Existe uma classe de trabalhadores dos quais não falamos com frequência e, em boa verdade, que em parte são associados a profissões socialmente valorizadas pela independência com que desenvolvem a sua atividade, por outra são trabalhadores em situações ainda mais precárias do que um trabalhador que está protegido por um contrato.
Os trabalhadores independentes definem-se como uma “pessoa singular que exerça atividade profissional sem sujeição a contrato de trabalho ou a contrato legalmente equiparado, ou se obrigue a prestar a outrem o resultado da sua atividade”. Normalmente desenvolverem atividade profissional de prestação de serviços, comercial, industrial, ou como produtores agrícolas.
Os direitos de um trabalhador independente são, na maioria das situações, idênticos às dos trabalhadores dependentes (com contrato de trabalho). Ou seja, direitos como os de proteção na parentalidade, desemprego ou doença. Em contrapartida, os deveres são preenchimento e entrega do IRS ou de declaração trimestral e proceder aos pagamentos devidos à Segurança Social.
Os números indicam que existem cerca de 518 067 [1] trabalhadores independentes, mas revelam uma tendência menos positiva: o crescente número de falsos trabalhadores independentes, que já ascende a mais de 100 000[2].
Os falsos trabalhadores independentes caraterizam-se [3] por pessoas que auferem a grande maioria dos seus rendimentos de apenas um cliente, realizam a sua atividade num local pertencente beneficiário (cliente), usa os equipamentos e instrumentos também pertencem ao cliente, faz uma jornada de trabalho com dias e horários definidos pelo cliente e, em algumas situações, ainda desempenha funções de chefia na estrutura orgânica do cliente. Ou seja, são em tudo semelhantes (especialmente nos deveres) a um trabalhador contratado, mas sem os mesmos direitos.
Não obstante o Governo ter criado uma lei que penaliza as empresas que têm uma utilização indevida de contrato de prestação de serviços e, e resultado da sua aplicação já ter custado cerca de 80 milhões de euros às empresas, o seu número não diminui. Pelo contrário, aumentando 40% [4] em 2021.
Dissecando um pouco o mercado de trabalho e as estatísticas disponíveis, temos uma clara perceção de que a precariedade não afeta apenas trabalhadores contratados e que os falsos recibos verdes até existem em empresas públicas. Quando pensamos em trabalhadores precários não nos vem à mente pessoas como os formadores; não imaginamos que uma pessoa que trabalhe num call center não estejam protegidas por um contrato, desenvolvam o seu trabalho como se à empresa pertencessem; não pensaríamos sequer em trabalhadores da cultura.
A pandemia veio trazer um pouco da atenção ao trabalhador e (relembrar) da necessidade que um trabalhador motivado produz (muito) mais. Sucede, porém, que a ânsia de gerar percentagens maiores de lucros e, consequentemente, de distribuir um pouco mais de dividendos, coloca em xeque o trabalhador que se vê num beco sem saída.
[1] Números de fevereiro de 2022 (fonte)
[2] Números de março de 2022 (fonte)
[3] Para se considerar falso recibo verde basta verificar-se uma destas caraterísticas