que eu lhe pergunte nada. Respondo a esse ato de bondade com um sorriso amarelo. Entretanto a minha paranoia costumeira me questiona de um lado do meu cérebro com aquela voz monocórdia: será que aparento estar com cara de poucos amigos? Por que ela me informou isso se não perguntei nada? O desconforto aumenta e só quero me fundir a mobília da sala de espera.
– Boa noite, cumprimenta o médico.
Olho para ele e balanço a cabeça. A senhora da recepção vai atrás dele e não ouço o diálogo. Eu sinto que minha testa brilha de suor. Não trouxe nada, nem um lenço de papel que me valesse.
Ela retorna e diz:
– O doutor já vai chamar.
E mais um sorriso amarelo de minha parte. Meus dentes transformaram-se em grades de um presidio de palavras, não consigo emitir um som se quer. Meu quadro é triste, são dentes tortos amareladas, com um sorriso anémico que pensa se travestir de simpatia a afabilidade.
O médico me chama, me indica a cadeira, faz as perguntas de sempre… como esta? Como tem reagido a introdução da nova medicação? O que me angustia nesse momento?
– Uma piada pronta, não? “O que me angustia nesse momento?”
Não é mais que evidente que o meu próprio existir me angustia. Meu cérebro grita essas palavras raivosas e o que consigo dizer realmente é: mais do mesmo, doutor. E surge esse sorriso idiota. E a medicação? Bem a medicação me faz sentir cansado.
A conversa é tão genérica e diferente do que se passa no meu cérebro. O médico faz anotações e me dá a receita. E diz, marque com a secretária seu retorno para daqui a um mês.
Volto a sala de espera, preciso falar com a secretária, ela sorri e diz a data e a hora da próxima consulta e mais uma vez o sorriso amarelo. Saio do consultório como um animal com receio de predadores escondidos na escuridão. A minha cabeça é uma gritaria são diversas vozes dizendo coisas que não consigo silenciar. Vozes de ajuda, vozes de reprimenda, minha própria voz a tentar calar as outras. O caminho de volta a minha porta é tão escuro, tão frio…