Hoje é dia do pai em Portugal e como sou responsável por uma página feminista na internet eu pensei na possibilidade de ceder espaço a um pai para falar sobre paternidade responsável com o intuito de incentivar e promover um debate entre homens e trazer a reflexão sobre algo que infelizmente é muito comum no meio feminino que é o abandono paternal.
Para isso eu comecei a procurar ao meu redor homens que são pais presentes e que estivessem disponíveis para tal trabalho e imagine a minha surpresa ao perceber que apesar de conhecer muitas mães eu conheço pouquíssimos pais que preenchem estes requisitos. Na verdade, conheço apenas um.
Os estudos sobre o abandono paterno ainda são relativamente novos e pouco falado ou divulgados, mas sabe-se que no Brasil já existem quase 6 milhões de crianças sem o nome do pai na certidão. Uma reportagem de dezembro de 2019 do Jornal de Notícias chama a atenção para o fato de que naquele ano aqui em Portugal foram registados quatro bebês por dia sem nome do pai ou seja quase 600 crianças a mais do que nos anos anteriores, isso sem mencionar os pais que registram mas deixam a criação por conta da mãe praticando assim o abandono afetivo que muitas mulheres também chamam de “aborto em vida” e que acarreta na sobrecarga materna e traumas futuros para as crianças.
Enquanto escrevo esse texto me vem à mente uma frase que ouvi minha avó usar inúmeras vezes na tentativa de aconselhar as mulheres ao seu redor pois sempre que uma mulher estava grávida ou que uma mãe falava em se separar do marido ela dizia: O filho é sempre da mulher. Como se premeditasse que a vida seria mais difícil com um filho para criar sozinha.
Por anos eu questionei muito essa frase extremamente machista e tão agressiva para ser dita em tom de conselho, mas hoje enquanto pesquiso e me assombro com os dados de homens que nunca assumiram seus filhos eu entendo todo o contexto e sentido que minha avó aplicava quando a usava. O filho é sempre da mulher e nós estamos sempre sozinhas.
E acreditem eu não estou generalizando, sei que há bons pais no mundo e ao meu ver estes não fazem mais do que sua obrigação, mas quero ressaltar que esse texto não é para vocês.
É dia do pai em Portugal e eu não sou mãe mas sou filha, tenho um pai que me registrou mas que nunca me amou e cuidou, eu fui abortada em vida e hoje também dói em mim a dor de todas as crianças que não tem a oportunidade de ter um pai ao lado. Enquanto mulher dói também a dor de todas as mães que vivem a sobrecarga da maternidade e da responsabilidade de suprir afetivamente uma ou mais crianças.
Há muitos debates que precisam ser recorrentes na sociedade atual e um deles é a paternidade como conhecemos e as tarefas que reconhecemos como sendo paternas ou não. Dar um sobrenome ou apelido não pode ser uma escolha, assumir um filho também não. Quando vejo homens a reclamar e a querer tirar da mulher o direito ao aborto sempre me vem a mente o questionamento: Quem vai tirar dos homens o direito de escolher não assumir, cuidar e criar seu próprios filhos? Pois os números mostram que os homens já possuem esse direito há séculos.
Sei que esse texto vai ser lido em sua maioria por mulheres e sei também que este debate vai demorar muito a chegar nas rodas de conversas e grupos de WhatsApp masculinos, mas quero convidar aos homens que leram até aqui a compartilharem e discutirem isso na sua rede de amigos homens. Podem discordar de mim, podem ir atrás de dados mais atualizados, eu não sou e não quero ser a dona da razão mas gostava que mais homens tivessem acesso a esse debate que por falta de um homem acabou sendo levantado por uma mulher.
Que daora a matéria. Eu fui um aborto em vida e por isso parabenizo minha mãe toda vez que lembro disso, porque ela foi e é guerreira até hoje. Falta 3 meses pra meu filhão nascer mas desde o início tenho um amor por ele que já não cabe em meu peito, cada dia mais ansioso pra chegada dele e poder dar todo amor que eu não ganhei. Na verdade não todo que não ganhei. Mas todo que eu conseguir dar. 🖤
Excelente texto e muito necessário!!!
Parabéns pela matéria! Reflete muito a realidade. Eu também sou filha de um pai que se separou da minha mãe e, depois, deixou de cuidar de mim. Isso gera um impacto negativo, principalmente quando criança.
Excelente texto! Importante debate e reflexão a ser levada à público de forma veemente.
Muito bom o artigo, Carol. Nesta sociedade patriarcal que vivemos, além de lutarmos pela igualdade de direitos que nos falta, ainda temos que lutar tb para que o homem oculpe seu lugar como pai. Uma luta que nem deveria ser nossa, mas acaba sendo, por que lutamos também pelos nossos filhos, que como vc mesmo frisou, acabam sendo sempre das mães. Penso que já passou da hora da sociedade perceber que nós não podemos e nem devemos ser as únicas responsáveis pelos filhos no mundo.
Parabéns pelo artigo, o número de abandono paternal é assustador, porém não surpreendente já que estamos sempre a ouvir relatos de mulheres sobrecarregadas com as atividades com os filhos e sem nenhum suporte e apoio por parte do pai da criança.