Numa era em que tanto se fala de comunicação é mais frequente encontrar referências à parte do falar do que a do escutar.
Contudo, se temos duas orelhas e uma boca não será porque deveremos escutar mais do que falar?
Numa TED Talk sobre o tema “O poder de escutar”, William Ury refere que deveremos ouvir o ser humano por detrás das palavras porque um dos melhores presentes que podemos oferecer é o de ser escutado. Do seu ponto de vista, numa negociação escutar tem vantagens: ajuda a entender o outro lado; ajuda a criar a ligação humana que promove a construção de confiança; ajuda a demonstrar que nos preocupamos (afinal todos queremos ser ouvidos) e ajuda a predispor o outro a escutar-nos.
Fez-me pensar nas inúmeras reuniões em que muitos dos intervenientes estão mais preocupados a ouvir para responder com argumentos que fundamentam o seu ponto de vista, do que a escutar para se encontrar a uma solução/um acordo.
Como acontece frequentemente nestas situações, a minha mente viaja para a infância, aquele tempo em que podíamos ser nós próprios e adotar atitudes genuínas; aquele tempo em que as brincadeiras que tanto nos divertiam nos ensinaram valiosas lições que acabámos por esquecer.
Nos jogos da infância, podemos perceber diferença entre o ouvir e o escutar o outro verdadeiramente (no que diz, na forma como o diz, nos silêncios, na expressão corporal e nas emoções que transmite).
No jogo do telefone estragado, o objetivo é segredar uma palavra ou uma frase ao ouvido do colega do lado que, por sua vez, tenta repeti-lo ao próximo, e assim por diante até chegar ao último, cuja tarefa é repetir o que ouviu. Não me recordo de alguma vez a mensagem inicial e a final terem coincidido. Talvez, porque estávamos apenas preocupados em transmitir o que ouvimos e repetir o que percebemos sem a preocupação de analisar se faz sentido. O foco é em nós, sem sermos rápidos a passar o “segredo” ao próximo participante.
No jogo da mímica, um dos jogadores interpreta uma ação, objeto ou personagem e os restantes membros da equipa têm de adivinhar a expressão que está a ser representada. Para conseguirem ganhar, os participantes prestam atenção a todos os detalhes que lhes possam fornecer pistas para acertarem no que o outro está a tentar transmitir: a expressão corporal, as emoções e as pausas entre cada gesto. Ou seja, o foco está no outro porque só entendendo o que o outro quer dizer poderemos ganhar.
Questiono-me se os adultos sérios se lembrassem dos comportamentos que adotavam para ganhar os seus jogos de infância os pusessem em práticas nas suas reuniões importantes, quantas seriam mais rápidas e eficazes a encontrar uma solução que servisse todos os interesses.