Quando o fruto cai longe da árvore

Ter um filho é um mistério para todos os pais e mães. Será menina, ou rapaz? Vai ser teimoso, ou paciente? Vai sair istock_000013237008xsmallmais à mãe, ou ao pai? Por muito que os pais insistam em certos métodos da Ciência para criarem o filho perfeito, nem sempre tudo corre bem – nem todos têm meios para sequer tentarem usar os milagrosos antídotos científicos. Por vezes, as crianças nascem com peculiaridades biológicas (surdos, pessoas com síndrome de Down, autistas, esquizofrénicos, pessoas com deficiências físicas, superdotados, transgénicos, etc.), que fazem delas “deficientes” aos olhos da sociedade. Outras vezes, são seres tão diferentes dos próprios pais que elas criam mais graus de familiaridade com os outros do que com a própria família. Uma criança desejada e conseguida, mas que não terá o fim que os pais desejavam. Como podem os pais adaptar-se a este novo membro da casa que é tão diferente deles próprios?

Vencedor de muitos prémios literários, o professor e escritor Andrew Solomon respondeu a esta questão com o livro Far From the Tree: Parents, Children and the Search for Identity. Solomon uniu num só livro entrevistas de pais que conseguiram combater a diferença e torná-la numa identidade – e não numa doença. O primeiro ponto esclarecido neste livro é que existem duas identidades que podem existir numa pessoa: a identidade vertical e a horizontal. A primeira é referente à que existe no ambiente caseiro e familiar, especificamente a relação entre pais e filhos. A segunda refere-se às interacções sociais realizadas fora de casa, ao longo da vida. Estas podem eliminar a identidade pessoal, ou melhorá-la, depende do tipo de actividade.

Coadocao-familia-33576mo acontece, quando a família decide adoptar uma criança que outrora vivera num ambiente de violência. O carinho da nova família é demonstrado desde o primeiro segundo que a criança é apresentada. Ainda assim, os traumas de infância vão estar sempre ligados a esta criança. Não serão nem os pais adoptivos, nem os biológicos que a vão impedir de tomar más, ou boas decisões, serão as situações que ela vive.

Da mesma forma, nem sempre os pais são os culpados pelas atitudes dos filhos. O autor entrevistou pelo menos 300 famílias, entre as quais os pais de Dylan Klebold, um dos responsáveis pelas mortes na escola Columbine nos Estados Unidos da América, em 1996. Na altura, a culpa foi atribuída aos pais, pois tinham sido eles a dar-lhe a educação e a transmitir as ideias essenciais do ser humano (como por exemplo, não matar pessoas). Solomon aqui compara este com o das pessoas que nascem já com uma doença – sejam anãs, tenham deformações físicas, vivam com problemas psicológicos entre outros. Será que a culpa é igualmente dos pais? O mundo tem assistido a um grande número de tiroteios e de ataques à mão armada e na maioria das vezes essa vontade de destruição vem da educação que veio de casa – ou de uma infância traumática. No entanto, nem tudo o que os filhos fazem de mal é culpa dos pais.

“Quando fui conhecer Tom e Sue Klebold, pais de Dylan, achava que conseguiria entender por que ele fez o que fez. A verdade é que, quanto mais os conhecia, menos compreendia o comportamento do menino. Muitos dos pais de criminosos que entrevistei eram essencialmente boas pessoas, sem passagem pela polícia, nem histórico de violência. Apenas tiveram filhos diferentes de si mesmos.” (frase retirada do site mdemulher)

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 A infância do próprio autor do livro é resultado desta ideia. Solomon conta que, quando era mais novo, era um jovem que sofria de dislexia e vivia num confronto interior com os pais, devido à sua homossexualidade. Os pais nem sempre conseguiam entender esta diferença.

“[…] Sinto como quando assumi a sexualidade aos meus pais , foi complicado para eles, especialmente para a minha mãe, e eles não o estavam a aceitar. Eu interpretei isso como se eles não estivessem a ser simpáticos comigo.” (entrevista dada a The Rompus)

Do mesmo modo, as crianças que sofrem de doenças (psicológicas ou físicas) e que não partilham muitas semelhanças com os pais, acabam por sentir dificuldade em ser aceites pelos mesmos e pela generalidade da sociedade. O segredo em passar “por cima” deste problema é o amor que existe. Só assim as características específicas que esta criança apresenta vão ser aceites. Só depois de conhecer as famílias do livro, Solomon percebe que os pais não o estavam a rejeitar, estavam apenas a ter dificuldade em aceitar esta pequena diferença.

Ao comparar a sua própria vida com a de todas estas famílias o autor esclarece qual é o objectivo do livro. Aqueles que são mais próximos, a nível de consanguinidade – os descendentes – nem sempre são os que estão mais próximos da identidade de alguém. “Longe da árvore” significa isso mesmo: afastado da raiz que criou aquela pessoa. Assim se explica, por exemplo, como nasce um artista de uma família de médicos, ou um grande advogado com pais toxicodependentes. Uma macieira de boa qualidade produz boas maçãs. No entanto, basta uma maçã ter sido mordida por uma minhoca e passa a ser podre.

Solomon pretende com este livro que o amanhã de toda a gente seja mais aceite e menos criticado. Para isso acontecer é necessário que as pessoas não temam em expor tudo o que é diferente nelas, sem esperarem a aceitação da sociedade. Não devem apenas sentir amor por elas próprias, como também pelos outros. O autor considera que só assim as famílias conseguem descortinar os obstáculos para a plenitude do convívio humano e inserir a diferença na sociedade.

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