Pessoas normais – as relações que estabelecemos são encontros e desencontros

Ser-se normal significa adotar actos e comportamentos que são tidos pela sociedade como adequados, aceites entre pares, aceites pela comunidade e demais.

Contudo, quando assistimos a situações e a pessoas que são a diferença, suscita sempre polémica, opiniões diferentes e até crítica que pode ser positiva quando é bem fundamentada.

As relações que estabelecemos em cada ciclo que percorremos na vida marcam-se por encontros frutíferos ou não, cruzamo-nos constantemente com novas pessoas, que não são mais do que novas personagens em capítulos que fazem parte da nossa vida, da nossa história.

Cada um de nós desempenha um papel principal ou secundário, dependendo da forma como queremos marcar a nossa história, se decidimos os caminhos a tomar, ou se a vida e as circunstâncias definem o desenrolar desses caminhos.

Precisamente nesta base de idas e vindas de relações que se constroem do acaso que, vos trago hoje o livro Pessoas Normais de Sally Rooney, uma das obras mais conhecidas desta autora irlandesa que nos retrata um amor possível que, pelas dificuldades, pelo contexto socioeconómico e cultural , se torna complicado de ser vivido entre duas pessoas “normais” que querem, que precisam acima de tudo, viver um amor à sua imagem.

Esta história decorre no início da década de 2000 na Irlanda, retratando a crise económica, o flagelo do desemprego, o preconceito das classes sociais, a violência psicológica e, por fim , depressão, fatores que vêm quase ”esmagar” uma relação que, começa da suposta amizade entre dois jovens adolescentes, em fase de crescimento, e que à medida que vão crescendo para a idade adulta, assistem ao desenvolvimento de um sentimento que não conseguem controlar e que corresponde a viver um amor.

Afinal o que é ser normal?

É passar cada etapa de vida como qualquer pessoa, sermos jovens e depois adultos com vitórias, lutas tantas vezes desiguais, dificuldades e muito sacrifício.

Cada pessoa que passa na nossa vida deixa a sua marca e identidade e foi nesta base que cresce o sentimento entre as duas personagens principais: Connell Waldron, jovem jogador de futebol na escola, e Marianne Sheridan, filha de uma família abastada. Ambos iniciam uma amizade que evolui para sentimentos mais profundos que nutrem um pelo outro, mas que têm de manter em segredo pelas diferenças e aceitação sociais.

Se, por um lado, Connell é inseguro, receando a opinião alheia e o impacto que a relação que mantém pode ter, Marianne por seu lado, é alvo de bullying, de críticas no colégio, tornando-a uma jovem com dificuldades de afirmação e em consequência vítima de depressão.

Cada uma das duas personagens tem personalidade diferente, anseios e inseguranças próprias da juventude e a autora Sally Rooney é determinante na forma como descreve a vivência e a diferença entre personagens, que é tão marcante como impactante na forma como ambos vão viver o seu destino e trajetória na história.

Permanece sempre subjacente a pergunta: “Se não tivéssemos cruzado com determinada pessoa como seria a vida? Onde estaria e com quem estaria?

Somos seres “normais” que sentimos e muito refletimos sobre o fato de não sermos “ilhas” de isolamento uns dos outros e que somos afetados constantemente pelas outras pessoas de forma direta ou indireta.

Sally Rooney consegue descrever e trabalhar bem as emoções complexas e delicadas das personagens, sentimos as dores de cada um, como se fossem as nossas dores. Conseguimos experimentar na pele, a vivência das suas angústias e receios que é tão pungente numa forma de quase catarse.

A juventude acabaria por separar, por um tempo não muito distante, Connell e Marianne, mas a força do sentimento que os une é mais forte e, embora tentem estar separados, pelas circunstâncias do tempo, descobrem que esta distância é mais dura do que imaginariam.

A autora capta de forma interessante os momentos chave de transição da juventude no final do tempo de colégio para um novo ciclo de desafios e de começo na universidade.

Marianne tem outras oportunidades, que Connell em contrapartida, não tem pela sua condição financeira mais dificultada.

Ele personifica alguém que pretende ter um futuro diferente e fugir da pobreza da sua família. Poder fazer um curso universitário com aspiração em Direito, pode ditar ter uma vida considerada “normal” e vislumbrar um futuro mais risonho e, quem sabe ao lado de Marianne.

Os encontros e desencontros posteriores entre Connell e Marianne na universidade e na chamada vida adulta tornam esta história interessante para percebermos, se o amor consegue derrubar todas as barreiras e impor-se como algo mais forte do que as dificuldades e ambos vão viver um sentimento de “pessoas normais”, ou se os interesses ou conflitos vão sobrepor-se a tudo.

Se pensarmos bem, o que é vida, se não pessoas ditas “normais” que vivem e sobrevivem a encontros e desencontros que marcam decisivamente o resto das suas vidas?

Deixo-vos o convite para a leitura deste livro, um romance de emoções da Sally Rooney que, já conquistou uma franja interessante de público que se identifica com a sua escrita, que configura a trajetória de vida de duas personagens principais em tempos distintos e como vão vivenciar relações.

Se pensarmos bem, sermos “pessoas normais” é vivermos vidas também “normais”.

Nota: este artigo foi escrito seguindo as regras do Antigo Acordo Ortográfico
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