“Experience is not what happens to a man. It is what a man does with what happens to him.”
Aldous Leonard Huxley, Texts and Pretexts
Já vos disse que tenho os melhores amigos do mundo? Já? E se vos disser que, para além serem os melhores, são também os que perdoam todas as partidas que lhes prego?
Conheci o José há dois anos. Do centro do país, estava a trabalhar no sul. Uma grande amiga minha enamorou-se dele e passados seis meses de trocarem mimos, resolveram que estava na altura de se conhecerem. Eu tenho um sentido de humor retorcido, mas, quando me junto com a Marina, a situação mais normal deste mundo torna-se um verdadeiro segmento dos Monthy Phyton.
Um fim-de-semana de Páscoa, fomos até ao Sul do país, para que ela pudesse conhecer o galanteador. Chegámos tarde, cansadas da viagem e ele lá estava à nossa espera. Fizeram-se as apresentações, mas tive a nítida sensação que os seus cinco sentidos estavam completamente virados um para o outro, despertados apenas (principalmente ele, que ficou logo em sentido), quando calcei umas luvas de borracha e lhe disse que lhe ia enfiar um saco de papel na cabeça, para que não visse o percurso que íamos percorrer. Obviamente que me desmanchei a rir logo de seguida e lhe expliquei que estava a brincar, mas até hoje gargalho, quando me lembro da expressão lívida que o rapaz fez, do ar desconfiado e muito constrangido durante toda a viagem e do sorrisinho negro dela, com quem tinha sido tudo combinado de antemão.
A Marina e o José juntaram os trapinhos uns meses depois e, nessa altura, sendo-me ela muito próxima, comecei a ter mais contacto com eles como casal e percebi que o José era muito esquisito com a comida. No entanto, aquilo que mais me intrigou, era dizer que não gostava de queijo, não suportava sequer o cheiro, para de seguida o ver devorar fatias de pizza carregadinha de mozzarella. Dizia-lhe muitas vezes que, se comia aquele queijo, comia qualquer um, mas ele, teimoso como tudo, dizia-me sempre: “Nem pensar, e nem penses que me enganam, porque eu sei perfeitamente, quando alguma coisa tem queijo.” Foi neste momento que um grande defeito meu deu sinal de vida… É que adoro um bom desafio.
No Verão passado, combinámos um café em minha casa. O José trouxe uns licores que o pai dele costuma fazer e eu combinei com eles que fazia uma tarte. Estava a acabar de sair do forno, quando chegaram. Provámos os licores, tomámos o café e, entretanto, partimos a tarte, que estava muito boa, uma receita da Susana do No Soup for You, que alterei ligeiramente. O José adorou. Eu ria-me à socapa e a Marina percebeu perfeitamente que ali havia marosca. No meio de uma pausa para um cigarro, perguntou: “O que fizeste tu? Conta-me.” Ao que lhe respondi, com um sorrisinho perverso no rosto: “É melhor nem saberes…”
A conversa entrou pela noite dentro, mas antes de se irem embora, disse ao José que, uma vez que tinha gostado tanto da tarte e que a pessoa com quem eu dividia a casa estava permanentemente em dieta, deveria levar o resto. Ao que ele acedeu imediatamente. A Marina ainda me disse antes de se despedirem entre dentes: “Seja o que tenha sido que lhe deste, é melhor que nunca digas, pois de contrário nunca mais irá provar nada que seja feito por ti.” Anui, mas não prometi!
Não consegui deixar a coisa passar. No dia seguinte, liguei para saber se estava tudo bem e perguntei à Marina se ainda havia tarte. Tinha acabado. O José não deixou nada, disse-me. Pedi-lhe para lhe passar a chamada. Falei um pouco com ele e disse-lhe para procurar papel e caneta, que ia passar-lhe a receita que ele tinha gostado tanto. Tive tanta pena, porque adorava ter visto ao vivo e a cores a cara do meu amigo, quando lhe disse que o ingrediente principal da tarte era… Queijo da Ilha.
Vamos às compras?
Para a tarte:
1 Base de massa folhada
200ml de leite
200 grs de açúcar
4 ovos
200g de coco ralado
100g de queijo da ilha
Para o merengue:
2 claras de ovo
50 grs. de açúcar
1 colher de café de creme tártaro ou cremor tártaro
1 colher de café de vinagre balsâmico
E agora preparar:
Ligar o forno a 180º.
Ralar o queijo.
Misturar os ovos inteiros e o açúcar com a batedeira, até obter uma massa líquida fofa.
Juntar o leite, o coco ralado e, por fim, o queijo ralado. Envolver bem. Colocar a massa folhada numa forma de tarte e espalhar o recheio.
Levar ao forno por cerca de 25 minutos, até a tarte estar cozida e dourada.Retirar do forno e reservar.
Para preparar o merengue, bata as claras em castelo, misturando o açúcar aos poucos.
Quando formar picos, misture o creme tártaro e o vinagre balsâmico e continue a bater até os ingredientes se misturarem. O merengue deve fazer ficar brilhante e formar ligeiros picos. Cubra a tarte com este preparado e leve de novo ao forno a 180ºC, durante 5 minutos.
As simple as that!
Notas:
- Creme Tártaro, ou Cremor Tártaro
Nos livros de Culinária antigos, este termo é referido muitas vezes, normalmente associado ao acto de bater claras em castelo, mas, pesquisando e lendo um pouco mais sobre o assunto, percebe-se que o mesmo tem muito mais aplicações.
Bitartarato de potássio, ou hidrogeno tartarato de potássio, de seu nome científico, é um derivado de um ácido orgânico (Ácido Tartárico), que se obtém de diversas frutas, nomeadamente das uvas, bananas e tamarindos. É um sal isento de sódio bastante utilizado na cozinha, principalmente em confeitarias e padarias.
Aplicação em alimentos:
- Retarda a cristalização de caldas de açúcares e atua também como secante para rebuçados e suspiros.
- Estabiliza claras de ovos, aumentando sua tolerância ao calor e o seu volume.
- Reduz a descoloração de hortaliças, que passem por processo de cozimento em água a ferver.
- Em combinação com o bicarbonato de sódio (o qual necessita de um ingrediente ácido para ativar-se), em formulações de “fermento químico”.
- É também usado em combinação com cloreto de potássio para fabricar substitutos de sal isentos de sódio.
- É um antioxidante natural.
Curiosidades:
- Torna-se roxo ao ser colocado sobre chama directa, devido à presença do potássio.
- Aplicado na indústria metalúrgica para limpeza de metais.
- Segundo a Dr. Janet Starr Hull, cremor de tártaro é uma ajuda para aqueles que queiram deixar de fumar, pois, segundo ela, repõe o potássio que é roubado do sistema cardiovascular e regula o PH do corpo, que normalmente fica muito ácido, quando as toxinas do cigarro estão presentes.
Vende-se em farmácias ou em lojas especializadas em produtos para cakedesign.