O pensamento e a observação do mundo

As pessoas simples não se convencem facilmente de nada. Podem não se convencer de que o Homem foi à Lua, mas também não se convencem a mudar os seus hábitos só porque alguém lhes disse que era melhor assim.

Toda a vida tinha vivido debaixo do sol e debaixo da chuva, na solidão absoluta do céu sobre si e da terra debaixo dos pés. Daquilo percebia ele, das colinas que não se moviam do seu lugar, das árvores que cresciam se as deixassem. Passava os dias sozinho, tinha muito tempo para pensar. Às vezes falava com as ovelhas, metia-se com elas, depois ria-se de si mesmo. Sabia que era por estar sozinho. Mas elas gostavam de o ouvir, assim como o cão, apesar de não perceberem nada. Então pensava, muito. Pensava nas coisas que o pai e a mãe lhe diziam. “Se puderes ter um pouco de terra tua”, mas não puder. Pisava a terra dos outros, guardava as ovelhas dos outros. Pensava em Deus, apesar de saber que os outros pensavam cada vez menos em Deus.

Pouco lhe importava de pensar de forma diferente. Já os seus pais lhe diziam que isso marcava a força de um homem. Agora todos pensam da mesma maneira. Vão todos à escola, como ele nunca foi, mas depois pensam todos da mesma maneira, querem todos o mesmo da vida. Ah! Se ele tivesse podido estudar, teria sido um rapaz inteligente, saberia falar palavras de doutor, teria sido professor. Hoje ninguém quer ser professor. Talvez fosse um pouco como guardar ovelhas, mas poderia ensinar palavras bonitas.

Se eles vissem o mundo como ele via. Se tivessem o seu tempo e a sua paz. Talvez pensassem, se tivessem tempo para pensar, talvez não andassem todos de corrida para ganhar dinheiro e ir de férias para o mesmo lugar, férias também de corrida, corridas de carro, corridas de avião. Se vissem o mundo como ele via, talvez recordassem o que os pais lhes diziam e acreditassem em Deus.

Mas ele era só um pastor que não sabia falar, que não sabia explicar ao médico as dores que tinha, era só alguém simples de quem se riam e a quem tinham de explicar tudo. Mas ele sabia, que ainda assim a sua cabeça era só sua e nunca o obrigariam a fazer nada que não achasse bem.

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