O assunto feio

A proposta é simples: distribuição gratuita de produtos de recolha menstrual em centros de saúde e escolas.

A menstruação (ou o período ou a mOnstruação, como queiram chamar) é um assunto sensível para todas as mulheres: porque sofremos por a ter ou porque sofremos por não a ter. Indiferentes não ficamos.

Qual é o objetivo primordial desta medida? Que todas as mulheres tenham acesso a este tipo de produtos desde o primeiro dia da menstruação, sim. Que tenham acesso a produtos de higiene evitando assim complicações de saúde pelo não uso destes produtos. Evitando também faltar à escola nos dias de menstruação (segundo a UNICEF, uma em cada dez meninas não frequenta a escola durante a menstruação).

Mas não é só isto: é sobre falar nisto.

Em Portugal, não existem estudos sobre o impacto dos preços destes produtos e de que forma a menstruação afeta a vida das jovens, quer a nível escolar e de saúde. Não se fala sobre pobreza menstrual. Nem há números concretos sobre este tema, pois os números tornam o assunto sempre mais importante. Mas nem disso podemos falar.

Então, seguimos com análises qualitativas, sem grande fundamento, visto que acabam por ser as nossas perceções sobre o tema.

Em primeiro lugar, interiorizamos que a dor é normal. Porque é a menstruação. A dor de cabeça, de barriga, as náuseas… tudo o que acontecer nesses dias, é normal. Nada a fazer, é assim. Mulher sofre. Coitadinha, é o período. SÓ QUE NÃO. Então, onde está essa informação? Nas nossas Unidades de Saúde Familiar? Nos Gabinetes de Apoio ao Aluno e à Família? Em todos eles, para que a informação chegue a todas as comunidades, mesmo as mais vulneráveis? Oferecer pensos gratuitos não tira as dores, claro que não. Mas ao criar estratégias concertadas sobre o assunto, criamos também um espaço para a saúde da mulher.

Há pensos para todos os preços: 4,98€ para 32 unidades ou 1,14€ para 16 unidades. E sabemos que o fluxo difere de mulher para mulher. E por ser mulher não perdemos o direito de escolher entre um penso e um tampão. Da mesma forma que não perdemos o direito de sermos preocupadas com o meio ambiente e preferirmos um copo menstrual reutilizável (também existem para todos os preços: 14,90€ e 30,60€, só como exemplo).

Até podemos considerar a passagem de informação da mãe para a filha como um ritual mágico entre mulheres: a filha percebe que tem sangue nas cuecas e chama a mãe, que lhe explica de forma carinhosa esta nova fase da sua vida. Tal como responder ao clássico ‘de onde vêm os bebés?’. Se aceitarmos este ritual numa perspetiva de escusa de responsabilidade social, como a informação se actualiza? Quando vamos deixar de dizer às nossas jovens que sofrer todos os meses não é normal? Quando lhes vamos mostrar que há uma panóplia de ofertas de produto menstruais, nos quais podem sentir-se mais confortáveis?

Por que razão é um assunto tabu? Por ser de mulher? Por termos de falar em sangue? É um assunto feio?

Não sei quanto custa um programa nacional destes. Sei que temos um orçamento chumbado e eleições à porta. Sei, com toda a certeza, que se não falarmos do assunto feio, não atualizamos a informação para as nossas jovens.

Mais info aqui.

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