Para viajar basta existir

Como diria o notável escritor Fernando Pessoa: “para viajar basta existir” e é nesse pressuposto que planeamos, idealizamos e vivemos as experiências das viagens de sonho, ou apenas viagens que nos marcam nas memórias, no pensamento e diria até  na alma, porque o que vemos não vamos esquecer nunca mais.

É nesta certeza que vos digo que, viajar é o melhor que podemos fazer na vida, conhecermos outras realidades culturais, paisagens intemporais e até povos que nos marcam. São esses pedaços de memória que retemos na retina e não importa a distância, nem o tempo.

Uma das viagens mais fantásticas que realizei foi no verão de 2015, precisamente em Agosto quando decidi participar numa viagem que estava a ser preparada por duas amigas à Europa de Leste, com passagem pela Escandinávia, concretamente por Helsínquia. Esta longa viagem durou concretamente 15 dias desde Lisboa, passando por Helsínquia, Tallin, São Petersburgo, Veliky Novgorod e, por fim Moscovo, entre deslocações de avião, ferryboat, autocarro e comboio. Foi uma preparação logística exigente, mas uma decisão a três é sempre democrática nas escolhas e tentámos, assim, gerir da melhor forma as preferências de cada uma.

Iniciámos o percurso entre Lisboa e Helsínquia, capital da Finlândia, conhecida muitas das vezes como a “filha do Báltico” onde pernoitámos por duas noites, aproveitando para conhecer e descobrir a cultura finlandesa. Esta cidade destaca-se pela organização em termos de design de espaços, por uma atmosfera moderna, uma arquitetura que mistura o estilo escandinavo, art-nouveau e modernista. É conhecida ainda pela Catedral de Helsínquia, construída em meados do século XIX, ostenta uma cúpula verde que se eleva sobre a paisagem urbana e que recomendo pela beleza simétrica arquitetónica.

Após esta curta passagem de 2 dias, seguimos para Tallin de ferry boat, uma viagem que se faz facilmente numa 1h30 e na qual podemos disfrutar do azul báltico do imenso mar no Norte da Europa que une estes dois países: a Finlândia e a Estónia.

Talinn é uma cidade báltica sedutora, muito pitoresca, banhada por património cultural da Unesco e cujas origens remontam ao século XIII, diria quase medieval de um país do norte da Europa. Entre as várias ruas estreitas que dão origem a diversas praças, encontramos a Praça da Liberdade (Vabaduse Väljak), um ponto obrigatório de passagem, ou contemplar o memorial Russalka (Russalka Mälestussammas), muito emblemático em Tallin, ou o Palácio Kadriog de estilo barroco e que abrigou a nobreza russa do século XVIII, é outro dos pontos a não perder.

Para quem passa por Tallin, não esquece a cerveja local tradicional, um hábito dos locais e turistas nas esplanadas coloridas de fim de tarde em pleno verão.

A nossa viagem continuou de autocarro durante 4 horas, após 3 dias em Tallinn, com destino a São Petersburgo, uma viagem de solavancos em estradas de pavimento danificado, num autocarro dos tempos da era soviética que, de confortável não tinha nada. Esta cidade mágica foi o ponto alto da nossa viagem, considerada uma das cidades mais belas do mundo, cativa-nos pela imponência dos monumentos, pela sua natureza de se atrever a ser um ícone da grandeza imperial dos czares russos.

É vista como a “Veneza do Norte”, pela quantidade de canais e pontes que se atravessam ao longo da cidade, bem como pelos palácios históricos e museus. Estivemos 5 dias nesta cidade conhecida anteriormente por “Leningrado” que conta com monumentos conservados que se destacam pela imponência, com referência ao Palácio de Peterhof, o Palácio de Inverno e o Palácio de Catarina.

Percorrer a icónica Av. Nevsky, Prospect é sentir a alma da cidade, o movimento constante desta artéria citadina com uma extensão de 4 quilómetros que percorremos algumas vezes como percurso pedestre para conhecermos melhor o coração de S. Petersburgo.

Estar nesta cidade é percorrer os pontos mais turísticos e não só, é marcar presença na Igreja do Salvador sobre o Sangue Derramado pela sua forma arquitetónica e cor expressiva, passar pela Praça do Palácio de S. Petersburgo e, também marcar presença no Museu Hermitage com mais de 3 milhões de obras em exposição. Fiquei rendida à quantidade de obras que consegui ver depois de quase duas horas na fila de espera com acesso ao museu, mesmo com passe de acesso, foram depois 6 horas dentro do Hermitage. Esta dura espera fez-me lembrar o museu do Vaticano onde já fui por duas vezes e tive de esperar também uma “eternidade” – valeu a pena sem dúvida.

Depois de 5 dias em S. Petersburgo voltámos à estrada a caminho de Veliky Novgorod “Cidade Nova”, considerada a cidade berço da mãe Rússia. É uma cidade pequena, construída nas margens do rio Volkhov, e de estilo medieval. Um dos pontos de referência é a Catedral Santa Sofia construída em 1050, marco do cristianismo ortodoxo, bem como uma visita ao Kremlin em Veliky Novgorod, antiga fortaleza e sede do parlamento. Os últimos dias desta viagem fizeram-se por Moscovo, numa viagem de comboio expresso durante a noite para 557 quilómetros entre Veliky Novgorod e Moscovo, o ponto final desta aventura de 15 dias.

Moscovo é uma cidade gigante construída no século XI, que concilia a modernidade com a história, para além dos seus majestosos palácios e edifícios históricos.

Estivemos 3 dias em Moscovo, tempo insuficiente para vermos tanto como gostaríamos e aproveitarmos os últimos dias de férias.

Falar desta cidade, é falar inevitavelmente da Praça vermelha, é percorrer igualmente a Catedral de São Basílio e seguirmos para o Kremlin, símbolo da política russa e fazer visita ao Mausoléu de Lenine onde estive e, foi uma sensação caricata de ver a homenagem a um “boneco de cera” que é idolatrado por tantos russos como se estivesse vivo. A segurança é apertada, de revista constante aos turistas depois de termos quase abandonado os nossos pertences em cacifos velhos pelo preço de €20,00. A desconfiança do povo russo é uma constante perante os turistas, é fruto da mentalidade dura e fria deste povo que sempre viveu sob ameaça velada ditatorial. Não menos importante, é fazer uma viagem pelo metro de Moscovo, sentir a experiência de conhecermos arte e beleza em 195 estações, cada uma com particularidades distintas. Se tivesse a oportunidade de regressar à Rússia, seria sem dúvida, voltar a S. Petersburgo que me fascinou pela beleza e maior abertura à Europa e não Moscovo que achei uma cidade enorme, muito dispendiosa, fechada, muito desorganizada e poluída.

Contudo, ir à Rússia e não ver Moscovo, é como ir a Roma e não ir ver o Papa no Vaticano.

Esta viagem fantástica de 3 mulheres foi, sobretudo, inspiradora, uma experiência inesquecível de amizade, de entreajuda, de companheirismo e de divertimento de percorrermos tantos quilómetros por vários dias e visitarmos estes 3 países – são memórias que nunca esqueceremos.

“A vida é o que fazemos dela. As viagens são os viajantes. O que vemos não é o que vemos, senão o que somos”.

– In Fernando Pessoa

Nota: este artigo foi escrito seguindo as regras do Antigo Acordo Ortográfico
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Nuno Marçal

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